CVM aprova proposta da B3 para medidas de diversidade em companhias abertas
Conselhos e diretorias devem reportar informações no Formulário de Referência a partir de 2025
Como parte de um esforço do mercado para intensificar a agenda ASG (fatores ambientais, sociais e de governança), a B3 apresentou à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) uma proposta para adoção de medidas de incentivo à diversidade nas companhias abertas. O pleito foi aceito pelo regulador, e a partir de 2025 as empresas devem apresentar à Bolsa os primeiros conjuntos de informações sobre o tema.
O reporte será feito em uma área específica do Formulário de Referência, o Anexo ASG.
“As companhias terão que eleger como membro titular de seu conselho de administração ou diretoria estatutária pelo menos uma mulher – assim entendida qualquer pessoa que se identifique com o gênero feminino – e um membro de comunidade sub-representada – qualquer pessoa que se identifique como preta, parda ou indígena, integrante da comunidade LGBTQIA+ ou com deficiência”, destacam Felipe Hanzsmann, Ana Luisa Fucci, Maria Ramos Dias e Thomaz Veiga, do Vieira Rezende Advogados.
O modelo proposto pela B3 é o “pratique ou explique”, em que as companhias devem detalhar suas ações em determinado tema e explicar por que não adotam determinada prática.
“Tendo em vista a tendência de os investidores cobrarem cada vez mais do mercado a adoção de medidas ASG, a expectativa é que haja uma grande adesão por parte das companhias, inclusive motivada pela possibilidade de risco reputacional”, afirmam.
Na entrevista a seguir, os advogados detalham outros aspectos da proposta e da implementação do Anexo ASG.
– Quais são os principais tópicos do anexo ASG da B3 sobre diversidade? Ele será aplicável a todas as companhias listadas, independentemente do segmento?
Felipe Hanzsmann, Ana Luisa Fucci, Maria Ramos Dias e Thomaz Veiga: O Anexo ASG foi elaborado pela B3 com o objetivo de orientar as companhias listadas a respeito de medidas de cunho ambiental, social e de governança corporativa que devem ser tomadas a fim de estimular a diversidade na alta liderança, dentro do conceito de “pratique ou explique” (comply or explain). As regras deverão ser observadas pelas companhias listadas em todos os segmentos da B3, exceto aquelas expressamente dispensadas no Anexo, conforme mencionado a seguir.
A B3 apresentou três temas principais no Anexo, relacionados com a administração e os documentos societários das companhias. O primeiro deles diz respeito à composição da administração. A chamada Medida ASG 1 estabelece a necessidade de que as companhias elejam como membro titular de seu conselho de administração ou diretoria estatutária, pelo menos uma mulher (assim entendida qualquer pessoa que se identifique com o gênero feminino, a despeito do sexo designado em seu nascimento) e um membro de comunidade sub-representada, assim entendido como qualquer pessoa que se identifique como preta, parda ou indígena (nos termos da classificação apresentada pelo IBGE), integrante da comunidade LGBTQIA+ ou com deficiência (nos termos do Estatuto da Pessoa com Deficiência).
Já a Medida ASG 2, por sua vez, diz respeito à inclusão, no estatuto social ou em política de indicação, de requisitos ASG para indicação dos membros do conselho de administração e da diretoria estatutária. O procedimento de indicação dos membros dos órgãos governamentais deverá considerar, no mínimo, critérios de complementariedade de experiências e diversidade em matéria de gênero, orientação sexual, cor ou raça, faixa etária e inclusão de pessoa com deficiência.
Por fim, a Medida ASG 3 determina que, na hipótese de haver remuneração variável para os membros da administração, deve-se implementar uma política ou prática de remuneração que esteja atrelada a indicadores ou metas ASG de diversidade.
O regulamento prevê algumas exceções à obrigatoriedade de implementação das medidas de ASG previstas no Anexo: companhias abertas registradas na categoria B perante a CVM; companhias de menor porte, nos termos do artigo 294-B da Lei nº 6.404/1976; companhias beneficiárias de recursos oriundos de incentivos fiscais, nos termos da Resolução CVM nº 10, ou emissoras de BDR Patrocinados.
– Como deve ser a adaptação das companhias? O prazo é condizente com o período necessário para a formação de lideranças?
Felipe Hanzsmann, Ana Luisa Fucci, Maria Ramos Dias e Thomaz Veiga: A B3 determina que as companhias devem implementar as Medidas ASG 2, ASG 3 e ao menos um dos incisos da ASG 1 até o prazo de atualização anual obrigatória do Formulário de Referência do ano subsequente à listagem, devendo a Medida ASG 1 ser totalmente implementada até o segundo ano subsequente à listagem. Para as companhias já listadas na data de vigência do Anexo, ficam fixados os anos de 2025 e 2026, respectivamente.
Entendemos que o prazo estabelecido é razoável para que as companhias possam se preparar e fazer eventuais mudanças e ajustes necessários para se enquadrar nos parâmetros ASG estabelecidos.
– O que acontecerá com as companhias que não indicarem uma mulher e um integrante de comunidade sub-representada para o conselho de administração ou para a diretoria estatutária?
Felipe Hanzsmann, Ana Luisa Fucci, Maria Ramos Dias e Thomaz Veiga: O Regulamento de Emissores da B3 não prevê punições para as companhias que não adotarem as métricas ASG constantes no Anexo B. Contudo, o modelo “pratique ou explique” prevê a necessidade de as companhias justificarem ao mercado, de forma transparente, o motivo de não estarem cumprindo esses parâmetros.
A falta de explicação do motivo pelo qual a companhia não tiver adotado ou tiver adotado parcialmente as medidas, entretanto, será considerada como uma violação às obrigações contínuas perante a B3 e pode ensejar a instauração de procedimento administrativo na Bolsa, com possível aplicação de sanções que, dependendo da natureza e da gravidade da infração, podem chegar até ao cancelamento da admissão de negociação dos valores mobiliários da companhia, além da possibilidade de colocação automática dos valores mobiliários em negociação não contínua.
– Qual é a expectativa de adesão das companhias e de efetivo aumento da diversidade, uma vez que o modelo é o “pratique ou explique”?
Felipe Hanzsmann, Ana Luisa Fucci, Maria Ramos Dias e Thomaz Veiga: Tendo em vista a tendência de os investidores cobrarem cada vez mais do mercado a adoção de medidas ASG, a expectativa é de que haja uma grande adesão por parte das companhias, inclusive motivada pela possibilidade de risco reputacional, por serem obrigadas a explicar a razão de não adotarem as medidas presentes no Anexo B do Regulamento de Emissores da B3. Ressalta-se, ainda, que o mercado participou ativamente do processo de audiência pública das novas medidas, tendo sido oferecidas 253 manifestações sobre a minuta, portanto entende-se que a versão final já contempla as visões dos stakeholders.