Em decisão polêmica, STJ opta por tributação de depósitos judiciais

Preferência dos contribuintes agora deve recair sobre a repetição de indébito, isenta de impostos

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Após recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), duas situações diferentes passam a existir para os contribuintes que questionam o pagamento de determinado tributo: enquanto aqueles que pagarem impostos a mais e buscarem a devolução dos tributos por meio da repetição de indébito não terão os rendimentos da taxa Selic tributados, aqueles que realizarem depósitos judiciais terão os rendimentos tributados pelo imposto de renda da pessoa jurídica (IRPJ) e pela contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL). Essa decisão – polêmica – deverá mudar a estratégia dos contribuintes, tornando o depósito judicial menos vantajoso.

A questão se refere a duas opções que os contribuintes têm quando questionam o pagamento de um tributo: ou eles pagam o tributo e posteriormente pleiteiam a devolução do mesmo ou realizam depósitos judiciais (para garantir o pagamento no futuro, caso percam o processo). Em ambas as situações, se o contribuinte vencer a causa, os recursos retornam para ele corrigidos pela taxa Selic. O que o STJ julgou foi se os rendimentos obtidos pela Selic deveriam ser tributados.

A corte entendeu que sim, no caso dos depósitos judiciais, e não, na repetição de indébito. Neste último caso, o STJ alinhou o seu entendimento à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do Tema nº 962 da Repercussão Geral – na ocasião, a Suprema Corte afastou a incidência do IRPJ e da CSLL sobre a taxa Selic recebida na devolução de tributos pagos indevidamente (indébito tributário).

O STF entendeu, na ocasião, que juros de mora legais têm natureza indenizatória – e, portanto, a tributação não seria adequada. A expectativa era a de que o STJ alinhasse a sua decisão à do STF não apenas com relação à repetição de indébito, mas também aos depósitos judiciais.

No entanto, para o STJ, os juros incidentes na devolução dos depósitos judiciais têm natureza remuneratória, por recomporem determinada situação jurídica, representando acréscimo patrimonial – e, portanto, caberia a tributação.  Esse entendimento é questionado por advogados tributaristas, que consideram que as situações – repetição de indébito e depósitos judiciais – são semelhantes. Em ambos os casos, o contribuinte não dispõe momentaneamente de seus recursos quando há uma cobrança tributária indevida – até que os recursos retornem, corrigidos pela Selic.

“O resultado do julgamento do REsp nº 1.138.695 confronta com o entendimento firmado pelo STF no julgamento do Tema 962”, avaliam Pedro Simão e Júlia Swerts, sócio e associada do Freitas Ferraz Advogados. Eles explicam que, quando o STF julgou a questão, o relator do caso, ministro Dias Toffoli, entendeu que os juros de mora não configuram lucros cessantes e estão fora do campo de incidência do IRPJ e da CSLL porque objetivam recompor perdas e não implicam em aumento do patrimônio do credor. “Nesse sentido, ainda se espera que as razões de decidir utilizadas pelo STF no julgamento do Tema 962, no sentido de que os juros de mora legais possuem natureza de indenização e com isso restar afastada a tributação pelo IRPJ e CSLL sobre a taxa Selic recebida na devolução de tributos pagos indevidamente, sejam utilizadas pelo STJ na análise da tributação dos ganhos obtidos em depósitos judiciais.”

Outro ponto que levantou questionamento é que a decisão do STJ se aplica apenas ao indébito tributado corrigido pela Selic e não vale para outros índices, como INPC, IPCA, IGP-M, TR + 0,5% de juros, TR + Meta Selic) – nesses casos, a tributação sobre esses valores ocorrerá normalmente. “Em nossa visão, a decisão da Primeira Seção não foi a mais acertada porque, considerando que a taxa Selic (objeto da decisão pelo STF) engloba juros e correção monetária, é plausível que, de forma ampla, sem se restringir à taxa Selic, os demais indexadores econômicos aplicados para tal finalidade nas repetições de indébito tributário e recuperação de depósitos judiciais e precatórios tampouco configurem acréscimo patrimonial ou lucro e, portanto, sejam afastados da incidência do IRPJ e da CSLL”, avaliam Fernanda Rizzo e Leonardo Di Gianni, associados do Vieira Rezende Advogados.

Na entrevista abaixo, Simão, Swerts, Rizzo e Di Gianni detalham e avaliam o julgamento do STJ.


