Decisão inédita chama atenção para compliance de gestão de mão-de-obra

TST condena empresa devido ao descumprimento de exigência de capital social mínimo

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Uma decisão inédita e recente do Tribunal Superior do Trabalho (TST) chamou atenção para a importância de as empresas prestarem atenção ao compliance de gestão de mão-de-obra. De forma inédita, a Sexta Turma da corte condenou a construtora e companhia aberta MRV a pagar indenização por dano moral coletivo em decorrência de terceirização ilícita, pois o fornecedor da mão-de-obra não tinha o capital social mínimo determinado por lei. É a primeira vez em que o TST baseia a sua decisão neste requisito – que não costumava estar no radar do mercado.  

“A Lei 13.429/17 autorizou a terceirização de forma indiscriminada, mas, como forma de garantir o cumprimento das obrigações trabalhistas, impôs requisitos ao funcionamento das prestadoras de serviços, entre eles a compatibilidade entre o capital social e o número de empregados, o que deve ser observado pelas normas de governança”, avalia a advogada Carolina Tupinambá, parceira do Fleichman Advogados. Ela recomenda que as empresas elaborem bons contratos de terceirização, com gatilhos para ressarcimento de prejuízos, adoção de normas de compliance de gestão de mão-de-obra e com amplitude de fiscalização.

A condenação da MRV se deu pela contratação de empresa com capital social mínimo não condizente com o número de empregados e prevê uma indenização de 200 mil reais. Tupinambá explica que a decisão foi da Sexta Turma e não forma precedente vinculante, mas pode estimular fiscalizações pelos órgãos competentes. A decisão também se amparou no conceito de dumping social – obtenção de vantagens competitivas em função de violação da legislação trabalhista. 

Na entrevista abaixo, Tupinambá esclarece quais critérios são levados em conta para considerar uma terceirização lícita ou ilícita e aborda a recente decisão da corte.


Em quais situações as terceirizações são consideradas lícitas ou ilícitas?

Carolina Tupinambá: A prestação de serviços indireta por empresa terceirizada é modalidade de contrato há algum tempo prevista de forma específica em certos cenários e arranjos, tais como a empreitada (artigo 455 da Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT), o contrato de vigilante (Lei 7.102/83), a intermediação via cooperativa (artigo 442 da CLT) e o contrato de trabalhador temporário (Lei 6.019/74).

Entretanto, foi somente a partir das Leis 13.429 e 13.467, ambas de 2017, que restou expressamente regulamentada a terceirização em geral, para qualquer tipo de perfil contratual, de acordo com os artigos 4º-A e 5º-A da Lei 6.019/74, os quais permitem a adoção do modelo terceirizado para execução de todas as atividades desenvolvidas, inclusive a principal, permitida, ademais, a subcontratação dos serviços, ou seja, a “quarteirização”.

Ao julgar o tema 725 de repercussão geral e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 30/08/2018, ratificou ser lícita a terceirização em todas as etapas do processo produtivo.

A empresa prestadora de serviços deverá contratar, remunerar e dirigir o trabalho realizado por seus trabalhadores. De forma facultativa, na terceirização, o tomador de serviços pode prever a extensão do atendimento médico, ambulatorial e de refeição destinado aos empregados diretos, o salário equivalente ao pago aos empregados da contratante, além de outros direitos. Os serviços contratados poderão ser executados nas instalações físicas da empresa contratante ou em outro local.

De forma obrigatória, deve-se garantir as condições de segurança, higiene e salubridade e, quando e enquanto os serviços forem executados nas dependências da tomadora, as mesmas condições dos empregados da contratante em relação à alimentação em refeitórios; serviços de transporte; atendimento médico ou ambulatorial; medidas de saúde no trabalho e instalações adequadas à prestação dos serviços.

Os parâmetros entre o capital social da empresa e o número de empregados estão previstos no artigo 4º-B, inciso III, alíneas “a” a “e”, da Lei 6.019/74, que trata do trabalho temporário.

Parece-me possível afirmar que a terceirização, via de regra, será lícita, ressalvadas as hipóteses de presença de elementos do vínculo empregatício entre o trabalhador e a tomadora de serviços, ou de violações específicas dos critérios estabelecidos na Lei 6.019/74.


Recente decisão do TST condenou uma empresa (a MRV) a pagar indenização por dano moral coletivo em decorrência de terceirização ilícita. Como você avalia a decisão?

Carolina Tupinambá: Decisão pontual em hipótese específica de modelo de terceirização, qual seja, o trabalho temporário, com evidência de inobservância de critério de legalidade formal e objetivo determinado por lei — no caso, o capital social mínimo da empresa fornecedora de mão-de-obra. A decisão foi da Sexta Turma e não forma precedente vinculante.


A decisão do TST pode pautar outras decisões da Justiça do Trabalho ou o trabalho dos auditores?

Carolina Tupinambá: Pode estimular fiscalizações pelos órgãos competentes.


Em face dessa decisão, o que se recomenda às empresas que contratam serviços terceirizados?

Carolina Tupinambá: Elaboração de um bom contrato de terceirização, com gatilhos para ressarcimento de prejuízos, adoção de normas de compliance de gestão de mão-de-obra e com amplitude de fiscalização.

A Lei 13.429/17 autorizou a terceirização de forma indiscriminada, mas, como forma de garantir o cumprimento das obrigações trabalhistas, impôs requisitos ao funcionamento das prestadoras de serviços, entre eles a compatibilidade entre o capital social e o número de empregados, o que deve ser observado pelas normas de governança.

 

 

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