A confusão entre as empresas de chocolate e os impactos do registro de marcas no mercado

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Em maio de 2023, muito se falou sobre a notícia[1] relacionada à marca de chocolates Trento, agora Peccin.

De acordo com Dirceu Pezzin, presidente da Peccin, e Carlos Scarpa, diretor comercial, a Trento foi responsável pela criação de um “novo nicho de mercado”. Eles afirmam que o chocolate foi “copiado” por marcas que já estavam consolidadas no país. Para exemplificar, citam a Hershey’s, que lançou, em 2020, o Chocotubes, e a Mondelez (dona da Lacta), que desde 2022 vende Sonho de Valsa e Ouro Branco nas versões “stick”.

Abaixo, inclusive, vale comparar as imagens das marcas:

chocolate chocolate chocolate

Assim, o diretor comercial reclama que marcas concorrentes estão produzindo o mesmo produto que a Trento, isto é, o chocolate na versão stick.

Explicamos neste artigo os aspectos legais envolvendo o direito de marca, bem como a (im)possibilidade de marcas iguais conviverem dentro do mesmo segmento. O artigo ainda abordará, de forma resumida, os aspectos legais envolvendo o direito de patente no presente caso.

Das marcas

A princípio, é preciso explicar que uma marca designa sempre um produto ou um serviço específico. Ela pode ser nominativa, figurativa ou mista.

Marca nominativa é o sinal constituído por uma ou mais palavras no sentido amplo do alfabeto romano, compreendendo, também, os neologismos e as combinações de letras e/ou algarismos romanos e/ou arábicos, desde que esses elementos não se apresentem sob forma fantasiosa ou figurativa.

Marca figurativa, por sua vez, pode ser representada por desenho, imagem, figura e/ou símbolo; qualquer forma figurativa de letra/algarismo isoladamente ou acompanhado por desenho etc.

A marca mista é uma composição entre a nominativa e a mista, isto é, ela apresenta os dois elementos.

Com relações às funções da marca, cabe expor que ela serve justamente para individualizar um produto ou serviço, de modo a permitir que o consumidor possa realizar o consumo de maneira informada e consciente.

Não obstante, a marca, quando devidamente registrada, incorpora-se ao patrimônio do seu proprietário, permitindo que este realize os atos de defesa cabíveis, à luz do direito de propriedade.

Por isso, o art. 124, inciso V, da Lei 9.279/96[2] veda que alguém registre marca semelhante em classes[3] iguais, na medida em que o registro semelhante pode (i) causar confusão no consumidor que pensa está consumindo um produto/serviço, mas na verdade está consumindo outro; (ii) gerar desvio de clientela, já que o proprietário, que poderia estar recebendo pelo consumo de seus produtos/serviços, deixa de auferir vantagem econômica em razão da confusão gerada. Assim, tem-se clara a intenção do legislador no sentido de conferir proteção sob as duas óticas: do consumidor e do proprietário.

No caso, a Trento é uma marca de chocolate que designa como produto os chocolates na versão stick. Sob essa perspectiva, seu diretor comercial entende que a referida marca teve seu produto copiado pelas concorrentes, já que dá a entender que a empresa o teria inventado.

Nesse contexto, é sabido que, diante da quantidade de serviços/produtos exsurgentes, o mercado não está livre de se deparar com marcas semelhantes que produzam produtos iguais. Neste caso, é preciso entender como solucionar conflitos envolvendo marcas iguais e/ou conflitos quando uma marca copia o produto da outra.

Da solução para eventual conflito

De início, deve-se analisar se as marcas, de fato, geram – ou não – confusão no consumidor. Para tanto, deve-se levar em conta os aspectos visuais – principalmente nas marcas figurativas e mistas – e os aspectos sonoros.

Caso se entenda que o consumidor, norteado pela noção do homem médio[4], possa ser “enganado” ao consumir o produto/serviço no mercado, alguns requisitos serão aplicados para se identificar qual detentor da marca tem direito à proteção no âmbito do direito de marca.

Assim, é preciso identificar se aquela marca designa produto ou serviço do mesmo segmento da outra – isto é, é preciso saber se os serviços ou produtos fazem concorrência entre si, devendo a semelhança ser analisada à luz do princípio da especialidade[5]. Caso tais produtos ou serviços estejam relacionados a nichos de mercados diferentes, poderão as marcas, ainda que semelhantes, conviver entre si. É o caso, por exemplo, das marcas Lojas Renner e Tintas Renner.

