PGFN flexibiliza utilização de prejuízo fiscal
Base negativa da CSLL também poderá ser mais usada no âmbito do programa QuitaPGFN
Contribuintes com prejuízo fiscal que já tinham firmado determinados acordos de transação tributária com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) ou com débitos considerados de difícil recuperação ou irrecuperáveis, já inscritos na Dívida Ativa da União, devem avaliar se vale a pena aderir a um novo programa criado para antecipar o pagamento de suas dívidas com o Fisco. Trata-se do Programa de Quitação Antecipada de Transações e Inscrições da Dívida Ativa da União da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (QuitaPGFN), instituído pela portaria 8.798/22 da PGFN no início de outubro.
Aderir ao programa e saldar antecipadamente os débitos pode ser vantajoso. Ele oferece descontos ou a possibilidade de pagar até 70% das dívidas sem o desembolso de dinheiro, por meio da utilização do prejuízo fiscal ou da base de cálculo negativa de contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL). Os 30% restantes devem ser pagos em dinheiro, em até seis vezes (ou 12 vezes, no caso das empresas em recuperação judicial).
Frederico Bakkum, associado do Vieira Rezende Advogados, considera que a adesão pode ser muito vantajosa porque acelera a quitação da dívida, estanca a sua atualização pela taxa Selic e dá liquidez imediata aos créditos de prejuízo fiscal e base negativa acumulados pelos contribuintes ao longo dos anos.
Sávio Hubaide, advogado associado do Freitas Ferraz Advogados, cita ainda uma outra vantagem: a possibilidade de utilização de créditos dos corresponsáveis pelos débitos, a exemplo dos casos em que haja reconhecido grupo econômico. Isso porque a portaria permite a utilização de prejuízos e base negativa dos corresponsáveis pelo débito, a exemplo das controladoras e controladas, respeitadas algumas condições.
No entanto, Bakkum diz que há vários fatores que devem ser analisados para que o contribuinte entenda se realmente vale a pena aderir, a começar pela modalidade de transação tributária que ele já tiver efetuado com a PGFN. Também é necessário verificar a regularidade dos créditos de prejuízo fiscal e base negativa e a viabilidade financeira para arcar com o pagamento do saldo remanescente do QuitaPGFN em até seis prestações. “Em muitos casos, esse requisito torna a adesão ao programa inviável na prática”, afirma Bakkum.
Com a portaria que instituiu o QuitaPGFN, ampliaram-se as possibilidades de utilização do prejuízo fiscal e da base negativa da CSLL – que, antes, de acordo com a Portaria 6.757/22, estavam restrita aos débitos irrecuperáveis e de difícil recuperação. Essa ampliação abrange, agora, algumas transações excepcionais (como as realizadas em função dos impactos da pandemia de Covid-19). Bakkum explica que a flexibilização vale apenas para o QuitaPGFN e não indica uma mudança de entendimento quanto à classificação de débitos como irrecuperáveis ou de difícil recuperação – que continuam especificados pela Portaria 6.757/22. A adesão ao QuitaPGFN pode ser feita pelo site Regularize, da PGFN, de 1º de novembro a 30 de dezembro deste ano.
Na entrevista abaixo, Bakkum e Hubaide detalham as condições para aderir ao QuitaPGFN e os aspectos que devem ser avaliados pelos contribuintes interessados.
Quem pode aderir ao programa QuitaPGFN e quais são as condições oferecidas para os contribuintes?
Frederico Bakkum: O QuitaPGFN foi instituído para viabilizar o pagamento antecipado de saldos de algumas modalidades transações tributárias firmadas com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), até 31 de outubro de 2022, que estejam em situação regular, bem como o pagamento de débitos inscritos em dívida ativa da União, relativamente a inscrições realizadas até 7 de outubro de 2022.
No caso das transações, o programa pode ser aplicado às seguintes modalidades:
- transação por adesão celebrada conforme Edital PGFN 01/2019
- transação por adesão celebrada conforme Edital PGFN 02/2021
- transação excepcional:
(a) instituída pela Portaria 14.402/20 (para contenção dos efeitos da pandemia causada pelo coronavírus),
(b) instituída para pagamento de débitos de FUNRURAL e de débitos de ITR, nos termos da alínea “e” do inciso I e alíneas “e” e “h” do inciso II, do artigo 4° da Portaria PGFN 2.381/21,
(c) instituída para o pagamento de débitos de titularidade de pequenos produtores rurais e agricultores familiares, originários de operações de crédito rural e das dívidas contraídas no âmbito do Fundo de Terras e da Reforma Agrária e do Acordo de Empréstimo 4.147-BR, previstas na Portaria PGFN 21.561/20 e
(d) instituída para o pagamento de débitos do Simples Nacional, estabelecida na Portaria PGFN 18.731/20.
