Ofício da CVM esclarece sobre tokens de recebíveis

Documento buscou diferenciar enquadramento como operação de securitização ou contrato de investimento coletivo

0

Em abril, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) alertou o mercado que alguns tokens de recebíveis ou de renda fixa, que estavam seguindo o rito e as normas de securitização, poderiam ser enquadrados como contratos de investimento coletivo (CIC). Agora, a autarquia complementa as orientações ao mercado por meio do Ofício Circular 06/23 da Superintendência de Supervisão de Securitização (SSE) – o objetivo foi esclarecer quando um token de recebíveis ofertado publicamente é uma operação de securitização, um CIC ou ambos.

A autarquia esclareceu que os tokens de recebíveis não serão considerados operações de securitização quando houver a oferta pública de um único direito creditório; o fluxo de caixa do direito creditório fluir diretamente para os investidores; não houver mecanismos predeterminados para a substituição, recompra ou revolvência do direito creditório cedido, nem qualquer coobrigação pelo adimplemento do contrato de investimento coletivo ofertado; não houver prestadores de serviço previamente contratados; e em caso de inadimplência, couber ao investidor adotar as medidas de cobrança judiciais ou extrajudiciais.

Se for descartada a possibilidade de o token de recebíveis ser uma operação de securitização, é possível ainda que ele seja um CIC, também sujeito às normas da CVM. Conforme o ofício: “Esta SSE entende que o conjunto compreendido pelo ativo (direito creditório), pela oferta pública de distribuição (como token ou através de outro meio) e pela expectativa de ganho (remuneração) para o investidor, como explorado no OC 4/23, pode caracterizar uma oferta de investimento, no mínimo, como de contrato de investimento coletivo, quando não restarem presentes outras condições para a caracterização de uma operação de securitização.” O CIC é considerado um valor mobiliário – e, como tal, sua oferta pública deve seguir as normas da CVM. O mesmo acontece com a securitização, que, segundo o ofício, geralmente se caracteriza pela “(i) aquisição de direitos creditórios por um veículo; (ii) a emissão de títulos por esse veículo lastreados nos direitos creditórios; e (iii) a vinculação do pagamento do título ao recebimento dos direitos creditórios.”

“Entende-se que a interpretação da CVM poderá gerar elevação nos custos operacionais das tokenizadoras quando os ativos ofertados se enquadrarem como valores mobiliários. Em contrapartida, tal medida tende a aumentar o nível de transparência, o que entendemos ser benéfico ao mercado”, avaliam Felipe Hanszmann, Caio Brandão e Thomaz Veiga, sócio e associados do Vieira Rezende Advogados.

Na entrevista abaixo, Hanszmann, Brandão e Veiga abordam o Ofício Circular.


– Quais são os principais pontos do Ofício Circular CVM SSE 06/2023 da CVM? O que ele trouxe de novo em relação ao Ofício Circular 04/023? 

Felipe Hanszmann, Caio Brandão e Thomaz Veiga: Em resumo, o Ofício Circular nº 6/2023/CVM/SSE (Ofício Circular 06/23) teve como objetivo complementar as primeiras orientações fornecidas ao mercado pela CVM pelo Ofício Circular nº 04/2023/CVM/SSE (Ofício Circular 04/2023), sobre o enquadramento de operações de tokenização de recebíveis e de ativos de renda fixa. No Ofício Circular 04/2023, a Superintendência de Supervisão de Securitização (SSE) havia apresentado os argumentos que embasaram a conclusão de que tokens de recebíveis e de renda fixa, que estavam seguindo o rito e as normas de securitização, poderiam ser enquadrados como contratos de investimento coletivo a depender do caso concreto, hipótese em que sujeitariam ao regime aplicável a valores mobiliários.

Após diversos questionamentos do mercado sobre a aplicabilidade da conclusão da SSE para todas as operações de securitização destes ativos, expediu-se o Ofício Circular 06/23 a fim de esclarecer os critérios utilizados para diferenciação entre uma operação de securitização e de tokenização de valores mobiliários.


– De acordo com o Ofício Circular, quando um token de recebíveis será considerado uma operação de securitização e quando será um contrato de investimento coletivo?

Felipe Hanszmann, Caio Brandão e Thomaz Veiga: Conforme disposto no Ofício Circular 06/23, serão considerados contratos de investimento coletivo, e não operações de securitização, quando, cumulativamente, em síntese:

  1. a) há oferta pública de um único direito creditório;
  2. b) o fluxo de caixa do direito creditório flui diretamente para os investidores;
  3. c) não há mecanismos predeterminados para a substituição, recompra ou revolvência do direito creditório cedido, nem qualquer coobrigação pelo adimplemento do contrato de investimento coletivo ofertado;
  4. d) não há prestadores de serviço previamente contratados; e
  5. e) em caso de inadimplência, cabe ao investidor adotar as medidas de cobrança judiciais ou extrajudiciais, podendo o investidor, diretamente às suas expensas, contratar agentes de cobrança.

– Em que situações as tokenizadoras terão que se enquadrar às regras referentes ao crowdfunding e por que isso será necessário?

Felipe Hanszmann, Caio Brandão e Thomaz Veiga: A CVM entende que devido aos desafios operacionais para o registro e oferta destes ativos, caso as tokenizadoras e securitizadoras desejem realizar as ofertas, podem utilizar-se dos mecanismos previstos para as ofertas de crowdfunding, nos termos da Resolução CVM nº 88/2022 (RCVM 88). Nesse caso, a SSE entende que o emissor poderá considerar como patrimônio separado para todos os efeitos, incluindo:

(a) para o limite de faturamento de R$ 40 milhões ou R$ 80 milhões, conforme disposto na RCVM 88;

(b) para o valor máximo de captação de R$ 15 milhões, conforme disposto na RCVM 88;

(c) para o somatório da captação total, e

(d) para o prazo de 120 dias de intervalo entre ofertas.

Esclarece-se que tal interpretação está em linha com o arcabouço regulatório dos fundos de investimentos, para os quais o patrimônio separado é reconhecido como um emissor.


– O entendimento da CVM terá algum impacto sobre as operações de tokenização e sobre as tokenizadoras?

Felipe Hanszmann, Caio Brandão e Thomaz Veiga: Entende-se que a interpretação da CVM poderá gerar elevação nos custos operacionais das tokenizadoras quando os ativos ofertados se enquadrarem como valores mobiliários. Em contrapartida, tal medida tende a aumentar o nível de transparência, o que entendemos ser benéfico ao mercado. É importante ressaltar que as orientações da CVM não possuem caráter normativo, mas, sim, de instrução ao mercado sobre as interpretações das áreas técnicas sobre as possibilidades de enquadramento dos tokens de recebíveis ou tokens de renda fixa como valores mobiliários.


Leia também

CVM esclarece atuação com criptoativos

CVM alerta para necessidade de oferta pública de tokens

Série Cripto Law

Deixe uma resposta

Seu endereço de e-mail não será publicado.