Vale dizer, inclusive, que, para facilitar tal identificação, o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) separa as marcas por Classes, de modo que cada Classe indica um tipo de serviço ou produto designado pela marca. Assim, quando feito o registro, o solicitante deve enquadrar a marca à luz do serviço/produto (Classe) que pretende designar.

Por outro lado, caso as marcas designem produtos ou serviços do mesmo segmento (e, consequentemente, estejam na mesma Classe), deverá o intérprete, para solucionar o conflito, analisar quem registrou primeiro a referida marca no INPI, à luz do princípio da anterioridade[6].

Caso se constate que determinada marca foi registrada anteriormente à outra (ou que a outra marca não tenha registro), terá direito de proteção aquele quem registrou primeiro. Importante esclarecer que, para fins de análise, deve ser analisada a data do pedido de registro – em vez da data de seu deferimento.

À exceção do princípio da anterioridade do registro, tem-se que terá direito ao uso da marca aquele que, de boa-fé, comprovar o uso da marca há pelo menos seis meses para identificar produto ou serviço. Tal exceção está contida no §1º, do art. 129, da Lei 9.279/96[7].

Ademais, caso se constate que as marcas não são conflituosas entre si, o direito de marca não conferirá proteção à parte, ainda que a concorrente exiba um produto semelhante ao da marca reivindicante.

Por outro lado, caso o detentor da marca comprove a individualização e a particularização de seu produto, poderá, eventualmente, discutir o tema à luz do direito de patente. Patente é o direito concedido a um inventor ou titular pelo INPI, que oferece o uso exclusivo de uma invenção por um período limitado.

No entanto, o direito de patente possui diversos outros requisitos, de modo que, apesar de algumas patentes relacionadas a alimentos já terem sido concedidas pelo INPI, elas não se referem a uma receita em si, mas, sim, a um processo de produção de um alimento – o que envolve aspectos técnicos. Em outras palavras, o INPI não concede patentes para simples criações de receitas de alimentos ou bebidas.

Em suma, caso a Trento queira exigir proteção de seu produto, deverá fazê-lo comprovando uma nova técnica utilizada para produzir o stick ou demonstrando, ainda, que houve plágio/roubo do “segredo industrial” que envolve a receita de seu chocolate.

Por isso, se conclui que, caso a Trento entenda ter tido seu direito de marca violado, deverá analisar os requisitos ora mencionados para reivindicar tal proteção.

Por outro lado, caso entenda que teve um produto que inventou copiado, poderá requerer tal proteção à luz do direito de patente. No entanto, repita-se, produtos alimentícios não costumam ter a referida proteção, embora o INPI já tenha conferido tal registro em casos em que se comprove a invenção de técnica ou procedimento na fabricação.


Coautoria de Ana Laura Coury do Nankran Mourão Brito Massoli


[1] https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2023/05/21/peccin-empresa-que-produz-o-trento-e-inspirou-grandes-marcas-de-chocolate.htm < Acesso em 12 de julho de 2023 >
[2] Art. 124. Não são registráveis como marca: V – reprodução ou imitação de elemento característico ou diferenciador de título de estabelecimento ou nome de empresa de terceiros, suscetível de causar confusão ou associação com estes sinais distintivos;
[3] Quando um pedido de marca é depositado, é necessário indicar quais produtos/serviços sua marca visa a proteger. O INPI adota a Classificação Internacional de Produtos e Serviços de Nice (NCL, na sigla em inglês), que possui uma lista de 45 classes com informações sobre os diversos tipos de produtos e serviços e o que pertence a cada classe.
[4] O “homem médio” é a criação jurídica de uma espécie de personagem que pode servir de medida para o comportamento de todos os demais seres humanos. Ao analisar uma situação, verifica-se a conduta que seria adotada por um indivíduo comum (o homem médio) e, assim, sua conduta servirá de exemplo para os demais comportamentos humanos.
[5] O princípio de especialidade envolve a proteção assegurada à marca, que recai sobre produtos ou serviços correspondentes à atividade do requerente, visando distingui-los de outros idênticos ou similares, de origem diversa.
[6] O princípio de anterioridade estabelece que será protegida a marca que primeiro foi registrada.
[7] Art. 129. A propriedade da marca adquire-se pelo registro validamente expedido, conforme as disposições desta Lei, sendo assegurado ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional, observado quanto às marcas coletivas e de certificação o disposto nos arts. 147 e 148:  § 1º Toda pessoa que, de boa fé, na data da prioridade ou depósito, usava no País, há pelo menos 6 (seis) meses, marca idêntica ou semelhante, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, terá direito de precedência ao registro
4 Comentários
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