Extinção de benefícios fiscais: haverá questionamento?
Reforma tributária prevê o fim do ICMS e, por tabela, das isenções ou reduções do imposto, mas contribuintes poderão buscar manutenção
Os benefícios fiscais concedidos por estados, que sempre causaram muita polêmica por conta da guerra fiscal — e, mais recentemente, pela discussão sobre sua tributação por parte do governo federal —, terão data certa para acabar se a reforma tributária sobre o consumo for aprovada. Será 2033, ano em que o ICMS e o ISS deixarão de existir e serão substituídos pelo imposto sobre bens e serviços (IBS).
Conforme a PEC 45/19 aprovada na Câmara dos Deputados, os benefícios ficam mantidos enquanto os tributos antigos estiverem vigentes. Haverá um prazo de transição, no qual as empresas serão tributadas pelo ICMS, ISS e IBS – as alíquotas dos dois primeiros vão diminuindo com o passar do tempo, enquanto a do novo imposto irá aumentar até substituir os dois tributos antigos em 2033.
Para que as empresas que receberam benefícios fiscais não sejam prejudicadas, será criado o Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais. Ele irá permitir a manutenção dos benefícios fiscais do ICMS até 2032, desde que esses benefícios tenham sido concedidos por “prazo certo e sob condição”, e até o dia 31 de maio de 2023. Uma Lei Complementar definirá as regras para habilitação à compensação.
Teoricamente, como o ICMS e o ISS vão deixar de existir, o mesmo acontecerá com os benefícios fiscais desses impostos. Mas poderá haver o questionamento de contribuintes, considera Fernanda Rizzo, associada do Vieira Rezende Advogados: “A manutenção dos efeitos de benefício fiscal concedido por prazo superior ao ano limite certamente é um tema polêmico, que envolve uma série de aspectos.” Ela afirma que poderão surgir questionamentos porque o artigo 178 do Código Tributário Nacional (CTN) dispõe que a isenção, quando concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, não pode ser revogada ou modificada por lei. “Nessa hipótese, certamente haverá uma grande discussão sobre o alcance da expressão “isenção”, bem como “lei”, de maneira a se estender ou não a sua aplicação para benefícios que não tratem de isenção em sua acepção literal ou que tenham sido extintos por determinação constitucional”, considera Rizzo.
Na entrevista abaixo, Rizzo explica como será a transição para o IBS e o que acontece com os benefícios fiscais do ICMS se a reforma tributária sobre o consumo (PEC 45/21) for aprovada sem modificações.
– Como será a transição do ICMS e do ISS para o imposto sobre bens e serviços (IBS)?
Fernanda Rizzo: O ICMS e o ISS serão unificados no novo IBS. Até o momento, a transição do ICMS e do ISS para o IBS ocorrerá no prazo de quatro anos (de 2029 a 2033), em que os entes cobrarão apenas partes do ICMS e o ISS, a cada ano menores. Concomitantemente, o IBS será cobrado progressivamente para compensar a diminuição desses impostos.
As alíquotas do ISS e do ICMS vão diminuir gradativamente, sendo extintas em 2033. A transição será da seguinte forma: 90% da alíquota em 2029; 80% em 2030; 70% em 2031; 60% em 2032. Já a transição para a distribuição da arrecadação entre estados será de 50 anos (de 2029 a 2078).
O IBS terá uma alíquota de referência estipulada pelo Senado Federal, mas cada ente definirá a sua. O contribuinte pagará a soma da alíquota estadual e da municipal. Antes da transição, o IBS poderá ser testado com a alíquota de 0,1% a partir de 2026. Os contribuintes enquadrados nesse teste poderão ser compensados com valores menores no Pis e na Cofins, e após a extinção dessas contribuições, sobre a nova CBS.
– O que acontece com as empresas que possuem benefícios tributários relativos ao ICMS ou e/ao ISS? Esses benefícios perderão a validade com a implementação do IBS?
Fernanda Rizzo: Os benefícios ficam mantidos enquanto vigentes os tributos antigos. Com a redução das alíquotas durante o período de transição, e consequente aumento do novo tributo, gradativamente perderão força. Esse prazo não seria uma coincidência, uma vez que já vige o período de transição para extinção dos benefícios de ICMS aprovados fora do âmbito do Confaz, período este que termina em 2032. Importante lembrar que a reforma não altera as condições vantajosas do Simples e da Zona Franca de Manaus.
– As empresas poderão questionar o término dos benefícios fiscais do ICMS, caso estes tenham sido concedidos por prazos superiores ao ano limite de 2032?
Fernanda Rizzo: A manutenção dos efeitos de benefício fiscal concedido por prazo superior ao ano limite certamente é um tema polêmico, que envolve uma série de aspectos. De qualquer forma, em tese, haveria tal possibilidade, nos termos do artigo 178 do Código Tributário Nacional (CTN), que dispõe que a isenção, quando concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, não pode ser revogada ou modificada por lei. Nessa hipótese, certamente haverá uma grande discussão sobre o alcance da expressão “isenção”, bem como “lei”, de maneira a se estender ou não a sua aplicação para benefícios que não tratem de isenção em sua acepção literal ou que tenham sido extintos por determinação constitucional.
– No que consiste o Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais e como ele vai funcionar? Ele irá fazer a compensação a todos os tipos de benefícios concedidos a empresas?
Fernanda Rizzo: O Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais tem o objetivo de permitir a manutenção dos benefícios fiscais estaduais até 2032, compensando as perdas das pessoas jurídicas com as mudanças no sistema. A compensação ocorrerá para os benefícios de ICMS por “prazo certo e sob condição” regularmente (inclusive para fins da LC 160/17) concedidos até 31 de maio de 2023. As regras para habilitação à compensação serão determinadas por lei complementar.
Até o momento, os aportes de recursos serão feitos pela União em valores que iniciam em R$ 8 bilhões de reais em 2025, aumentam até R$ 32 bilhões em 2028, reduzindo progressivamente até a R$ 8 bilhões em 2032.