Sucesso da tributação no destino dependerá de regulamentação

Clareza dos critérios a serem adotados pelo legislador complementar será um ponto crítico

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A mudança da tributação da origem para o destino, prevista na reforma tributária sobre o consumo (PEC 45/19), tem potencial para trazer um efeito bastante positivo: contribuir para o fim da guerra fiscal. Mas, de forma semelhante a vários outros pontos da reforma (como a não-cumulatividade plena e a incidência do imposto seletivo), ainda não se tem certeza se esse benefício de fato virá: tudo vai depender da regulamentação por Lei Complementar.

A PEC 45/19 prevê que o imposto passará a incidir no destino, ou seja, que toda operação intermunicipal ou interestadual deverá ser tributada pela alíquota onde está o consumidor do bem ou serviço, e que o imposto irá para o município ou estado de destino.

No entanto, o conceito de destino pode parecer enganosamente fácil de ser determinado, e esse pode se tornar um problema: “Apesar de ser possível implementar essa mudança para que a incidência dos novos tributos seja sempre no destino da operação, existem diversas situações em que é difícil determiná-lo, como é caso de arrendamento de cabos e dutos que atravessam diversos Estados ou municípios, ou transporte rodoviário no qual há desembarque de passageiros em estações entre a partida e o destino da viagem”, consideram Thiago Braichi e Romero Marinho, sócio e associado do Freitas Ferraz Advogados. Para eles, se a legislação não deixar claro o que será considerado o destino das operações nessas situações atípicas, a mudança da regra poderá trazer mais dúvidas do que soluções.

A avaliação de Frederico Bakkum e Matheus Moitinho, associados do Vieira Rezende Advogados, sobre a tributação no destino é a mesma: “As possíveis complicações e discussões sobre a mudança da tributação da origem para o destino prevista na PEC dependerão da clareza dos critérios que serão adotados pelo legislador complementar, o que não será uma tarefa simples e provavelmente levará a questionamentos por parte do fisco e dos contribuintes.” Para eles, se a Lei Complementar definir os critérios com a clareza esperada, o impacto será positivo ao trazer mais segurança jurídica e previsibilidade, além da melhor distribuição da arrecadação tributária pelo território nacional e da redução da guerra fiscal. O esvaziamento desta última é esperado porque os Estados e municípios não verão mais sentido em conceder benefícios fiscais para atrair empresas, já que o imposto será cobrado no lugar de consumo e não no da produção.

Contenção da guerra fiscal e disputa pelo Fundo de Desenvolvimento Regional 

Paulo Victor Vieira da Rocha e Marina Fernandes, sócio e advogada do Vieira da Rocha, Machado Alves Advogados, lembram que atualmente o ICMS já cabe ao Estado de destino (na última etapa de circulação dos bens que, em geral, é a venda ao consumidor final) e, que nem por isso, a guerra fiscal é impossível. O mesmo poderia acontecer, portanto, com o imposto sobre bens e serviços (IBS) e a contribuição sobre bens e serviços (CBS). “É preciso ver se as regras de contenção da guerra fiscal do regime desses novos tributos têm maior potencial de eficácia que as regras de contenção da guerra fiscal do ICMS”, avaliam. Isso porque o regime do ICMS também proíbe a guerra fiscal, mas as regras para contenção da prática são pouco eficazes. “Já as regras de contenção da guerra fiscal pretendidas para o regime do IBS parecem sim mais eficazes. Então, em tese, tudo indica que a guerra fiscal será significativamente mitigada no regime da reforma”, avaliam.

Para mitigar a perda de arrecadação sofrida pelos Estados produtores (já que o imposto será cobrado no destino, onde ocorre o consumo) e reduzir as desigualdades regionais, será criado o Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), com aportes da União para os Estados e ao Distrito Federal. Uma Lei Complementar disporá sobre a divisão dos recursos – que já estão sendo disputados.

Na entrevista abaixo, os advogados do Freitas Ferraz, Vieira Rezende e Vieira da Rocha, Machado Alves Advogados explicam como a tributação no destino vai funcionar e quais são os desafios para implementá-la.


– De acordo com o texto da reforma tributária (PEC 45/19) aprovado pela Câmara, a tributação passará a ocorrer no destino, e não mais na origem. A mudança é de simples operação ou pode trazer complicações e discussões?

Thiago Braichi e Romero Marinho: A previsão da PEC 45/19 é de que a incidência do imposto será no destino, o que significa que toda operação intermunicipal ou interestadual deverá ser tributada pela alíquota do destino da operação e esse imposto pertencerá ao Município ou Estado de destino.