Em julgamento recente, a expectativa era que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) alinhasse o entendimento referente à tributação, pelo IRPJ e pela CSLL, de depósitos judiciais e repetição de indébito. Por que isso não ocorreu?

Fernanda Rizzo e Leonardo Di Gianni: O STJ acolheu parcialmente o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF). Isso porque alterou o entendimento do Tema nº 505 para retirar da base de cálculo do IRPJ e CSLL os valores atinentes aos juros Selic incidentes na repetição de indébito tributário, esclarecendo que se deve observar a modulação de efeitos prevista no Tema nº 962 da Repercussão Geral do STF.

Anteriormente ao julgamento do STF, o entendimento do Tema nº 505/STJ, agora reformado, era pela inclusão na base de cálculo do IRPJ e CSLL dos juros incidentes na repetição do indébito tributário.

Veja-se, portanto, que houve uma singela alteração do entendimento do STJ, pois acatou-se a decisão da Suprema Corte para afastar a incidência do IRPJ e CSLL somente nas hipóteses de repetição de indébito tributário que sejam corrigidos pela Taxa Selic – o que antes não acontecia.

Assim, a partir da decisão do STJ, é possível dizer que quando a repetição de indébito ocorrer e o valor a ser restituído ao contribuinte for corrigido por outro índice que não a Taxa Selic (tais como INPC, IPCA, IGP-M, TR + 0,5% de juros, TR + Meta Selic), a tributação sobre esses valores ocorrerá normalmente.

Além disso, havia, de fato, a expectativa que o STJ reformasse seu entendimento quanto à não-incidência de IRPJ e CSLL sobre os juros de mora e correção monetária incidentes sobre os valores depositados judicialmente.

Contudo, o STJ manteve o seu entendimento manifestado nos Temas nº 504 e nº 878: os juros incidentes na devolução dos depósitos judiciais são tributados pelo IRPJ e CSLL (Tema nº 504); incide Imposto de Renda sobre os juros de mora, por possuírem, em regra geral, natureza de lucros cessantes (Tema nº 878); os juros de mora decorrentes do pagamento em atraso de verbas alimentares a pessoas físicas não estão sujeitos ao Imposto de Renda, posto que, excepcionalmente, configuram indenização por danos emergentes (Tema nº 878); escapam à regra geral de incidência do Imposto de Renda sobre juros de mora aqueles cuja verba principal seja isenta ou fora do campo de incidência do IR (Tema nº 878).

Isso ocorreu porque o STJ, desenvolvendo raciocínio bastante limitador, entendeu que haveria uma excepcionalidade no julgamento realizado pelo STF, no sentido de que a causa em questão versava apenas sobre a taxa Selic percebida em razão da repetição de indébito tributário que, excepcionalmente nessa situação, não possuiria natureza de lucros cessantes.

Júlia Swerts e Pedro Simão: Para contextualizar, em dezembro de 2022, o STF concluiu o julgamento do Tema 962, que afastou a incidência do IRPJ e da CSLL sobre a taxa Selic recebida na devolução de tributos pagos indevidamente, a chamada repetição de indébito tributário.

Após o julgamento dos Embargos de Declaração opostos pela União Federal, o colegiado esclareceu que a tese fixada abrangeria apenas as hipóteses em que há acréscimo de juros moratórios, mediante a aplicação da taxa Selic, na repetição de indébito tributário na esfera administrativa e judicial (inclusive na realizada por meio de compensação). Adicionalmente, sobre a tributação dos valores relativos à taxa Selic recebidos no levantamento de depósitos judiciais, restou definido ser matéria de natureza infraconstitucional a ser analisada pelo STJ.

Diante disso, o REsp 1.138.695 foi remetido à Primeira Seção do STJ para análise de eventual “juízo de retratação” em relação a julgamento anteriormente ocorrido em 2013, quando firmou-se o entendimento pela incidência do IRPJ e da CSLL sobre os juros incidentes na devolução de valores decorrentes de depósito judicial.

Assim, de fato, havia a expectativa de alinhamento conceitual da jurisprudência do STJ à regra geral fixada pelo STF, no sentido de que os juros de mora legais possuem natureza de indenização, a afastar a sua tributação pelo IRPJ e pela CSLL.

