Alíquota do IVA Dual: como vai funcionar?

Entenda como serão fixadas a CBS e o IBS e qual é o papel da média de 26,5% divulgada pelo governo

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Logo após a apresentação do Projeto de Lei Complementar 68/24 (PLP 68/24) para regulamentar a Reforma Tributária sobre o consumo, iniciou-se uma discussão sobre a alíquota média projetada para o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) Dual, de 26,5%; se esta não seria excessivamente elevada e se não poderia até aumentar, a depender das decisões tomadas com relação aos regimes especiais e isenções.

Para Anna Laura Lacerda e Romero Marinho, associados do Freitas Ferraz Advogados, a alíquota média de 26,5% tende a ser benéfica: “Considerando que, após a implementação do IVA Dual, o ICMS, ISS, IPI (em regra), Pis e Cofins, que compõem a alíquota de 34,4%, serão substituídos pela CBS e IBS, cuja alíquota estimada está em torno de 26,5%, haverá tanto uma simplificação do sistema tributário, pelo menos no que tange ao consumo, quanto uma economia por parte dos contribuintes.”

“Mesmo que a alíquota efetiva seja diferente de 26,5%, o cenário ainda pode ser positivo diante da transparência fiscal e simplificação do sistema, que almeja tanto a redução da judicialização de questões tributárias e maior comunicabilidade entre o sistema brasileiro e o internacional como um todo.” Eles lembram que muitas vezes a carga tributária não é transparente diante das formas de cálculo (por dentro e por fora, a depender do tributo).

Para Gyedre Carneiro de Oliveira, Pedro Miranda Roquim e Bárbara Borges, sócia e parceiros do Carneiro de Oliveira Advogados, ainda é muito difícil e prematuro afirmar se a tributação após a reforma será maior ou menor. “Se analisada diretamente a alíquota de referência de 26,5%, é possível verificar, em estudos comparativos com países que possuem o IVA, que esta será uma das alíquotas mais altas, ficando atrás somente da Hungria”, afirmam. “Por outro lado, no cálculo do Ministério da Fazenda, a alíquota padrão de cobrança do Pis, Cofins, ICMS e ISS ‘englobados’ seria de 34,4%, o que é usado para sustentar que hoje em dia o contribuinte possui carga tributária maior.”

Como serão fixadas as alíquotas da CBS e do IBS 

Os advogados do Freitas Ferraz explicam que a média de 26,5% é uma estimativa calculada para a alíquota do IVA Dual, sendo 8,8% para CBS e 17,7% para IBS – mas ela poderá variar em função da existência dos regimes especiais e isenções. Outro ponto é que os Estados continuarão tendo poder para fixar as próprias alíquotas para o IBS, em respeito à autonomia presente no chamado pacto federativo.

Ou seja, a alíquota é apenas uma referência que será utilizada para bens e serviços que não serão beneficiados por algum tipo de tratamento diferenciado. “Infelizmente, a fixação pelos Estados, Municípios e Distrito Federal de alíquota de IBS acima da alíquota de referência não está vedada, sendo possível sua fixação por meio de leis específicas, conforme artigo 14 do PLP 68/24”, ressaltam Carneiro de Oliveira, Roquim e Borges. Eles lembram que o fator relevante para a formação das alíquotas é a manutenção do atual padrão arrecadatório na extinção do Pis, Cofins, IPI, ICMS e ISS.

O governo prevê que as alíquotas oscilem entre 25,7% e 27,3%, com a média de 26,5%. Apesar de o PLP 68/24 já ter incluído anexos contendo lista taxativa de bens e serviços sujeitos a regimes especiais de IBS e CBS, estes ainda estão sujeitos a alterações. A média de 26,5% foi calculada com base na base na receita anual da União (CBS) e da esfera federativa (IBS), e, portanto, a aproximação da alíquota de referência a 25,7% ou a 27,3% está diretamente relacionada aos regimes especiais e isenções: “A inclusão ou exclusão de determinados bens e serviços nos regimes especiais, e a tributação e isenção, afetam a apuração de receita pela União, Estados e Municípios, e por consequência, o cálculo da alíquota do IVA Dual”, afirmam Marinho e Lacerda.

Na entrevista abaixo, os advogados do Freitas Ferraz e do Carneiro de Oliveira e seus parceiros abordam aspectos da alíquota média prevista para o IVA Dual.


– No primeiro Projeto de Lei para regulamentar a Reforma Tributária, o governo estipula uma alíquota de referência do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) de 25,7% a 27,3%, com média de 26,5%. Qual é o significado dessa alíquota de referência? Somados, CBS e IBS não poderão ultrapassá-la? 

Anna Laura Lacerda e Romero Marinho: A média de 26,5% é uma estimativa calculada para a alíquota do IVA Dual, sendo 8,8% para CBS e 17,7% para IBS. Tratando-se de uma projeção, a alíquota de referência ainda não considera exceções e regimes especiais, de forma que a alíquota de 26,5% não deve ser absolutamente considerada.