De certa forma, apesar de não ser a regra, a tributação no destino já existe para ISS. Nos casos de execução de obras de construção civil por empreitada, o imposto é, por exemplo, devido no local de execução da obra.

Apesar de ser possível implementar essa mudança para que a incidência dos novos tributos seja sempre no destino da operação, existem diversas situações em que é difícil determiná-lo, como é caso de arrendamento de cabos e dutos que atravessam diversos Estados ou Municípios, ou transporte rodoviário no qual há desembarque de passageiros em estações entre a partida e o destino da viagem.

Portanto, entendemos que a simplicidade ou o potencial de discussões estará vinculado à qualidade da legislação complementar que detalhará o local (o destino) de incidência dos tributos. Caso a legislação não consiga deixar claro onde será considerado o “destino” das operações nessas situações atípicas, a mudança da regra poderá trazer mais dúvidas do que soluções.

Frederico Bakkum e Matheus Moitinho: Ainda é difícil dizer se a mudança na sistemática da tributação, da origem para o destino, trará discussões, tendo em vista que o fator relevante para esta análise são os critérios para definição do ente do destino da operação, que serão dispostos por Lei Complementar, considerando as peculiaridades de cada operação.

Nesse sentido, o inciso IV do §5º do artigo 156-A da PEC 45/19 prevê que a Lei complementar disporá sobre: “os critérios para definição do ente de destino da operação, que poderá ser, inclusive, o local da entrega, da disponibilização ou da localização do bem, o da prestação ou da disponibilização do serviço ou o do domicílio ou da localização do adquirente do bem ou serviço, admitidas diferenciações em razão das características da operação”.

Sendo certo que, para se analisar o futuro, devemos olhar para o passado, não se tem dúvidas de que o legislador complementar terá a difícil função de regular, com elevado grau de detalhes, as situações, critérios e conceitos a serem adotados para a identificação das hipóteses de incidência tributária e clareza quanto aos entes competentes para a tributação de cada operação.

Nesse sentido, relembre-se que, em junho de 2023, o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucionais dispositivos de lei complementar federal que deslocaram a competência para a cobrança do ISS do município do prestador do serviço para o do tomador (ADPF 499 e ADI’s 5835 e 5862). A fundamentação utilizada pelo ministro relator Alexandre de Moraes foi a falta de clareza da legislação em determinadas situações, o que, ao fim e ao cabo, manteria o potencial conflito fiscal. Nesse sentido, o ministro aduziu que “Somente diante de uma definição clara e exauriente de todos os aspectos da hipótese de incidência é possível ter previsibilidade e impedir conflitos de competência em matéria tributária”.

As possíveis complicações e discussões sobre a mudança da tributação da origem para o destino prevista na PEC dependerão da clareza dos critérios que serão adotados pelo legislador complementar, o que não será uma tarefa simples e provavelmente levará a questionamentos por parte do fisco e dos contribuintes.

Paulo Victor Vieira da Rocha e Marina Fernandes: A mudança da tributação da origem para o destino não é tão radical assim como parece, pois já vinha acontecendo, aos poucos, nos últimos anos, no próprio âmbito do ICMS. Isso se deu especialmente com a promulgação da Emenda Constitucional nº 87/2015, de acordo com a qual, no caso de operações interestaduais entre um contribuinte do imposto (comerciante) e um não contribuinte do imposto (consumidor final), o respectivo imposto passou a ser repartido entre os Estados da origem e do destino de forma progressiva ao longo dos 5 anos seguintes, até chegarmos à regra atual, segundo à qual se o Estado de destino for das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, além do Espírito Santo, a maior parte do imposto fica com o Estado de destino. Antes desta emenda (2015), nessas operações de vendas interestaduais a consumidores finais, o imposto cabia integralmente ao Estado de origem da mercadoria.

Embora essa mudança de matriz da origem para o destino já não seja uma completa novidade, não é tão simples e pode apresentar muitas dificuldades, especialmente por conta das dificuldades de se definir “o destino” das mercadorias e dos serviços que serão tributados pelos novos tributos (IBS e CBS). Isso porque a ideia por trás dos novos tributos é a de se tributar o consumo, mais especificamente, o consumo da renda ou a renda consumida.

