Uso de precatórios: entraves serão retirados?

Minuta de norma da AGU em consulta pública ainda coloca obstáculos para utilização

1

A possibilidade de uso de precatórios do governo federal para o pagamento de outorgas e para a compra de imóveis existe desde 2021, quando o governo estabeleceu um teto para o pagamento dessas dívidas. No entanto, na prática o uso alternativo dos precatórios enfrenta dificuldades. Recentemente, a Advocacia-Geral da União (AGU) colocou em audiência pública uma minuta de regulamentação para o uso dos precatórios, mas ainda com pontos que dificultam a utilização por parte dos credores.

“A que mais dificulta é aquela que determina que o edital deve dispor sobre o uso de precatórios, sem dar as bases para tanto, abrindo margem para uma discricionariedade muito ampla de cada ministério para aceitar o não”, avalia Maria Virginia Mesquita, sócia do Vieira Rezende Advogados. De acordo com a minuta – que recebeu contribuições do mercado até o dia 24/06 – os editais de concessão devem prever expressamente a possibilidade de pagamento da outorga por meio dos precatórios.

Outra condição que pode ser um entrave, considera Mesquita, são as garantias exigidas por parte de quem vai usar o precatório para pagar a outorga ou o imóvel – elas seriam necessárias porque o crédito a que se refere o precatório pode ser desconstituído ou mesmo o precatório ser questionado, e porque já houve fraudes envolvendo precatórios no passado. “Nossa opinião é a de que, se o ofertante do precatório apresentar a certidão de valor líquido disponível e não houver ações pendentes para desconstituir o crédito que lastreia o precatório, a garantia deve ser dispensada. Ela somente pode ser exigida caso haja dúvida (fundada!) quanto à solidez do título”, considera.

A minuta também prevê que o Ministério da Fazenda e a AGU podem definir um limite global anual para o uso de precatórios. As dificuldades para o uso efetivo dos precatórios se estendem desde a publicação da Emenda Constitucional 113/21. Recentemente, a Aena, operadora aeroportuária espanhola, desistiu de usar precatórios para pagar a outorga referente à concessão do aeroporto de Congonhas. Em março deste ano, a AGU suspendeu a Portaria 73/22, publicada em dezembro de 2022, que regulamentava o uso dos precatórios – o argumento foi o de que faltava segurança jurídica para tanto. A regulamentação colocada em audiência pública é uma tentativa de esclarecer a questão. Para Mesquita, embora ainda haja pontos que podem ser ajustados, a consulta pública é algo salutar.

Na entrevista abaixo, Mesquita aborda pontos da minuta de norma da AGU.


– Quais são as principais exigências estabelecidas pelo governo para a aceitação do uso de precatórios para pagamento de concessões ou compra de imóveis, de acordo com a minuta de regulamentação da AGU e do Ministério da Fazenda?

Maria Virginia Mesquita:  Na minuta de portaria disponibilizada, as principais exigências parecem ser a apresentação da certidão de valor líquido disponível (expedida pelo Tribunal que expediu o precatório) e as garantias.


– Por que a minuta prevê a oferta de garantias por parte do interessado em utilizar precatórios? Em tese, o pagamento dos precatórios não seria garantido pelo próprio governo federal?

Maria Virginia Mesquita: A pergunta é pertinente. A minuta prevê garantias para o caso de o crédito a que se refere ser desconstituído, ou até mesmo o precatório ser questionado. O precatório não é exatamente garantido pelo governo federal. Ele representa uma obrigação de pagar do governo federal (se o precatório for federal também) a uma parte privada. A exigência de garantia se dá porque já houve fraudes com precatórios no passado. Nossa opinião é a de que, se o ofertante do precatório apresentar a certidão de valor líquido disponível e não houver ações pendentes para desconstituir o crédito que lastreia o precatório, a garantia deve ser dispensada. Ela somente pode ser exigida caso haja dúvida (fundada!) quanto à solidez do título.


– De acordo com a minuta, como seria a sistemática de uso dos precatórios para pagamento de outorgas ou compra de imóveis do governo federal?

Maria Virginia Mesquita: Aquele que arrematar o imóvel em algum procedimento ou tenha de outra forma contratado a aquisição com o governo federal deverá indicar que pretende pagar o bem em títulos precatórios, por meio de um requerimento, apresentando os documentos de mais informações exigidos.


– Em sua opinião, as condições estipuladas pela minuta viabilizam o uso dos precatórios? Há pontos que precisam ser aprimorados?

Maria Virginia Mesquita: Algumas condições dificultam. A que mais dificulta é aquela que determina que o edital deve dispor sobre o uso de precatórios, sem dar as bases para tanto, abrindo margem para uma discricionariedade muito ampla de cada ministério para aceitar o não. A questão das garantias também pode ser um impeditivo. A garantia pode ser substituída pela garantia de execução contratual (que garantiria o pagamento de outorga, caso o pagamento em precatório fosse por qualquer motivo anulado), no caso do uso de precatórios para pagar outorga, ou pela reserva de domínio ou outra forma de garantia sobre o imóvel, no caso de uso desses títulos para compra de imóveis. Esses pontos podem ser aprimorados. A boa notícia é que, dessa vez, a Advocacia-Geral da União colocou o documento em consulta pública e está aberta a sugestões, o que é muito salutar.


Leia também

Como funciona o mercado de negociação de precatórios

União regulamenta uso de precatórios

1 comentário
  1. pedro silva Diz

    muito legal esse site parabéns pelo conteúdo.

Deixe uma resposta

Seu endereço de e-mail não será publicado.