Adicionalmente, os Estados e Municípios podem aprovar, por meio de Projetos de Lei locais, alíquotas superiores ou inferiores à estimativa federal. Desta forma, a referência tem natureza de um “guia” para fins de definição das alíquotas de CBS e IBS, servindo de base análise para os Estados e Municípios definirem as alíquotas locais considerando as estimativas federais.

Como a alíquota de IBS fixada será aplicável para todas as operações com bens e serviços (regra geral), a ideia é reduzir a possibilidade de os Estados ofereçam incentivos, instalando uma nova guerra fiscal. Outro ponto é que, como a tributação será no destino (consumidor), e não na origem (empresas), poderá haver uma relação direta entre as políticas fiscais e eleitorais.

Gyedre Carneiro de Oliveira, Pedro Miranda Roquim e Bárbara Borges: A alíquota de referência é estimada pelo Senado (artigo 156-A, XII da Constituição Federal), com base em cálculo do Tribunal de Contas da União (artigo 130 § 1º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), para estabelecer um piso arrecadatório, proporcional ao Produto Interno Bruto (PIB) do país e manter a arrecadação da União, Estado, Municípios e Distrito Federal na transição dos tributos.


– Considerando a CBS e o IBS, o PL estipula qual deve ser a alíquota média de cada um? Os Estados terão poder para estabelecer alíquotas de IBS acima da alíquota de referência?

Anna Laura Lacerda e Romero Marinho: Municípios poderão vincular a alíquota local de IBS à referência federal e aumentar ou diminuir em pontos percentuais por meio de lei específica, ou prever alíquotas próprias. No entanto, essa variação da alíquota estará sujeita à anterioridade nonagesimal.

O texto apresentado prevê uma alíquota de 17,7% de IBS e 8,8% de CBS, totalizando a referência federal de 26,5%. Importante ressaltar que os Estados e Municípios devem levar em consideração que a alíquota de IBS fixada será aplicável para todas as operações com bens e serviços (regra geral), de forma a limitar que os entes federativos incentivem determinadas atividades e acabem por constituir uma “nova” guerra fiscal”. Além disso, como a tributação será no destino (consumidor), e não na origem (empresas), poderá haver uma relação direta entre as políticas fiscais e eleitorais.

Como bem explicaram os representantes do Ministério da Fazenda, permitir que os entes federais determinem as alíquotas do IBS é uma forma de preservar o pacto federativo, preservando a autonomia dos Estados e Municípios.

Gyedre Carneiro de Oliveira, Pedro Miranda Roquim e Bárbara Borges: A atual versão do Projeto de Lei 68/24 não estipula a alíquota média da CBS e do IBS, mas define os parâmetros para a formação da alíquota de referência de cada tributo (CBS, artigos 340 a 348 e IBS, artigos 349 a 354), que serão observados pelos entes federativos de maneira não impositiva.

As alíquotas publicadas de 8,8% de CBS e 17,7% do IBS são estimativas do Ministério da Fazenda, aplicadas apenas para bens e serviços que não serão beneficiados por algum tipo de tratamento diferenciado.

Infelizmente, a fixação pelos Estados, Municípios e Distrito Federal de alíquota de IBS acima da alíquota de referência não está vedada, sendo possível sua fixação por meio de leis específicas, conforme artigo 14 do PLP 68/24:

“Art. 14. As alíquotas da CBS e do IBS serão fixadas por lei específica do respectivo ente federativo, nos seguintes termos:

I – a União fixará a alíquota da CBS;

II – cada Estado fixará sua alíquota do IBS;

III – cada Município fixará sua alíquota do IBS;

IV – o Distrito Federal fixará sua alíquota do IBS, que corresponderá à soma da alíquota estadual e municipal.

  • 1º Ao fixar sua alíquota, cada ente federativo poderá:

I – vinculá-la à alíquota de referência da respectiva esfera federativa, de que trata o artigo 18 por meio de acréscimo ou decréscimo à alíquota de referência, definido em pontos percentuais; ou

II – defini-la sem vinculação à alíquota de referência da respectiva esfera federativa.

  • 2º Na ausência de lei específica que estabeleça a alíquota do ente federativo, será aplicada a alíquota de referência da respectiva esfera federativa. (…)”.

Apenas na ausência de lei específica será aplicada a alíquota de referência, nos termos do artigo 14, § 2º. É importante ressaltar que as alíquotas do IBS não poderão ser inferiores aos percentuais estabelecidos no processo de transição de 2029 a 2077 (Anexo XVII do PL), nos termos do que dispõe o artigo 360:

“Art. 360. De 2029 a 2077 é vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios fixar alíquotas do IBS inferiores às necessárias para garantir as retenções de que tratam o § 1º do artigo 131 e o artigo 132, ambos do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal.

