São Paulo aperta cerco contra evasão de ITCMD

Contribuintes devem estar atentos ao informe correto dos valores dos imóveis recebidos em doação ou herança

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Para combater a evasão fiscal do imposto sobre transmissão causa mortis e doação (ITCMD), a Secretaria de Fazenda do Estado de São Paulo pretende confrontar os valores de mercado dos imóveis urbanos do Estado de São Paulo com aqueles declarados pelos contribuintes nos inventários ou doações. Além disso, a secretaria agora conta com uma delegacia especializada no pagamento do ITCMD. A especialização das equipes pode se tornar uma tendência e uma medida a ser adotada também por outros Estados.

“Essa medida pode ser eficaz não só para celeridade dos processos, que muitas vezes ficam parados por meses ou até anos, mas também para que se priorizem respostas técnicas e condizentes com a realidade dos negócios praticados”, consideram Thiago Braichi e Júlia Barreto, sócio e associada do Freitas Ferraz Advogados.

Braichi e Barreto lembram que a regra geral é declarar o bem ou direito pelo valor venal (valor de mercado) na data da abertura da sucessão ou da doação, de acordo com a legislação do Estado de São Paulo. O valor mínimo a ser declarado, consideram, é o constante na guia do imposto predial territorial urbano (IPTU) para imóveis urbanos ou na declaração de imposto territorial rural (ITR), quando se tratar de imóvel rural recebido de doação ou herança. Mas, caso o valor da guia do IPTU esteja muito abaixo do valor de mercado, eles recomendam que o contribuinte utilize o valor venal e não o do IPTU.

Se o contribuinte declarar um valor inferior ao valor de mercado, fica sujeito à multa equivalente à diferença do imposto não recolhido. Se não declarar, a multa incide sobre o valor total do bem (e ainda há multa de mora e juros).

Filipe Arantes, sócio do FTA Advogados, recomenda muita cautela e planejamento aos contribuintes, e não só porque as legislações sobre o ITCMD variam de um Estado para outro, mas também por conta de ilegalidades. Ele recomenda que, em determinados casos, o contribuinte busque o Judiciário até mesmo de forma preventiva. Um dos exemplos é a existência de dois valores venais, um para uso como base de cálculo do IPTU e outro valor venal para base de cálculo do imposto sobre transmissão de bens imóveis (ITBI). Um decreto do Estado de São Paulo (Decreto nº 55.002/2009) estabeleceu que o valor venal de referência – geralmente superior ao valor presente no IPTU) – deve ser usado para fins de ITBI. Mas o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já firmou jurisprudência para determinar que a base de cálculo do ITCMD deve ser o valor venal do imóvel para fins de IPTU. Arantes diz que esse é um exemplo de que o contribuinte precisará se valer do Judiciário para evitar ilegalidades e inconstitucionalidades.

Na entrevista abaixo, Braichi, Barreto e Arantes esclarecem questões relacionadas ao ITCMD.


– Durante os inventários, os imóveis dos contribuintes devem ser declarados com base em qual valor? E com relação às doações?

Júlia Barreto e Thiago Braichi: A regra geral é declarar o bem ou direito pelo valor venal (valor de mercado) na data da abertura da sucessão ou do ato/contrato de doação, de acordo com a legislação do Estado de São Paulo.

Contudo, o valor do bem será determinado de formas distintas para o inventário e a doação feitos na esfera judicial. Nesse caso, o valor a ser declarado pelo contribuinte (donatário) é aquele atribuído na avaliação judicial e homologado pelo juiz, independentemente do que o donatário considere como valor venal.

Nos casos de doação administrativa (em que não há envolvimento do Judiciário), deverá ser informado o valor venal do bem – regra geral, que será passível de concordância ou não pela Fazenda Estadual.

Filipe Arantes: A base de cálculo do imposto tanto na doação quanto na sucessão é o valor venal do imóvel. Vale destacar que o ITCMD é um imposto estadual e, no Estado de São Paulo, é regulado pela Lei nº 10.705/2000 e Decreto nº 46.655/2002, que definem o valor venal como o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação.


– A quais penalidades os contribuintes podem estar sujeitos se declararem valores inferiores dos imóveis que receberam de doação ou herança?

Júlia Barreto e Thiago Braichi: Em caso de declaração em valor inferior ao valor de mercado do bem, o contribuinte estará sujeito à multa equivalente à diferença do imposto não recolhido (uma vez que a base de cálculo foi informada em valor menor) pela declaração incorreta.