No entanto, em novo julgamento do REsp nº 1.138.695, o STJ considerou que somente precisaria compatibilizar sua jurisprudência com o entendimento firmado pelo STF nas discussões referentes à incidência do IRPJ e da CSLL sobre a taxa Selic recebida na devolução de tributos pagos indevidamente, justamente porque, no Tema 962, não foi definida a tributação a ser aplicada sobre a Selic oriunda dos depósitos judiciais (por se tratar de matéria de natureza infraconstitucional).


– O que embasou a decisão da 1ª Seção do STJ no caso julgado (n° 1138695)?

Fernanda Rizzo e Leonardo Di Gianni: A decisão do STJ foi embasada, singelamente, no princípio da segurança jurídica. Sob a perspectiva do STJ, alterar a jurisprudência construída pela própria corte poderia promover novas instabilidades jurisprudenciais a respeito dos precedentes aplicáveis, o que afetaria a segurança jurídica desejável para os casos que envolvam a tributação dos juros de mora.

Assim, na visão do STJ, deveria se evitar uma indevida aplicação extensiva do precedente do STF para situações que nele não comportam, sendo necessária a aplicação de uma disposição específica do Código de Processo Civil, a qual dispõe que os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.

Para chegar a essa conclusão, o STJ entendeu que o STF considerou que a taxa Selic devida na repetição de indébito tributário comportaria a um só tempo correção monetária e juros de mora, não havendo como segmentar as parcelas indenizatórias referentes ao dano emergente e os lucros cessantes, sob pena de haver uma descaraterização de sua própria natureza.

Com isso em vista, o STJ desenvolveu seu raciocínio diferenciando os significados de “dano remoto” e “dano emergente”, este último como oposição ao primeiro. Entendeu o STJ que o STF acabou por trazer para o conceito de indenização o tecnicamente chamado “dano remoto” (ou dano indireto) – aquele dano decorrente dos compromissos feitos pelo credor em seu próprio prejuízo durante a mora do devedor e que não estavam no contrato e não eram previsíveis pelo devedor.

Portanto, para o STJ, invocar eventuais prejuízos que o credor vier a sofrer ao tomar dinheiro emprestado para saldar suas obrigações porque o devedor está em mora com ele significa trazer para o conceito de “dano emergente” situações típicas de “dano remoto”. Assim, essa constatação, a de que se invocou de forma casuística o “dano remoto”, apenas corroborou a excepcionalidade do argumento utilizado pelo STF.

Na visão do STJ, essa excepcionalidade foi ainda confirmada com o julgamento dos embargos de declaração no mesmo RE nº 1.063.187/SC, no qual foi esclarecido que o acórdão se aplica apenas nas hipóteses em que há o acréscimo de juros moratórios mediante a taxa Selic na repetição de indébito tributário (inclusive na realizada por meio de compensação), seja na esfera administrativa, seja na esfera judicial, não se aplicando nas situações em que a Selic incide a título de juros remuneratórios, de depósitos judiciais ou nas situações de juros de mora pagos no contexto de contrato entre particulares.

Por essa razão, entendeu o STJ que esse esclarecimento foi de extrema relevância, uma vez que significava uma superação da tese repetitiva adotada no Tema 505/STJ, mas significava também que todas as demais teses repetitivas adotadas pelo STJ no que diz respeito à incidência do IR e da CSLL sobre juros de mora ficariam preservadas.

Júlia Swerts e Pedro Simão: No julgamento do REsp nº 1.138.695, como exposto, o STJ considerou que não precisaria compatibilizar sua jurisprudência sobre a tributação dos ganhos obtidos em depósitos judiciais com o entendimento firmado pelo STF no julgamento do Tema 962.

Assim, restou mantido o entendimento, firmado em 2013, de que os juros incidentes na devolução dos depósitos judiciais têm natureza remuneratória, por recomporem determinada situação jurídica, representando acréscimo patrimonial.


– Como você avalia a decisão da corte?

Fernanda Rizzo e Leonardo Di Gianni:  Em nossa visão, a decisão da Primeira Seção não foi a mais acertada porque, considerando que a taxa Selic (objeto da decisão pelo STF) engloba juros e correção monetária, é plausível que, de forma ampla, sem se restringir à taxa Selic, os demais indexadores econômicos aplicados para tal finalidade nas repetições de indébito tributário e recuperação de depósitos judiciais e precatórios tampouco configurem acréscimo patrimonial ou lucro e, portanto, sejam afastados da incidência do IRPJ e da CSLL.