- débitos incluídos no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse)
- transações individuais:
(a) envolvendo débitos irrecuperáveis ou de difícil recuperação, realizadas com base nas Portarias PGFN 9.917/20 e 6.757/22 e
(b) envolvendo devedores em recuperação judicial, realizadas com base na Portaria PGFN 2.382/21.
Já no caso dos débitos inscritos em dívida ativa até 07/10/22, a portaria apresenta uma série de restrições alternativas, considerando a data de inscrição da dívida ativa, a qualidade do devedor e da dívida, de forma a restringir a sua aplicabilidade a débitos irrecuperáveis ou de difícil recuperação.
O programa autoriza a utilização de créditos de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da CSLL para quitação de até 70% do saldo remanescente de transações firmadas com a Fazenda Nacional, devendo o saldo remanescente ser quitado à vista ou em até seis prestações.
Sávio Hubaide: Podem aderir ao QuitaPGFN contribuintes com saldo de débitos incluídos em outras modalidades de transações celebradas até 31/10/2022, que tenham concedido algum desconto ao contribuinte, e aqueles que tiverem débitos considerados irrecuperáveis ou de difícil recuperação inscritos em dívida ativa até a data da publicação da portaria, 07/10/2022.
A principal inovação trazida pela portaria foi a possibilidade de quitação, com prejuízos fiscais e base negativa apurados até 31/12/2021, de até 70% do saldo devedor. Nesse caso, a parcela restante de pelo menos 30% deverá ser regularizada mediante o pagamento em dinheiro, em até seis parcelas mensais e sucessivas não inferiores a mil reais e em até doze parcelas não inferiores a 500 reais, no caso de pessoa jurídica em recuperação judicial. A portaria possibilitou, ainda, a utilização de prejuízos e base negativa dos corresponsáveis pelo débito, a exemplo das controladoras e controladas, desde que o vínculo jurídico tenha sido formado até a data 31/12/2021, e se mantenha até a data da adesão.
A Portaria 8.798/22 mudou o entendimento referente aos débitos irrecuperáveis ou de difícil recuperação?
Frederico Bakkum: Com a entrada em vigor da Lei 14.375/22, a legislação federal passou a permitir a utilização de créditos de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da CSLL em negociações de transações tributárias.
Na sequência, a fim de regulamentar a matéria, a PGFN editou a Portaria 6.757/22, dispondo que a amortização da dívida com créditos de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa somente seria aplicável a débitos classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação. Os critérios para classificação de débitos nessas duas categorias foram regulamentados no artigo 19 e seguintes da mencionada portaria e continuam valendo para as transações em geral.
A Portaria PGFN 8.798/22, por sua vez, é uma portaria específica para o QuitaPGFN, que de fato flexibilizou a regra da Portaria 6.757/22, na medida em que autorizou a utilização de créditos de prejuízo fiscal e base negativa para débitos que não necessariamente são classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação. Contudo, essa flexibilização vale apenas para o referido programa.
Em razão disso, entendemos que não houve mudança de entendimento quanto à classificação de débitos como irrecuperáveis ou de difícil recuperação.
Sávio Hubaide: O rol dos débitos considerados irrecuperáveis ou de difícil recuperação é praticamente o mesmo daquele previsto na portaria 6.757/22. Nesse sentido, foram mantidos os débitos:
- inscritos em dívida ativa há mais de 15 anos para os quais não há garantia ou causa de suspensão da exigibilidade na data da adesão;
- de devedores falidos, em recuperação judicial ou extrajudicial, em liquidação judicial, em intervenção ou liquidação extrajudicial;
- de pessoas jurídicas com CNPJ baixado ou inapto e
- com exigibilidade suspensa por decisão judicial há mais de 10 anos.
Não constam no rol do QuitaPGFN os débitos de titularidade de pessoa física com indicativo de óbito e aqueles cujas execuções fiscais estiverem arquivadas há mais de três anos, com fundamento na inexistência de bens ou na não localização do devedor, situações essas previstas na Portaria 6.757/22.
