Consultores não sediados no Brasil poderão atuar no mercado local a partir de junho
Instrução 619 da CVM moderniza regulação da atividade de consultoria de investimentos para adaptá-la às melhores práticas internacionais
A recém-editada Instrução 619 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) moderniza a regulação da atividade de consultoria de valores mobiliários no País, a fim de alinhar o mercado brasileiro às melhores práticas internacionais. A norma passa a permitir que consultores sediados no exterior atuem no Brasil, atendendo uma importante demanda do mercado por internacionalização.
Publicada no último dia 6 de fevereiro, ela altera a Instrução 592, de forma a preparar o mercado brasileiro para a livre circulação não só de capitais e de investimentos, mas também da prestação de serviços. “A nova instrução representa um movimento político e regulatório em prol da entrada do País na OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico]”, afirma Bernardo Freitas, sócio do Freitas Ferraz Capuruço Braichi Riccio Advogados e afiliado ao L&M. “Os códigos de liberalização de capitais da OCDE demandam mercados que aceitem serviços de outros países”, acrescenta.
Para atuarem no Brasil, os consultores estrangeiros devem ser devidamente reconhecidos pela CVM e precisam aderir à Instrução 592, a norma que regula a atividade. Também devem seguir os procedimentos de análise de perfil dos investidores e as normas relativas à prevenção de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, direitos e valores — Instruções 539 e 617, respectivamente.
“Quando atuarem no Brasil, os consultores de investimentos não sediados no País estarão sujeitos ao mesmo arcabouço regulatório aplicável aos consultores locais. Ou seja, a nova regra privilegia a igualdade de tratamento regulatório e mitiga qualquer risco de ‘arbitragem regulatória’”, comenta Elvis Mattar, sócio do Navarro Advogados e afiliado ao L&M. A Instrução 619 entra em vigor em 1º de junho de 2020.
A seguir, Freitas e Mattar discutem os principais pontos da Instrução 619.
Principais diferenças entre a Instrução 592 e a Instrução 619
Do ponto de vista jurídico, a Instrução 619 faz ajustes pontuais na Instrução 592, principalmente para permitir o exercício de consultoria de valores mobiliários por consultores sediados e/ou domiciliados no exterior, o que antes não era permitido. A nova norma não dá nenhum tratamento especial aos novos entrantes: os consultores estrangeiros deverão seguir as mesmas regras já impostas pela CVM aos consultores brasileiros.
Outro ponto interessante é que a Instrução 619 incluiu, para todos os consultores, a obrigação de seguirem as normas relativas ao cadastro dos investidores e à prevenção de lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo (PLDFT), tema abordado recentemente pela Instrução 617.
Nesse novo cenário, a Instrução 592 passa a vigorar com o seguinte texto: “A consultoria de valores mobiliários é atividade privativa de consultores de valores mobiliários registrados na CVM, no caso de consultores domiciliados no Brasil, ou por ela reconhecidos, no caso de consultores domiciliados no exterior”.
É importante destacar também a obrigatoriedade de reconhecimento do consultor de investimentos sediado no exterior pela CVM e a observância das regras editadas pela autarquia sobre suitability (Instrução 539/13) e prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo (Instrução 301/99).
Impactos da Instrução 619
A modernização cumpre seu objetivo principal: a internacionalização desse serviço. É necessário compreender o contexto no qual a Instrução 619 se insere, analisando-a em conjunto com a agenda da CVM para 2020, que propõe a inovação e a modernização do mercado brasileiro ratificando o alinhamento da CVM com as demais entidades e órgãos do Poder Executivo no que se refere a liberação e desburocratização dos mercados.
O impacto da nova instrução é relevante quando se considera o enorme crescimento recente da quantidade de investidores na bolsa de valores. Esse movimento amplia a demanda por consultores de investimento, abrindo espaço para o ingresso de consultores de outros países que cumpram os requisitos necessários.
A nova instrução baliza de forma correta a aplicação da regulamentação aos consultores de investimentos sediados no exterior que prestem serviços no País a investidores residentes. Elimina, assim, a barreira regulatória que os obrigava a ter sede ou domicílio no Brasil.
Ela está em linha com a adesão do País aos códigos de liberalização da OCDE, que incentivam a livre circulação de capitais, investimentos e serviços entre as fronteiras. E, como acontece com toda nova regulamentação, a prática vai mostrar a necessidade de ajustes e regras adicionais.
Outras possíveis readequações para a Instrução 619
Apesar de não acreditar ser este o momento certo para um ajuste, vale ressaltar as recentes polêmicas em torno das regras de conduta e prestação de informações, capítulos da Instrução 592 que deverão ser mais bem detalhados na hipótese de crescimento do volume de consultores estrangeiros no País.