Assim, não se pode realizar uma presunção de constitucionalidade dos demais índices de atualização/correção monetária, uma vez que as razões adotadas pelo STF ao declarar inconstitucional a incidência do IRPJ e CSLL são bastante suficientes para dar suporte à pretensão de afastamento da tributação também em relação aos demais indexadores econômicos, além da taxa Selic.

Isso se deve porque não raras vezes o contribuinte, ao ajuizar medida judicial de cunho tributário, aplica o direito previsto no artigo 151, inciso II do Código Tributário Nacional (CTN), que lhe possibilita o depósito em juízo da quantia, para fins de suspensão de sua exigibilidade, sendo certo que a remuneração dos depósitos judiciais pelos diversos indexadores econômicos assegura justamente a correção monetária e a incidência de juros moratórios sobre tais valores depositados em juízo.

Portanto, seja na repetição de indébito tributário ou mesmo nos casos de recuperação de depósitos judiciais tributários e levantamento de precatórios tributários, não haverá em tais situações diferença alguma, pois em todas as hipóteses os contribuintes ficam privados dos seus recursos, indisponibilizados porque em poder do Tesouro, e recompostos pelos indexadores cabíveis no momento dos resgates.

Seria preciso, portanto, que os julgadores analisassem de forma extensa se a incidência do IRPJ e da CSLL em relação aos demais índices de atualização/correção monetária aplicáveis para fins de repetição de indébito tributário ou mesmo recuperação de depósitos judiciais poderia ser afastada pela mesma natureza da situação observada na repetição de indébito atualizada pela Selic. Ou seja, se seria possível aplicar o mesmo racional adotado pelo STF na repetição de indébito pela Selic para esses casos.

Contudo, o que fez o STJ foi apenas aplicar de maneira restrita o quanto decidido pelo STF, mantendo, sem maiores deliberações, a jurisprudência da Corte Especial que, em nossa perspectiva, foi superada com a decisão do STF e, por essa razão, mereceria reforma, adotando-se o raciocínio desenvolvido pelo STF.

Júlia Swerts e Pedro Simão: O resultado do julgamento do REsp nº 1.138.695 confronta com o entendimento firmado pelo STF no julgamento do Tema 962.

Apesar do STF não ter tratado da tributação a ser aplicada sobre o resultado da Selic aplicada nos depósitos judiciais, naquela oportunidade, o ministro Dias Toffoli, relator do caso, enfrentou expressamente o entendimento do STJ, para superá-lo e consignar que os juros de mora não configuram lucros cessantes e estão fora do campo de incidência do IRPJ e da CSLL, na medida em que objetivam recompor perdas e decréscimos, não implicando aumento de patrimônio do credor.

Nesse sentido, ainda se espera que as razões de decidir utilizadas pelo STF no julgamento do Tema 962, no sentido de que os juros de mora legais possuem natureza de indenização e com isso restar afastada a tributação pelo IRPJ e CSLL sobre a taxa Selic recebida na devolução de tributos pagos indevidamente, sejam utilizadas pelo STJ na análise da tributação dos ganhos obtidos em depósitos judiciais.


– Para os contribuintes, a decisão pode ter alguma implicação futura – por exemplo, tornando a estratégia de pagar tributos e pedir a devolução de indébito mais econômica do que a efetivação de depósitos judiciais?

Fernanda Rizzo e Leonardo Di Gianni:  Certamente, com a decisão proferida pelo STJ, há uma tendência de mudança de estratégia dos contribuintes.

Isso porque, considerando o atual entendimento do STF e STJ, pagar o tributo e pedir a devolução do indébito será economicamente mais vantajoso, uma vez que não haverá, na devolução, a incidência de IRPJ e CSLL sobre a Selic incorrida.

Por outro lado, na hipótese de levantamento dos depósitos judiciais, haverá a incidência desses tributos sobre a Selic do período, o que pode tornar essa opção menos vantajosa do ponto de vista econômico para os contribuintes, desestimulando, de certa forma, a utilização do instituto.

Júlia Swerts e Pedro Simão: Sim. Como existem decisões em sentidos opostos relativamente à tributação sobre o resultado da Selic aplicada em depósitos judiciais e repetição de indébito, as empresas que optarem pelo recolhimento do imposto para, posteriormente, requererem a devolução, seja pela via administrativa ou judicial, não terão a Selic tributada, enquanto as que depositaram valores como garantia poderão ter a posterior incidência de IRPJ e CSLL sobre a correção monetária.

2 Comentários
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