Definir qual o destino é, no fundo, definir o local do consumo, o que, especialmente em cenários de economia digital, pode representar desafios. Como definir o local do consumo de uma assinatura de um programa de streaming? E de um software? Aliás, se alguém reside em um Estado, mas, durante sua estadia de duas semanas em um hotel em outro Estado da federação, compra pela internet algumas garrafas de vinho, consome metade delas durante a estadia e a outra metade leva para seu Estado de residência? Esses são apenas exemplos dos desafios que podem surgir dessas novas regras. Isso não quer dizer que sejam intransponíveis, nem tampouco que a mudança não deva ser feita. Mas é importante ter consciência deles para que possam ser lidados por meio da política fiscal.


– Alguns afirmam que a mudança da tributação da origem para o destino acabará com a guerra fiscal. Essa afirmação procede?

Thiago Braichi e Romero Marinho: A guerra fiscal é resultado de vários fatores e peculiaridades do nosso sistema tributário, que estimulam Estados e Municípios a concederem maiores benefícios para empresas que se instalam neles.

Entendemos que a tributação no destino será uma das mudanças que contribuirá com o fim da guerra fiscal, porque os Estados e Municípios não conseguirão aumentar sua arrecadação e atrair mais empresas contribuintes para seus territórios, já que a arrecadação ficará no Estado/Município do “consumidor” da operação. 

Frederico Bakkum e Matheus Moitinho: Não se tem dúvidas de que o fim da guerra fiscal é um dos grandes objetivos da reforma tributária e que a mudança da tributação da origem para o destino constitui as linhas mestras iniciais necessárias para que este fim seja alcançado.

No entanto, como visto na resposta ao item anterior, o fim da guerra fiscal dependerá muito dos critérios que serão adotados pela legislação complementar no exercício legiferante previsto no inciso IV do §5º do artigo 156-A da PEC 45/19.

Isso porque, como se viu em casos recentes julgados pelo STF (ADPF 499 e ADIs 5.835 e 5.862), uma legislação que não seja suficientemente clara e detalhada sobre como a tributação no destino irá ocorrer poderá contribuir para o conflito fiscal, não apenas na definição do ente legítimo para cobrar a exação, mas também para a definição do contribuinte da operação.

Paulo Victor Vieira da Rocha e Marina Fernandes: Quanto à guerra fiscal, em princípio, há uma forte tendência para que ela sofra expressiva queda com a tributação no destino, simplesmente porque “guerrear” nesse cenário é extremamente mais difícil para os Estados. O que comumente se denomina guerra fiscal, a muito grosso modo, é a disputa por investimentos entre os Estados, que usam a renúncia a impostos como instrumento dessa disputa. Dito de outra forma, governos estaduais oferecem às empresas benefícios fiscais e competem em torno de quem oferece os benefícios mais atrativos, que, obviamente, também vão ser ponderados pelas empresas ao lado de outros fatores, como os logísticos. Isso é ampla e facilmente possível quando se tributa mais a produção que o consumo ou, pelo menos, tributa-se a fase de produção, como é o caso do ICMS.

Mas é importante perceber que o ICMS já cabe ao Estado destino, pelo menos na última etapa de circulação dos bens que, em geral, é a venda ao consumidor final e, nem por isso, a guerra fiscal é impossível. Muito pelo contrário. Se o IBS e a CBS também vão incidir desde as primeiras fases de produção dos bens e serviços, a guerra fiscal, em princípio, já não é impossível no cenário desses tributos. É preciso ver se as regras de contenção da guerra fiscal do regime desses novos tributos têm maior potencial de eficácia que as regras de contenção da guerra fiscal do ICMS.

Também é importante ter em mente que o que se denomina comumente “guerra fiscal” também é proibido no regime do ICMS, só que as regras para contenção dessa prática são muito pouco eficazes, e não apenas por razões jurídicas. Já as regras de contenção da guerra fiscal pretendidas para o regime do IBS parecem sim mais eficazes. Então, em tese, tudo indica que a guerra fiscal será significativamente mitigada no regime da reforma.

Associada ao tema da guerra fiscal, outra crítica que se põe à atual concessão de incentivos fiscais é que os benefícios decorrentes desses estímulos são vistos a curto prazo, como a atração de investimentos e o desenvolvimento local da região beneficiada. No entanto, existem efeitos nocivos que somente podem ser sentidos em longo prazo, como a ineficiência na arrecadação e a manutenção das desigualdades entre os entes, sintomas decorrentes da guerra fiscal. Outros malefícios chegam até mesmo a ser sentidos no curto prazo, como a pouca eficiência produtiva que se têm quando se produz determinado bem em uma região que não tem vocação para tanto, muitas vezes desperdiçando-se outra vocação que aquela região possui, como se dá no recorrente exemplo dado nesse debate, de se produzir trigo na região Sul do Brasil e moê-lo na região Nordeste.


