Contribuição ao Senar paga até 2018 pode ser questionada

TRF-3 considera que cobrança anterior à edição de lei não poderia ter ocorrido

0

Contribuintes do setor rural obtiveram recentemente uma decisão que os isentou de ter contribuído para o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) antes de 2018. O Senar faz parte do “Sistema S” e atua com a formação e capacitação de mão de obra para o setor. Em decisão recente julgada pela 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), frigoríficos, distribuidores de carnes e matadouros do Mato Grosso do Sul foram dispensados da contribuição, que varia de 0,2% a 2,5% da receita bruta do produtor rural. 

Romero Marinho, associado do Freitas Ferraz Advogados, explica que a questão sobre a contribuição surgiu porque o recolhimento ocorre por sub-rogação, ou seja, as empresas adquirentes da produção rural retêm o valor na hora de pagar ao produtor e em seu nome recolhem a contribuição. “Ocorre que a sistemática da sub-rogação foi prevista por meio de decreto, contrariando o artigo 128 do Código Tributário Nacional (CTN), que prevê que somente a lei pode atribuir a responsabilidade pelo crédito tributário a uma terceira pessoa”, afirma. 

Essa lei, que estabelece a sistemática da sub-rogação, foi editada apenas em 2018 (Lei 13.606/18). Por isso, a 1ª Turma do TRF-3 isentou os produtores da contribuição até 2018. Marinho explica que a decisão se estende apenas aos produtores envolvidos no processo, que poderão ter direito de restituição a valores indevidamente recolhidos. “Os demais produtores rurais podem buscar discutir o tema judicialmente de forma a garantir o direito de restituição dos valores recolhidos a título de contribuição ao Senar dos últimos cinco anos até a entrada em vigor da Lei 13.606/18”, diz.

Na entrevista abaixo, Marinho aborda a questão e a sua importância para o segmento. 


Como funciona a contribuição dos produtores rurais ao Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) e desde quando ela é devida? Por que ela tem sido questionada pelos produtores?

Romero Marinho:  O Senar, entidade integrante do “Sistema S”, está previsto no artigo 62 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e foi criado pela Lei 8.315/91. Inicialmente, a contribuição pelo produtor rural ao serviço tinha como base de cálculo “o montante de remuneração pago a todos os empregados”.

Posteriormente, com a edição da Lei 9.528/97, a base de cálculo da contribuição passou a ser calculada sobre “a receita bruta proveniente da comercialização de sua produção rural”. Ainda, a contribuição dos produtores rurais, desde o Decreto 566/92, é feita por sub-rogação, isto é, as empresas adquirentes da produção rural retêm o valor no pagamento ao produtor e recolhem a contribuição em nome desses produtores.

Ocorre que a sistemática da sub-rogação foi prevista por meio de decreto, contrariando o artigo 128 do Código Tributário Nacional (CTN), que prevê que somente a lei pode atribuir a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa. É sobre este ponto que a discussão ocorre.


Para os produtores rurais, as contribuições ao Senar são relevantes do ponto de vista financeiro? E para o setor, qual é a sua importância?

Romero Marinho: Em razão da incidência sobre a receita bruta do produtor rural e a alíquota variar de 0,2% a 2,5%, desde a Lei 9.528/97 até hoje, as contribuições ao Senar são financeiramente relevantes para os produtores. Apesar de o Senar possuir também grande relevância para o setor, na medida em que é responsável pela qualificação da mão de obra rural por meio da formação técnica e profissional dos trabalhadores, o impacto financeiro no setor chegou a ultrapassar 1 bilhão de reais no ano de 2019.


Em recente julgamento, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) isentou produtores da contribuição ao Senar até 2018. O que embasou a decisão da corte?

Romero Marinho: O embasamento da 1ª Turma do TRF-3 para isentar os produtores da contribuição até 2018 foi o entendimento de que apenas com a edição da Lei 13.606/18 a sistemática da sub-rogação atenderia os dispositivos do CTN. Sendo assim, ficou entendido que o Decreto 566/92 não atende ao disposto do CTN e a contribuição não poderia ser exigida até 2018, quando da edição da lei mencionada anteriormente.


Em face do julgamento do TRF-3, o que se recomenda aos demais produtores rurais com relação à contribuição ao Senar anterior a 2018? A judicialização pode ser uma boa alternativa?  

Romero Marinho: Ainda que seja uma decisão favorável aos contribuintes, os efeitos da decisão não se estendem para além daqueles que estão no polo ativo do processo. Isto é, somente os produtores envolvidos no referido processo poderão ter direito de restituição a valores indevidamente recolhidos. Os demais produtores rurais podem buscar discutir o tema judicialmente de forma a garantir o direito de restituição dos valores recolhidos a título de contribuição ao Senar dos últimos cinco anos até a entrada em vigor da Lei 13.606/18.

Deixe uma resposta

Seu endereço de e-mail não será publicado.