MP restringe créditos do PIS e da Cofins

Exclusão do ICMS na aquisição de mercadorias reduz creditamento dos contribuintes

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Integrante do pacote fiscal do governo para melhorar as contas públicas, a Medida Provisória 1.159/23 (MP 1.159/23) mexeu com os créditos do PIS e da Cofins, e, embora bem-fundamentada, é possível que contribuintes venham a questioná-la na Justiça. A MP retirou o ICMS da base de cálculo dos créditos do PIS e da Cofins – o que equivale a dizer que vai aumentar o valor pago pelos contribuintes a título dessas duas contribuições. Pelos cálculos do governo, a medida traria um ingresso nos cofres públicos de 30 bilhões de reais em 2023 e de 39 bilhões no ano que vem.

A advogada Fernanda Rizzo, associada do Vieira Rezende Advogados, considera que há posições bem-fundamentadas pela legalidade ou ilegalidade da alteração feita, o que pode levar os contribuintes a questionarem a matéria na Justiça: “Se persistir a alteração trazida pela Medida Provisória, certamente terá a palavra final o Poder Judiciário.”

A MP alterou recente norma da Receita Federal, a Instrução Normativa 2.121/22, que havia previsto a inclusão do ICMS na tomada dos créditos do PIS e da Cofins. Um dos pontos que têm sido criticados pelos contribuintes diz respeito à diferença entre o cálculo do crédito e do débito do PIS e da Cofins (neste caso, o recolhimento das contribuições). Enquanto o cálculo do crédito estaria ligado ao custo de aquisição por parte do adquirente do insumo, passível de creditamento, o recolhimento do PIS e da Cofins estaria ligado ao faturamento (representando somente o que o vendedor recebe pela venda ou serviço praticado).

Por outro lado, a advogada explica que outro entendimento defende a alteração trazida pela MP (exclusão do ICMS do creditamento), por considerar que, se a parte do preço (ICMS) não está sujeita ao PIS e à Cofins, tal parte não deveria gerar crédito na entrada para o adquirente da mercadoria. Esse entendimento seria no sentido de alinhar a regra do creditamento à “tese do século” (Tema 69 do Supremo Tribunal Federal) em relação à saída – embora, considere a advogada, essa sistemática não se coadune com o sistema não cumulativo das contribuições. Sob essa ótica, submeter as entradas e as saídas a uma mesma regra de cálculo possibilitaria uma uniformidade para a apuração e o efeito de estender o entendimento do STF para ambos os cálculos, simplificando o procedimento.

Na entrevista abaixo, Rizzo aborda os dois lados da questão.


– Atualmente, como são calculados os créditos de PIS e Cofins? O ICMS entra na base de cálculo desses créditos?

 Fernanda Rizzo:  Enquanto a MP 1.159/23 não produz efeitos, os créditos de PIS e Cofins são tomados pelo adquirente sobre o valor total da nota fiscal, o que inclui o ICMS incidente na venda.


– O que o governo mudou com relação a essa sistemática? 

Fernanda Rizzo:   No julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) do RE 574706 (Tema 69), em 2017, ficou definida a tese segundo a qual o ICMS não integra a base de cálculo do PIS e da Cofins, uma vez que que não se incorpora ao patrimônio do contribuinte e não caracteriza receita, mas constitui mero ingresso no caixa e tem como destino os cofres públicos. A partir de tal julgado, surgiu o questionamento em relação à aquisição de mercadorias, uma vez que o ICMS estaria embutido no valor da nota fiscal objeto do creditamento de PIS e Cofins. Questionava-se se esse ICMS também deveria ser excluído do creditamento, partindo-se do mesmo raciocínio adotado pelo STF.

A Instrução Normativa 2.121/22 (IN 2.121/22), para esclarecer o questionamento, havia definido, no artigo 171, inciso II, que o ICMS incidente na venda pelo fornecedor poderia ser incluído no cálculo dos créditos de PIS e Cofins, confirmando o posicionamento da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional sobre a questão, pois o julgamento do Tema 69 estaria adstrito ao cálculo para o recolhimento dos tributos e não ao cálculo do crédito, não havendo autorização legal para a exclusão naquele momento, mas tão somente a sugestão para que o então Ministério da Economia propusesse ato normativo que tratasse expressamente da previsão de exclusão do ICMS do valor de aquisição dos créditos de PIS e Cofins.

Ato contínuo, o atual Ministério da Fazenda lança a Medida Provisória nº 1.159/23 nesse exato sentido, para impossibilitar a tomada de créditos de PIS e Cofins sobre o ICMS na aquisição de mercadorias.


– De que forma essa mudança impacta as empresas? 

Fernanda Rizzo:    A partir de tal alteração legislativa, as empresas deverão excluir o ICMS da base de cálculo dos créditos da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, diminuindo, portanto, o montante que será abatido do valor a recolher das contribuições.


– Os contribuintes podem questionar a nova forma de apuração dos créditos no Judiciário, com chances de sucesso, ou a medida editada pelo governo está bem amparada do ponto de vista jurídico? 

Fernanda Rizzo:    A Medida Provisória tem sido criticada pelos contribuintes, pois o cálculo do crédito estaria ligado ao custo de aquisição por parte do adquirente, passível de creditamento, pois incorrido pelo adquirente, ao passo que o recolhimento do PIS e da Cofins estaria ligado ao faturamento, este sim representando somente o que o vendedor recebe pela venda ou serviço praticado. Vale dizer, o regime de não cumulatividade do PIS e da Cofins tem característica de “base sobre base” e não “imposto sobre imposto”, como no caso do ICMS.

Isso significa que os créditos são apurados a partir dos valores das entradas, não a partir dos montantes de tributo efetivamente pagos nas etapas anteriores. E um dos motivos para tanto reside no fato de que o contribuinte nas operações anteriores poderia estar enquadrado no regime não cumulativo ou no regime cumulativo das contribuições, sendo inviável ao comprador acompanhar qual o montante pago dos tributos nas operações anteriores. Trata-se de regime de não cumulatividade compatível com a característica dessas contribuições.

Outra crítica à mudança legislativa se dá pelo veículo utilizado, qual seja, a Medida Provisória, ato normativo que pode não durar mais do que 120 dias, trazendo instabilidade para a alteração proposta. Além disso, a Medida Provisória tem cabimento para tratar de matérias excepcionalmente relevantes e urgentes, e não parece compatível com ato de majoração de tributo, majoração esta que é sujeita aos princípios da anterioridade (nonagesimal e anual) em matéria tributária.

Por outro lado, há entendimento que defende a alteração, para considerar que se a parte do preço (ICMS) não está sujeita ao PIS e à Cofins, tal parte não deveria gerar crédito na entrada para o adquirente da mercadoria, no sentido de alinhar a regra do creditamento ao entendimento do Tema 69 em relação à saída, embora, como acima destacado, tal sistemática não se coadune exatamente com o sistema não cumulativo das contribuições. Submeter as entradas e as saídas a uma mesma regra de cálculo possibilitaria uma uniformidade para a apuração e o efeito de estender o entendimento do STF para ambos os cálculos, simplificando o procedimento.

Assim, existindo posições bem fundamentadas em ambos os sentidos, seja pela legalidade ou pela ilegalidade da alteração realizada, verifica-se a possibilidade de questionamento da matéria pelos contribuintes. Se persistir a alteração trazida pela Medida Provisória, certamente terá a palavra final o Poder Judiciário.

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