Controvérsia sobre Pis e Cofins permanece sem resolução

Julgamento do STF a respeito de alíquotas reduzidas e anterioridade nonagesimal é suspenso

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No começo deste ano, foi iniciada uma controvérsia sobre o pagamento de Pis e Cofins sobre receitas financeiras das empresas. Muitas consideram que poderiam se beneficiar, até abril, das alíquotas reduzidas desses tributos. No entanto, o governo entende de forma diferente: considera que as empresas precisam pagar os impostos com as alíquotas “cheias”. A questão chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), que iniciou o julgamento do caso, mas foi suspenso por um pedido de vista. O mês de abril já passou da metade, mas ainda não há prazo para que a corte volte a se debruçar sobre o assunto, que promete render discussões.

Enquanto isso, as empresas sujeitas ao regime não cumulativo continuam tendo que pagar as alíquotas “cheias” de Pis e de Cofins sobre suas receitas financeiras. Isso porque uma liminar conferida pelo ministro Ricardo Lewandowski suspendeu as liminares que as empresas tinham obtido na Justiça para pagar os impostos com a alíquota reduzida.

O imbróglio começou com a publicação, em 30 de dezembro, do Decreto n° 11.322/2022. O decreto reduziu pela metade as alíquotas do Pis e da Cofins sobre receitas financeiras auferidas pelas empresas sujeitas ao regime não cumulativo, cuja soma caiu de 4,65% para 2,33% — a norma valeria a partir de 1° de janeiro deste ano.

Só que, no dia 2 de janeiro, o atual governo revogou o decreto, reestabelecendo as alíquotas originais (por meio da publicação do Decreto n° 11.374/2023). A medida foi questionada porque resultou no aumento das alíquotas, o que requereria a aplicação do princípio da anterioridade nonagesimal, de acordo com especialistas. Se este fosse aplicado, as alíquotas “cheias” só poderiam ser cobradas a partir de abril. As empresas recorreram ao Judiciário e obtiveram liminares para pagar os impostos reduzidos.

O governo então entrou com uma Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) no Supremo (ADC 84) pedindo a suspensão de todos os julgamentos favoráveis aos contribuintes, além da declaração da validade do Decreto n° 11.374/2023, que voltou as alíquotas aos seus percentuais originais.

O ministro Lewandowski concedeu uma liminar que suspendeu as liminares que autorizavam os contribuintes a recolher o imposto com a alíquota reduzida. Era a liminar de Lewandowski que o STF estava julgando. No entanto, o julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes. Até o momento, apenas os ministros Lewandowski e André Mendonça votaram. Em seu voto, contrário à suspensão das liminares, Mendonça afirmou que não havia na questão controvérsia judicial de proporção relevante que justificasse uma ação declaratória. Ele também considerou que a noventena deveria ser aplicada.

“A divergência do ministro Mendonça pode indicar um fortalecimento do argumento pró-contribuinte, que alega a necessidade de se observar a anterioridade nonagesimal para se reestabelecer as alíquotas “cheias” das contribuições. Contudo, como foram proferidos apenas dois votos, e a ADC deve ser analisada pelo Pleno, acreditamos que ainda é cedo para supor qual será a posição dos demais ministros”, avaliam os advogados Thiago Braichi e Carolina Sapori, sócio e associada do Freitas Ferraz Advogados.

Na entrevista abaixo, Braichi e Sapori abordam a questão e o julgamento do STF.


– Por que foi interrompido o julgamento do STF sobre a suspensão de liminares que autorizavam os contribuintes a recolher Pis e Cofins sobre receitas financeiras com alíquotas reduzidas?

Thiago Braichi e Carolina Sapori: O julgamento foi interrompido porque o ministro Alexandre de Moraes pediu vista do processo. Este tipo de pedido é feito quando um ministro entende que deve apreciar melhor o assunto antes de declarar seu voto.


– O ministro André Mendonça, em seu voto, afirmou que não havia na questão controvérsia judicial de proporção relevante que justificasse uma ação declaratória. O que são essas ações e por que ele considerou que elas não se aplicam ao caso?

Thiago Braichi e Carolina Sapori: A Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) é um instrumento de controle abstrato de constitucionalidade, cujos objetos são atos ou dispositivos legais federais. A finalidade deste tipo de ação é a de que o Supremo Tribunal Federal declare que determinado dispositivo legal ou ato normativo é constitucional.

Entretanto, segundo a Lei n° 9.868/99, que dispõe sobre a ADC, sua propositura requer “a existência de controvérsia judicial relevante sobre a aplicação da disposição objeto da ação”.

Nesse contexto, o ministro André Mendonça entende que a ação não deveria ser conhecida, pois não apresenta pressupostos de admissibilidade (a relevância), uma vez que, segundo dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, não há um montante considerável de ações tramitando sobre o tema; logo, a controvérsia não seria relevante.


– Com o voto do ministro André Mendonça, sai fortalecido o argumento daqueles que consideram que a noventena deveria ser aplicada à volta das alíquotas cheias do Pis e da Cofins sobre receitas financeiras?

Thiago Braichi e Carolina Sapori: Até o momento, apenas os ministros Lewandowski e Mendonça votaram. A divergência do ministro Mendonça pode indicar um fortalecimento do argumento pró-contribuinte, que alega a necessidade de se observar a anterioridade nonagesimal para se reestabelecer as alíquotas “cheias” das contribuições. Contudo, como foram proferidos apenas dois votos, e a ADC deve ser analisada pelo Pleno, acreditamos que ainda é cedo para supor qual será a posição dos demais ministros.


Há expectativa de quando o STF voltará a julgar o tema? É possível identificar alguma tendência da corte?

Thiago Braichi e Carolina Sapori: Não há expectativa quanto ao retorno do julgamento. O mérito da ação ainda não foi examinado, e não podemos esquecer que a anterioridade nonagesimal é garantida pela Constituição Federal. O que nos resta é aguardar qual será o posicionamento da Suprema Corte.

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