Mais simplicidade na emissão de debêntures

Projeto prevê redução de burocracia e novas possibilidades para títulos

0

A simplificação das emissões de debêntures é um dos objetivos de Projeto de Lei enviado pelo governo federal ao Congresso Nacional em maio, no âmbito das medidas de “Simplificação e Desburocratização do Crédito”, anunciadas em abril. O projeto visa tornar mais ágil o processo de emissão por meio da redução da burocracia e procura incentivar o mercado secundário de negociação dos títulos pela criação de uma nova possibilidade: a separação entre os fluxos financeiros do pagamento de juros e de principal.

Com relação à menor burocracia, uma das propostas é que a emissão de debêntures não conversíveis em ações, por parte de companhias fechadas, possa ser aprovada pelo conselho de administração — hoje, é necessário que a matéria passe pela assembleia geral. Nas companhias abertas, essa possibilidade de aprovação apenas por parte do conselho já existe. “Isso simplifica e torna mais célere o processo de emissão debêntures não conversíveis por companhias fechadas”, avaliam Helena Guimarães, Ana Luisa Fucci e Érica Antunes, respectivamente sócia e associadas do Vieira Rezende Advogados.

Outra proposta que visa reduzir a burocracia é a dispensa da necessidade de registrar a escritura da emissão de debêntures na Junta Comercial – o registro visa dar publicidade ao instrumento, garantindo o conhecimento das operações de emissão de dívida realizadas por uma companhia. “Em nosso entendimento, a supressão desse registro, desde que mantida a obrigatoriedade de registro do ato que aprova a emissão de dívida e a adequada disciplina de tal ato pela CVM ou pelo Executivo, conforme o caso, não prejudicará terceiros e ainda representa uma redução de burocracia para a emissão”, avaliam as advogadas do Vieira Rezende.

Outra proposta visa dar mais flexibilidade às companhias que desejam modificar as condições das debêntures, quando estas são dispersas no mercado. Hoje, isso só pode ser feito por assembleia e o estatuto da companhia estabelece o quórum de aprovação – desde que superior à metade dos títulos em circulação. “Esse dispositivo engessa deliberações importantes em situações em que as debêntures se encontram dispersas, ainda que seja virtualmente possível alcançar a maioria”, consideram as advogadas. Pela proposta, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) poderá autorizar a redução do quórum de aprovação de assembleias de debenturistas, desde que isso conste dos avisos de convocação – e apenas em terceira convocação. A CVM precisará ponderar o percentual de aprovação ótimo que, por um lado, desengesse a assembleia de debenturistas, mas, por outro, não submeta questões sensíveis à opinião de pequena parcela dos interessados: “Caso bem implementado, o dispositivo tem potencial para assegurar maior qualidade creditícia, em benefício dos próprios debenturistas”, afirmam as advogadas do Vieira Rezende.

Na entrevista abaixo, Guimarães, Fucci e Antunes abordam os principais pontos do projeto.


– Uma das alterações sugeridas pelo Projeto de Lei é permitir que o conselho de administração ou a diretoria das companhias possa aprovar a emissão de debêntures. De que forma isso irá funcionar e como você avalia a medida?

Helena Guimarães, Ana Luisa Fucci e Érica Antunes: A regra geral atualmente em vigor é de que a assembleia geral tem competência privativa para deliberar sobre a emissão de debêntures. Às companhias abertas é permitido que a emissão de debêntures não conversíveis em ações seja deliberada pelo conselho de administração, assim como as conversíveis até o limite do capital autorizado. O Projeto de Lei estende a possibilidade relativa às debêntures não conversíveis às companhias fechadas, permitindo que o conselho de administração ou a diretoria, conforme o caso, delibere sobre a matéria, exceto se houver disposição estatutária em contrário.

Essa possibilidade passa a existir, portanto, para as companhias fechadas com a entrada em vigor da lei, desde que não haja previsão estatutária que disponha de forma diversa. Nesse caso, será necessário que os acionistas, reunidos em assembleia geral, promovam a alteração estatutária necessária.