– O que é o Fundo de Desenvolvimento Regional, como ele vai funcionar e de que forma pode mitigar o fim da possibilidade de concessão de incentivos por parte dos estados? 

Thiago Braichi e Romero Marinho: O Fundo de Desenvolvimento Regional foi proposto como uma forma de alocação de recursos para fomentar o desenvolvimento de regiões e reduzir suas desigualdades.

A ideia é de que os recursos do fundo sejam utilizados para estudos, projetos e obras de infraestrutura e fomento de atividades produtivas com elevado potencial de geração de emprego e renda.

Entretanto, a regulamentação dos valores e da forma de aplicação desses recursos não está definida na PEC 45/19 e será delegada para legislação infraconstitucional. 

Frederico Bakkum e Matheus Moitinho: Fundo de Desenvolvimento Regional é uma diretriz criada pela proposta de emenda constitucional da reforma, que visa reduzir as desigualdades regionais e sociais, a partir de repasses feitos anualmente pela União aos Estados, com aportes em valores que partem de R$ 8 bilhões em 2029 chegando a R$ 40 bilhões a partir de 2033 (a expectativa é que o texto da PEC sobre os valores a serem concedidos sofra alterações em decorrência das negociações em andamento entre União e Estados).

O objetivo do fundo é estimular a manutenção de empreendimentos em regiões menos desenvolvidas e que deixarão de contar com a possibilidade de concessão de benefícios fiscais para atração das empresas ao seu território. O fundo visa compensar a perda de competitividade de determinadas regiões do país na atração de investimentos, por meio dos repasses.

Paulo Victor Vieira da Rocha e Marina Fernandes: Como forma de substituir o atual modelo de concessão de incentivos fiscais, a proposta de redação ao artigo 159-A da Constituição institui o Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), cujo objetivo é “reduzir as desigualdades regionais e sociais, mediante a entrega de recursos da União aos Estados e ao Distrito Federal”.

Esses recursos somente podem ser investidos em realização de estudos, projetos e obras de infraestrutura; fomento a atividades produtivas com elevado potencial de geração de emprego e renda, incluindo a concessão de subvenções econômicas e financeiras; e promoção de ações com vistas ao desenvolvimento científico e tecnológico e à inovação.

Ainda segundo o dispositivo legal, os critérios de partilha desses recursos serão definidos por Lei Complementar, sendo vedado à União que ela retenha ou imponha vedações à essa partilha, e que cabe aos Estados e ao DF decidir como será realizada a aplicação dos recursos recebidos.

O financiamento do Fundo será realizado pela União Federal que, em 2029, fará aporte no valor de R$ 8 bilhões, e nos seguintes realizará aportes crescentes e progressivos até 2033, quando devem chegar a R$ 40 bilhões.

Para além do que prevê o caput do referido dispositivo, o FDR busca compensar as perdas de arrecadação que serão suportadas pelos estados produtores, já que o imposto deixará de ser cobrado na origem, onde é realizada a produção, e passará a incidir em boa medida no destino, onde se verifica o consumo; e visa compensar a perda suportada pelos estados com a extinção dos incentivos fiscais de ICMS, que, conforme prevê a PEC, têm validade somente até 2032.

Cabe aqui mencionar brevemente que a PEC também prevê a criação do Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais, cujo propósito é compensar, até 31 de dezembro de 2032, os contribuintes beneficiários de incentivos fiscais concedidos por prazo certo e sob condição.

Trazendo mais detalhes à discussão, em 29/08/23, o secretário especial para Reforma Tributária, Bernard Appy, afirmou que o FDR será mais eficiente que os incentivos fiscais atualmente existentes. Segundo o secretário, a vantagem auferida pelos estados com os benefícios fiscais é mitigada pelo fato de que todos os estados-membros, incluindo os mais desenvolvidos, são beneficiados pelos incentivos, o que acaba por mitigar a redução de desigualdade entre os entes. Além disso, Appy aponta que o FDR permitirá que sejam beneficiados setores que hoje não estão amparados pelos incentivos fiscais, como é o caso do setor de serviços. Por fim, Appy acrescenta que a parcela remanescente do Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais convalidados será remanejada para o FDR, e que é muito provável que isso ocorra ao final do ano de 2032.