Vale mencionar, no caso de omissão do contribuinte, ou seja, quando não for declarada a operação e, consequentemente, não houver recolhimento do tributo, a multa será condizente com o imposto devido pela totalidade da operação.

Isso se dará sem prejuízo do recolhimento do imposto devido (em razão da diferença da base de cálculo) e multa de mora e juros, em razão do recolhimento fora do prazo correto, nos termos do artigo 38, II, “b”, do Regulamento de ITCMD de São Paulo.

Filipe Arantes:  Em caso de declaração de valores inferiores dos imóveis que receberam, os contribuintes ficam sujeitos às penalidades previstas na legislação vigente. No caso da legislação do Estado de São Paulo, por exemplo, apurando-se que o valor atribuído à doação (em documento particular ou público) tenha sido inferior ao praticado no mercado, aplicar-se-á aos contratantes multa equivalente a uma vez a diferença do imposto não recolhido, sem prejuízo do pagamento da parcela do imposto não recolhido, acrescido dos acréscimos cabíveis pelo atraso no pagamento do valor total devido.


 O que se recomenda aos contribuintes com relação aos valores informados dos imóveis, para fins de pagamento do ITCMD?

Júlia Barreto e Thiago Braichi: Quanto aos imóveis, recomenda-se que o valor declarado seja, no mínimo, aquele constante na guia de Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) para imóveis urbanos ou na Declaração de Imposto Territorial Rural (ITR) para imóveis rurais.

Vale dizer, a Secretaria de Fazenda do Estado de São Paulo contratou um serviço junto à Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) para desenvolver uma pesquisa de valor de mercado de todos os imóveis urbanos do estado de São Paulo a fim de confrontar com o valor declarado pelos contribuintes. Essa é mais uma iniciativa do Estado de São Paulo de evitar recolhimento a menor/evasão fiscal de ITCMD, garantindo que o imposto seja recolhido corretamente pelos contribuintes.

Assim, para imóveis urbanos, o valor constante na guia de IPTU, caso seja muito discrepante do efetivo valor de mercado, não deverá ser utilizado, devendo ser priorizado o valor venal do bem.

Filipe Arantes: Recomenda-se muita cautela e planejamento aos contribuintes. Vale destacar que o ITCMD na transmissão de bens imóveis e respectivos direitos deve ser recolhido ao Estado da situação do bem, ou ao Distrito Federal, conforme disposto no artigo 155, § 1º, I da Constituição Federal, devendo o contribuinte se atentar às peculiaridades da legislação do Estado para fins de recolhimento do imposto.

Além disso, verificam-se muitas ilegalidades e inconstitucionalidades em legislação estaduais que disciplinam o ITCMD, recomendando-se em algumas situações que o contribuinte acesse o Judiciário até mesmo de forma preventiva. Como exemplo de referidas ilegalidades, destaca-se o Decreto nº 55.002/2009 do Estado de São Paulo, que alterou o Decreto nº 46.655/2002 para estabelecer a utilização do valor venal de referência para fins de Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), geralmente superior ao valor para fins de apuração do Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) que deveria ser utilizado. Nesse sentido, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já firmou jurisprudência para determinar que a base de cálculo do ITCMD deve ser o valor venal do imóvel para fins de IPTU, o que demonstra que muitas vezes o contribuinte precisará se valer do Judiciário para evitar ilegalidades e inconstitucionalidades.


 – O Estado de São Paulo criou uma delegacia especializada no pagamento do ITCMD. Esta pode ser uma tendência?

Júlia Barreto e Thiago Braichi: Acreditamos que sim. Nota-se um encaminhamento das Secretarias de Fazenda – alinhadas com a Receita Federal e até com algumas prefeituras de maior porte – em especializar as equipes.

Essa medida pode ser eficaz não só para celeridade dos processos, que muitas vezes ficam parados por meses ou até anos, mas também para que se priorizem respostas técnicas e condizentes com a realidade dos negócios praticados.

É sabido que o sistema tributário brasileiro é extremamente complexo. Portanto, concentrar assuntos específicos em uma gama de servidores pode ser uma providência que trará maior conforto para a administração pública e para os contribuintes.

Filipe Arantes: O Estado de São Paulo historicamente tem sido pioneiro na implementação de novos métodos de fiscalizações do ITCMD e outros tributos, sendo certo que a criação de delegacias especializadas pode sim ser uma tendência.


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