  • 1º Para fins do disposto no caput deste artigo, as alíquotas do IBS fixadas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios não poderão ser inferiores ao valor resultante da aplicação dos percentuais estabelecidos para cada ano no Anexo XVII, sobre a alíquota de referência da respectiva esfera federativa.
  • 2º Na hipótese de fixação da alíquota pelo ente em nível inferior ao previsto no § 1º, prevalecerá o limite inferior da alíquota, calculado nos termos do § 1º deste artigo.”

– Quais fatores devem fazer com que a alíquota se aproxime mais de 25,7% ou de 27,3%? Já é possível fazer algum prognóstico a respeito? 

Anna Laura Lacerda e Romero Marinho: A alíquota será projetada com base na receita anual auferida pela União em períodos anteriores, em estimativas da receita de CBS/IBS, caso a alíquota de referência seja aplicada em cada um dos períodos analisados, considerando os regimes especiais, e Imposto Seletivo (IS) e IPI, caso as respectivas alíquotas sejam aplicadas nos períodos analisados.

As projeções do Ministério da Fazenda (entre 25,7% e 27,3%) ainda não consideram as alíquotas diferenciadas para os regimes especiais e isenções que serão concedidas. Apesar de o Projeto de Lei já ter incluído anexos contendo lista taxativa de bens e serviços sujeitos a regimes especiais de IBS e CBS, estes ainda estão sujeitos a alterações.

Como as referências que compõem a média de 26,5% foram calculadas com base na receita anual da União (CBS) e da esfera federativa (IBS), a aproximação da alíquota de referência a 25,7% ou a 27,3% está diretamente relacionada aos regimes especiais e isenções.

A inclusão ou exclusão de determinados bens e serviços nos regimes especiais, e a tributação e isenção, afetam a apuração de receita pela União, Estados e Municípios, e por consequência, o cálculo da alíquota do IVA Dual.

Gyedre Carneiro de Oliveira, Pedro Miranda Roquim e Bárbara Borges: Segundo as discussões sobre o tema, o fator relevante para a formação das alíquotas é a manutenção do padrão atual arrecadatório na extinção do Pis, Cofins, IPI, ICMS e ISS, especialmente considerando as receitas decorrentes das operações e importações, a qual é chamada de “receita de referência” pelos artigos 338 e 339 do PLP 68/24.

Dada a influência direta na arrecadação, as alíquotas reduzidas e os regimes diferenciados a determinados produtos ou/e serviços também deverão ser considerados na definição de alíquota mais próxima de 25,7% ou 27,3%.


– Muitos especialistas consideraram a alíquota média elevada. Como você avalia a questão? A ser mantida a alíquota média de 26,5%, a carga tributária será mantida ou alterada em relação à atual?

Anna Laura Lacerda e Romero Marinho: Atualmente, o Brasil conta com uma carga tributária elevada que acaba por afetar o poder aquisitivo da população, e, muitas vezes, inviabilizar a atividade econômica. Conforme estimativa do Ministério da Fazenda, os impostos federais e o ICMS atingem uma alíquota total de 34,4%, sendo que, muitas vezes a carga tributária não é transparente diante das formas de cálculo (por dentro e por fora, a depender do tributo).

Considerando que, após a implementação do IVA Dual, o ICMS, ISS, IPI (em regra), Pis e Cofins, que compõem a alíquota de 34,4%, serão substituídos pela CBS e IBS, cuja alíquota estimada está em torno de 26,5%, haverá tanto uma simplificação do sistema tributário, pelo menos no que tange ao consumo, quanto uma economia por parte dos contribuintes.

Mesmo que a alíquota efetiva seja diferente de 26,5%, o cenário ainda pode ser positivo diante da transparência fiscal e simplificação do sistema, que almeja tanto a redução da judicialização de questões tributárias e maior comunicabilidade entre o sistema brasileiro e o internacional como um todo.

Gyedre Carneiro de Oliveira, Pedro Miranda Roquim e Bárbara Borges: É muito difícil e prematuro ainda afirmar se a tributação será maior ou menor, sendo aliás este o grande motivo da inclusão nos Projetos de Lei das regras de revisão das alíquotas.

Se analisada diretamente a alíquota de referência de 26,5%, é possível verificar, em estudos comparativos com países que possuem o IVA, que esta será uma das alíquotas mais altas, ficando atrás somente da Hungria.

Por outro lado, no cálculo do Ministério da Fazenda, a alíquota padrão de cobrança do Pis, Cofins, ICMS e ISS “englobados” seria de 34,4%, o que é usado para sustentar que hoje em dia o contribuinte possui carga tributária maior.

Dessa forma, será preciso uma definição mais clara e a aprovação dos Projetos de Lei para que possamos responder objetivamente a esta pergunta, pois qualquer alteração na legislação pode interferir na resposta.


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