Menos entraves para o rito simplificado

CVM vai revisar normas sobre Processos Administrativos Sancionadores

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Os ritos simplificados, usados nos Processos Administrativos Sancionadores (PAS) que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) move contra agentes do mercado, foram criados para dar mais agilidade a esses processos. No entanto, vêm sendo pouco utilizados – e retirar entraves ao seu uso é o que a autarquia pretende por meio de futura alteração na regra dos PAS, visando justamente dar mais celeridade aos julgamentos.

Em 2023, apenas 8 dos 72 julgamentos da CVM foram realizados por meio de ritos simplificados, de acordo com informações do Valor Econômico. A CVM já iniciou discussões e deve fazer consultas ao mercado sobre a revisão na utilização do rito simplificado, assim como modificações na Resolução 45/2021 (Resolução  45/21), que trata dos processos. Ricardo Mafra, Felipe Hanszmann e Thomaz Veiga, respectivamente associados e sócio do Vieira Rezende Advogados, explicam que o rito simplificado é previsto no artigo 73 e seguintes da Resolução 45/21 e pode ser usado em casos menos complexos, nos quais não é necessária a dilação probatória. Os PAS sujeitos a esse rito precisam ser julgados em até 120 dias após a sua distribuição – previsão inexistente quando o julgamento se dá pelo rito ordinário, o mais comumente usado.

Além de modificações que possam tornar o uso do rito simplificado mais frequente, eles consideram que outra revisão pode abranger o detalhamento do processo de produção de provas, que muitas vezes se estende por longo período. “Fora isso, algumas medidas que não dependem de alteração da regulação já têm sido tomadas pela CVM, como a utilização de instrumentos alternativos para lidar com infrações de menor potencial danoso ao mercado, como os ofícios de alerta”, afirmam.

“De todo o modo, também é importante que, para além das normas, a CVM seja dotada de orçamento e recursos humanos e materiais compatíveis com o tamanho do mercado brasileiro, pois parte da explicação para a demora dos processos administrativos, muitas vezes, é a escassez de recursos pela qual passa a autarquia”, afirmam os advogados.

Na entrevista abaixo, Mafra, Hanszmann e Veiga abordam a questão.


– No que consistem e como funcionam os Processos Administrativos e Processos Administrativos Sancionadores da CVM?

Ricardo Mafra, Felipe Hanszmann e Thomaz Veiga: O Processo Administrativo tem finalidades diversas dentro da estrutura administrativa da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), podendo ser o meio pelo qual a autarquia emite opiniões, manifestações, entendimentos e pareceres, assim como aplica multas cominatórias.

O Processo Administrativo Sancionador (PAS), como diz o nome, é uma modalidade do processo administrativo específica que tem como objetivo o exercício do poder punitivo da CVM quando constatada violação às normas emitidas pela autarquia. Por ter finalidade punitiva, considera-se aplicável ao PAS princípios como o do contraditório e ampla defesa.


– Com relação aos dois ritos previstos, ordinário e simplificado, quando são aplicados e quais as diferenças entre os dois?

Ricardo Mafra, Felipe Hanszmann e Thomaz Veiga: A aplicação do rito simplificado é prevista no artigo 73 e seguintes da Resolução CVM nº 45/2021 (Resolução  45/21), que dispõe sobre o rito dos procedimentos relativos à atuação sancionadora e prevê a possibilidade de adoção deste nos casos em que, devido ao nível de complexidade, não seja necessária a dilação probatória.

O que se nota no rito simplificado é a delegação para as superintendências de funções que a princípio seriam de encargo do diretor relator; por exemplo quanto à elaboração do relatório. Enquanto no processo ordinário, o diretor relator do caso é o responsável pela elaboração do relatório, no rito simplificado essa função é delegada à superintendência do caso, podendo o relatório inclusive ser utilizado pelo diretor relator como fundamentação para a sua decisão.

Outra diferença diz respeito à celeridade do rito simplificado, tendo em vista que os PAS sujeitos a esse rito deverão ser julgados no prazo máximo de 120 dias após a sua distribuição, previsão inexistente no rito ordinário.


– Em 2023, apenas 8 dos 72 julgamentos da CVM foram realizados por meio de ritos simplificados. Por que isso ocorreu? Essa possibilidade poderia ser mais usada sem gerar efeitos nocivos para o mercado?

Ricardo Mafra, Felipe Hanszmann e Thomaz Veiga: São previstas na norma diversas condutas que podem ser objeto de processos administrativos de rito simplificado. Contudo, o que se vê na prática é que as hipóteses de exceção do artigo 73 da Resolução  45/21 acabam dificultando o uso dessa modalidade.

A Resolução  45/21 prevê que o rito simplificado não se aplica nos seguintes casos: se for necessária dilação probatória; se o processo for instaurado para apurar mais de uma infração, sendo que uma delas não se enquadra nas hipóteses previstas para o rito simplificado; e se o processo é originado de inquéritos administrativos ou de seus desdobramentos.

Dos casos que são julgados pelo colegiado, nota-se que são raros os casos em que não há pelo menos um desses impeditivos, em grande parte devido à complexidade dos casos julgados pela autarquia, que necessitam muitas vezes de produção de provas e são oriundos de inquéritos instaurados pela CVM.


 – A CVM deverá revisar as regras referentes aos processos que move contra agentes do mercado. O que merece ser revisto e o que pode ser feito para aumentar a celeridade dos julgamentos e aprimorar o enforcement?

Ricardo Mafra, Felipe Hanszmann e Thomaz Veiga: Entendemos que uma das possibilidades é a revisão das hipóteses em que o rito simplificado é aplicado, de modo a tornar o seu uso mais frequente. Uma outra possibilidade seria o detalhamento do processo de produção de prova, que muitas vezes se estende por longo período. Fora isso, algumas medidas que não dependem de alteração da regulação já têm sido tomadas pela CVM, como a utilização de instrumentos alternativos para lidar com infrações de menor potencial danoso ao mercado, como os ofícios de alerta.

De todo o modo, também é importante que, para além das normas, a CVM seja dotada de orçamento e recursos humanos e materiais compatíveis com o tamanho do mercado brasileiro, pois parte da explicação para a demora dos processos administrativos, muitas vezes, é a escassez de recursos pela qual passa a autarquia.

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