ICMS sobre comércio eletrônico de softwares causa embate entre PGR e tributaristas

Órgão defende incidência do imposto para mercadorias físicas e digitais, mas advogados veem inconstitucionalidade na medida

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A tributação de bens e serviços digitais é um tema bastante controverso dentro do Direito tributário. Quando se trata da incidência de impostos sobre o comércio de softwares, o assunto gera ainda mais divergência. “Isso ocorre porque a constante evolução tecnológica e a dinâmica dos bens e mercadorias digitais não são acompanhadas, na mesma velocidade, pelo ordenamento jurídico vigente”, observa Paulo Coimbra, sócio do Coimbra & Chaves Advogados e associado ao Legislação & Mercados.

Do ponto de vista da jurisprudência tributária, o imposto sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS) deveria ser cobrado nas operações com os softwares de prateleira, em formato de mídia digital adquirida pelo consumidor. Segundo Coimbra, o precedente paradigma* sobre o tema foi proferido pelo STF [Supremo Tribunal Federal] em abril de 1999. Na ocasião, destaca, foi decidido que o tratamento de mercadoria e a incidência de ICMS apenas devem ser conferidos aos softwares amparados por suporte físico que possibilite o acesso do usuário ao programa.

Mas uma outra decisão do STF, de maio de 2010, seguiu por outra direção: o órgão indeferiu o pleito da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1945, que dizia respeito a um dispositivo legal do Estado do Mato Grosso que determinou a incidência de ICMS sobre o download de softwares, não apenas sobre suas cópias físicas.

O assunto é tema de divergências entre a Procuradoria-Geral da República (PGR) e tributaristas. A PGR defendeu, por meio do Parecer nº 380736/19, a incidência da tributação sobre os softwares padronizados, independentemente se comercializados por meio físico ou digital. 

Conflito de competências estadual e municipal sobre o ISSQN e ICMS

Coimbra comenta que essas incertezas envolvem, ainda, conflito de competências entre estados e municípios, na medida em que a eventual caracterização como serviço ou como mercadoria é que define a incidência do ISSQN (imposto sobre serviços de qualquer natureza, municipal) ou do ICMS (estadual). Assinado pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, o Parecer nº 380736/19 é referente à ADI 5958. A Brasscom (Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação), requerente dessa ADI, alega que a incidência de ICMS gera uma bitributação sobre essas mercadorias, pois para elas já há a cobrança do ISSQN. 

A entidade contesta a constitucionalidade do Convênio ICMS 106/17.Esse convênio, editado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária [Confaz], disciplina os procedimentos de cobrança do ICMS incidentes nas operações com bens e mercadorias digitais comercializadas por meio de transferência eletrônica de dados e concede isenção nas saídas anteriores à saída destinada ao consumidor final”, explica Coimbra. 

Inconstitucionalidade do convênio do Confaz

Tributaristas discordam da visão da PGR. Segundo Coimbra, o convênio desrespeita a competência do Senado, expressa na Constituição Federal, para fixar as alíquotas de ICMS incidentes nas operações interestaduais com mercadorias. Os limites normativos inerentes ao convênio também estariam sendo extrapolados — ele estipula, por exemplo, quem seriam os contribuintes e responsáveis pelo pagamento do imposto nessas operações. “Nos termos do art. 155, § 2º, XII, ‘g’, da Constituição, aos convênios do Confaz cabe tão somente a delimitação das hipóteses de concessão de isenções, benefícios e incentivos fiscais”, ressalta. Ao validar o convênio, a PGR estaria de acordo com a inconstitucionalidade.

“A indeterminação dos conceitos atrelados a essas realidades é o fator causador da complexidade da determinação de qual seja a tributação mais adequada a incidir sobre essas operações.” Para o advogado, a edição de lei complementar específica sobre o tema seria, por meio da atuação do Congresso Nacional, o melhor mecanismo para solucionar o conflito. “Isso evitaria uma guerra fiscal, contribuiria para o equilíbrio federativo e garantiria segurança jurídica aos contribuintes”, acrescenta.

*RE 176.626

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