Dentre os principais questionamentos surgidos diante da criação do FDR, está a proporção em que será efetuada a partilha dos recursos do Fundo em relação à cada ente federativo. Os Estados do Centro-oeste e do Nordeste discutem com o governo a possibilidade de que o fundo seja distribuído apenas a Estados do Norte, Centro-oeste e Nordeste; possibilidade, esta, que vem sendo contestada pelos Estados do Sul e Sudeste.

O governador do Piauí, Rafael Fonteles, defende que o critério de rateio do FDR deve ser, por exemplo, a renda per capita de cada ente federativo e não o tamanho de sua população, já que isso favoreceria estados mais desenvolvidos, como São Paulo.

Quanto a esse conflito, o Relatório do Grupo de Trabalho da Câmara dos Deputados (Relatório do GT) traz sugestão do deputado Sidney Leite de que sejam utilizados os mesmos critérios de partilha do Fundo de Participação dos Estados (FPE). Atualmente, o rateio do FPE entre os Estados destina 85% do Fundo para os Estados das regiões Centro-oeste, Nordeste e Norte, e 15% para os das regiões Sudeste e Sul.

Outra preocupação decorrente da criação do FDR, é quais serão os impactos da extinção dos benefícios fiscais de ICMS atualmente existentes e como isso impactará as empresas que atualmente se beneficiam deles.

Segundo o Relatório do GT, há uma grande preocupação com relação às regiões que experimentaram grande desenvolvimento a partir da atração de investimentos por meio da concessão de incentivos fiscais. Para o grupo, “O entendimento majoritário é o de que a guerra fiscal precisará ser substituída por outras políticas públicas, mais eficientes ao longo do tempo, que permitam o desenvolvimento equilibrado entre as diferentes regiões brasileiras”.


– Em linhas gerais, quais são os impactos esperados da mudança da tributação no destino para as empresas, consumidores e entes federativos? 

Thiago Braichi e Romero Marinho: Em linha com as demais respostas, entendemos que a mudança da tributação para o destino auxiliará na redução da guerra fiscal, pois essa alteração fará com que os novos tributos estejam mais bem preparados para evitar que os entes federativos disputem a arrecadação através da concessão de benefícios para empresas em seus territórios.

Além disso, essa mudança é necessária para que o imposto sobre valor agregado (IVA) seja realmente uma tributação sobre o consumo, já que é no destino onde se encontram os consumidores. Para fins comparativos, o ICMS e o ISS tendem a ser considerados impostos sobre a produção, exatamente por serem, em regra, tributados no local onde o produtor (ou prestador de serviço) está estabelecido.

Por fim, esperamos que as legislações infraconstitucionais, que irão regulamentar a questão do “destino” e trarão as diretrizes do Fundo de Desenvolvimento Regional sejam elaboradas da melhor forma possível, evitando distorções e futuras discussões entre os contribuintes e os Fiscos.

Frederico Bakkum e Matheus Moitinho: O impacto da mudança da tributação da origem para o destino dependerá muito da Legislação Complementar que efetivamente deverá prever como cada operação será tributada, prevendo, pormenorizadamente, os critérios para definição do ente do destino da operação, a definição dos adquirentes dos bens ou serviços e do domicílio desses adquirentes, dentre outros.

Partindo da premissa de que o legislador complementar conseguirá definir os critérios com a clareza esperada, é possível se esperar um impacto positivo para as empresas e consumidores, na medida em que haverá previsibilidade e consequentemente incremento de segurança jurídica, e um impacto positivo também para os entes federativos, com a melhor distribuição da arrecadação tributária pelo território nacional e redução da guerra fiscal.

Paulo Victor Vieira da Rocha e Marina Fernandes: A mudança da matriz da tributação na origem para o destino parece ter efeito relativamente pequeno para os consumidores em comparação a empresas e entes federativos. Estes últimos tendem a ser muito impactados, já que Estados com elevado consumo, mas pequena produção, podem sentir um incremento na arrecadação e vice-versa.

Já empresas tendem a ser profundamente impactadas, pois a estrutura de incidência dos tributos tende a se alterar bastante e elas precisarão talvez, até, rever a formação de preços. O principal impacto para elas, contudo, pode estar no cumprimento de obrigações acessórias, que tende a mudar drasticamente (espera-se que para melhor). Há muitas condições para isso. Mas, com o histórico e cultura de obrigações acessórias que temos no Brasil, é um pouco difícil ser muito confiante com relação a esse ponto. A mudança no padrão das obrigações acessórias é inevitável, vai ocorrer. A questão é apenas saber se será positiva. Como dito, há plenas condições para tanto, mas apenas o tempo poderá confirmar tal evolução.


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