A Portaria 6.757/22 da PGFN permitia a utilização do prejuízo fiscal e da base negativa da CSLL apenas em créditos irrecuperáveis ou de difícil recuperação, e desde que tivessem sido esgotadas todas as outras possibilidades de quitação. Esse entendimento continua valendo ou mudou após a edição da Portaria 8.798/22?
Frederico Bakkum: Como abordamos anteriormente, na nossa leitura, o regramento trazido pela Portaria 6.757/22 continua valendo para todas as transações realizadas fora do âmbito do QuitaPGFN, de modo que a Portaria 8.798/22 não mudou esse entendimento, apenas ampliou a possibilidade de utilização do prejuízo e da base negativa para as situações específicas do Programa QuitaPGFN.
Vale dizer, no entanto, que nada impede a PGFN de editar novas portarias específicas, prevendo a possibilidade de utilização de prejuízo fiscal e base negativa para a quitação de débitos não classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação, flexibilizando também a necessidade de se esgotar todas as demais possibilidades de quitação.
Não sendo editada nenhuma portaria da PGFN nesse sentido, as negociações realizadas com a PGFN deverão, em princípio, seguir os parâmetros da Portaria PGFN 6.757/22.
Sávio Hubaide: Como a Lei 14.375/22, que autorizou a utilização de prejuízos fiscais e bases negativas de CSLL nas transações, foi publicada somente em junho de 2022, diversas transações já haviam sido celebradas sem essa possibilidade. Por isso, a nova Portaria 8.798/22 foi editada com a finalidade – dentre outras – de permitir, àqueles contribuintes que já tenham celebrado as modalidades de transações listadas na portaria, a quitação antecipada com prejuízos fiscais e bases negativas.
Nesse contexto e por se tratar de uma antecipação da quitação do saldo, não consta no programa QuitaPGFN como requisito para a utilização dos prejuízos a necessidade de inexistência ou esgotamento de outros créditos do contribuinte em favor da União, diferentemente da previsão contida na Portaria 6.757/22.
Para os contribuintes, é vantajoso aderir ao QuitaPGFN e pagar antecipadamente as suas dívidas tributárias? O que eles devem analisar?
Frederico Bakkum: Inicialmente, o contribuinte deve analisar se a sua modalidade de transação está efetivamente contemplada nas condições trazidas pelo QuitaPGFN.
Na sequência, é importante verificar a plena regularidade dos créditos de prejuízo fiscal e base negativa, preferencialmente auditando a formação do crédito, com a verificação dos documentos de suporte para a sua formação etc., de modo a evitar eventual glosa a ser realizada pela fiscalização.
Feito isso, também há necessidade de verificar a viabilidade financeira para arcar com o pagamento do saldo remanescente do QuitaPGFN, em até seis prestações. Em muitos casos, esse requisito torna a adesão ao programa inviável na prática.
Sendo superados esses pontos, a adesão à transação tributária pode ser muito vantajosa, na medida em que acelera a quitação da dívida, estancando a sua atualização pela Selic, dando liquidez imediata aos créditos de prejuízo fiscal e base negativa acumulados pelos contribuintes ao longo dos anos.
Sávio Hubaide: A adesão ao QuitaPGFN pode ser interessante sobretudo para contribuintes que tenham montante acumulado de prejuízo fiscal e base negativa suficiente para quitar os 70% do saldo devedor, e que possuam condições de arcar com o pagamento em espécie dos 30% restantes em até seis parcelas. Vale reiterar o quão atrativa é a possibilidade de utilização de créditos dos corresponsáveis pelos débitos, a exemplo dos casos em que haja reconhecido grupo econômico.
Com a utilização dos créditos de prejuízos fiscais e base negativa na amortização dos débitos, o contribuinte poderá poupar seu caixa de modo a destinar valores que até então seriam desembolsados para o pagamento do saldo devedor para outras finalidades. A antecipação do pagamento evitará o incremento das parcelas com a incidência ainda maior de juros que estão severamente impactados pelas últimas altas ocorridas. Trata-se, em suma, de uma decisão fortemente impactada pelo contexto financeiro e econômico de cada contribuinte.
[…] nova norma da Receita Federal trouxe maior detalhamento sobre as transações tributárias, com potencial para contribuir para que o Fisco e contribuintes fechem mais acordos do tipo. A […]
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