Ao equiparar a debênture a outros instrumentos de dívida que não requerem aprovação assemblear, o Projeto de Lei torna a emissão de debêntures não conversíveis em um mecanismo que pode ser utilizado pelo órgão da administração competente sem necessidade de convocação e instalação de assembleia geral. Isso simplifica e torna mais célere o processo de emissão debêntures não conversíveis por companhias fechadas.


–  Outra mudança proposta é a dispensa da necessidade de registro da escritura de emissão em junta comercial. Trata-se de uma alteração relevante e que pode ter algum efeito positivo nas emissões?

Helena Guimarães, Ana Luisa Fucci e Érica Antunes: Trata-se de uma alteração que visa simplificar a emissão de debêntures, a exemplo do que ocorre com outros instrumentos de dívida que dispensam registro na Junta Comercial, como indicado pela Exposição de Motivos do Projeto de Lei.

O ato societário que aprova a emissão das debêntures continuará sujeito a arquivamento no registro de comércio, o que será disciplinado pela CVM, no caso das companhias abertas, ou pelo Poder Executivo Federal, no caso das companhias fechadas, conforme disposição do Projeto de Lei.

O registro nas Juntas Comerciais tem o objetivo de dar publicidade ao instrumento, garantindo a qualquer interessado conhecimento das operações de emissão de dívida realizadas por uma companhia. Em nosso entendimento, a supressão desse registro, desde que mantida a obrigatoriedade de registro do ato que aprova a emissão de dívida e a adequada disciplina de tal ato pela CVM ou pelo Executivo, conforme o caso, não prejudicará terceiros e ainda representa uma redução de burocracia para a emissão.


– O que o PL propõe com relação ao desmembramento de fluxos financeiros de principal e de juros das debêntures? Como isso iria funcionar?

Helena Guimarães, Ana Luisa Fucci e Érica Antunes: O desmembramento dos fluxos financeiros de principal e juros, técnica conhecida como coupon stripping (separação de cupom, em tradução livre), é utilizado para separar a parcela principal e os juros remuneratórios, criando títulos distintos, que podem ser negociados separadamente, a exemplo do que já ocorre com os títulos públicos federais. Esta é mais uma alternativa de investimento disponível ao mercado que tem como vantagem reduzir o risco de reinvestimento. Trata-se de medida que visa estimular a liquidez do mercado secundário de títulos de renda fixa privado, reforçando a utilização das debêntures como fonte de captação de recursos pelas companhias.


– O PL prevê ainda a redução de quórum das assembleias que forem deliberar sobre mudanças nas debêntures dispersas no mercado. Qual é a sua avaliação sobre a proposta?

Helena Guimarães, Ana Luisa Fucci e Érica Antunes: Nos casos de debêntures dispersas no mercado, há uma dificuldade em aprovar modificações nas condições das debêntures, ainda que benéficas aos investidores. Atualmente, a Lei das S.A. determina que o estatuto estabeleça o quórum de aprovação, que não poderá ser inferior à metade dos títulos em circulação. Esse dispositivo engessa deliberações importantes em situações em que as debêntures se encontram dispersas, ainda que seja virtualmente possível alcançar a maioria.

O Projeto de Lei busca flexibilizar o procedimento nas companhias abertas, permitindo que a CVM autorize a redução do quórum de aprovação de assembleias de debenturistas, desde que isso conste dos avisos de convocação e, ainda assim, apenas em terceira convocação. O Projeto de Lei define como debêntures dispersas aquelas que não tenham um único debenturista titular, direto ou indireto, de mais de 50% dos títulos.

Trata-se de uma tarefa delegada à CVM, que precisará ponderar o percentual de aprovação ótimo que, por um lado, desengesse a assembleia de debenturistas, mas, por outro, não submeta questões sensíveis à opinião de pequena parcela dos interessados.  Caso bem implementado, o dispositivo tem potencial para assegurar maior qualidade creditícia, em benefício dos próprios debenturistas.


Leia também

Debêntures incentivadas devem ganhar concorrência

Debêntures incentivadas chegam a projetos sociais

Debêntures incentivadas chegam ao agronegócio

BNDES quer estimular debêntures de infraestrutura dedicadas a projetos sustentáveis

Deixe uma resposta

Seu endereço de e-mail não será publicado.