BC estabelece critérios para contabilizar ativos sustentáveis

Instrução normativa se aplica a créditos de carbono e CBios

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A contabilização de ativos sustentáveis ainda é um desafio mundial por conta da diversidade de práticas adotadas e da falta de padronização. No setor financeiro, algumas regras começam a surgir para unificar a forma que os ativos e passivos entram na contabilidade. É o caso da regra que visa uniformizar os critérios de contabilização dos ativos ligados à sustentabilidade, como os créditos de carbono e os certificados de descarbonização (CBios), emitida pelo Banco Central no dia 21 de novembro. 

A Instrução normativa 325/22 (IN 325/22) dispõe que, se o crédito tiver sido comprado para revenda, terá que ser contabilizado pelo valor justo (de mercado). Se for para compensar as emissões de gases do efeito estufa da própria instituição financeira, deve ser contabilizado pelo valor justo ou o custo de aquisição, o que for menor. Essa prática é convergente ao que é adotado pelas empresas com relação aos créditos de carbono. 

“Existe uma grande necessidade de uniformização das regras contábeis relacionadas à sustentabilidade”, considera Ana Carolina Barbosa, advogada associada do Freitas Ferraz Advogados. Isso porque atualmente não há uma regra contábil específica sobre a forma de contabilização dos investimentos e obrigações em ativos sustentáveis – o que leva cada empresa a adotar a própria prática. 

Mas essa situação deverá mudar por conta do desenvolvimento dos mercados de carbono e as políticas de transição para uma economia de baixo carbono, que aumenta a necessidade de uniformização das regras de contabilização dos ativos e passivos. “Essas regras vão permitir que a sociedade acompanhe a evolução dos investimentos em sustentabilidade e a comparação das iniciativas e compromissos de cada empresa, por meio de suas demonstrações contábeis”, afirma a advogada.

Na entrevista abaixo, Barbosa explica a nova regra do Banco Central e aborda a contabilização de ativos ligados à sustentabilidade.  


O que a Instrução Normativa 325/22 do Banco Central dispõe sobre a contabilização de créditos de carbono e CBIOs?

Ana Carolina Barbosa: As instituições financeiras brasileiras estão avançando nos compromissos assumidos com a agenda ESG, o que levou o Banco Central a publicar a Instrução normativa nº. 325/22 (IN 325/22). O normativo apresenta diretrizes para contabilização dos ativos sustentáveis no plano de contas do Padrão Contábil das Instituições Reguladas pelo Banco Central (Cosif). Dentre eles estão os créditos de carbono, que por enquanto são decorrentes do mercado voluntário brasileiro, e os certificados de descarbonização (CBios), que são comercializados pelos produtores de biocombustível e etanol, no âmbito do Programa RenovaBio.

De acordo com a IN 325/22, a contabilização depende dos objetivos da instituição. Se for a negociação dos créditos de sustentabilidade e obtenção de lucro, os ativos devem ser contabilizados como ativos em estoque, pelo valor justo (valor de mercado), com o controle de variação de preço registrado no balanço da instituição e reflexos na demonstração de resultados.

Por outro lado, as instituições poderão adquirir tais ativos para compensação com as suas próprias emissões de gases de efeito estufa. Se esse for o caso, os créditos deverão ser contabilizados considerando o menor valor entre custo de aquisição e valor justo. Nessa opção, a instituição poderá amortizar contábil e fiscalmente os ativos intangíveis à medida da realização, ou seja, à medida que ocorre a compensação com as emissões.


A IN 325/22 impõe a necessidade de as instituições financeiras registrarem obrigações legais (ou não) que assumiram ao comprar ou vender ativos sustentáveis. O que isso significa? Será necessário fazer provisões relativas a essas obrigações?

Ana Carolina Barbosa: Caso a instituição assuma um compromisso de descarbonização ou redução de emissões ou se for instituído o mercado de carbono regulado, com obrigação de redução de emissões para o setor financeiro, será necessária a realização de provisão para contingências.


Por que é importante padronizar a forma de contabilização dos créditos de carbono e CBIOs? O que se espera com essa medida?

Ana Carolina Barbosa: Existe uma grande necessidade de uniformização das regras contábeis relacionadas à sustentabilidade. No ano passado, a fundação IFRS (International Financial Reporting Standards) criou o International Sustainability Standards Board (IISB) – órgão equivalente ao International Accounting Standards Board (IASB) – que terá o objetivo de buscar parâmetros para a contabilização dos ativos de sustentabilidade. Em 2004, foi expedida uma norma contábil para os créditos de carbono IFRIC 3 (emission rights), mas essa norma contábil foi revogada em 2005. Portanto, atualmente não há uma regra contábil específica sobre a forma de contabilização dos investimentos e obrigações em ativos sustentáveis, ou seja, as empresas hoje constroem a sua política contábil a partir de suas realidades e objetivos.

Com a instituição de novos mercados de carbono regulados, o fortalecimento do mercado voluntário de carbono e outros ativos sustentáveis e, principalmente, com o aumento da adesão das empresas a políticas de transição para uma economia de baixo carbono, aumenta a necessidade de uniformização das regras de contabilização dos ativos e passivos relacionados. Essas regras vão permitir que a sociedade acompanhe a evolução dos investimentos em sustentabilidade e a comparação das iniciativas e compromissos de cada empresa, por meio de suas demonstrações contábeis.


Com relação às empresas que adquirem créditos de carbono e CBIOs, quais são as formas de contabilização? Elas diferem da forma de contabilização agora estipulada pelo BC para as instituições financeiras ou as duas são convergentes? 

Ana Carolina Barbosa: Se a empresa é uma trader, ou seja, se a atividade dela for a compra e venda dos créditos de carbono (ou de sustentabilidade), pode enquadrar os referidos créditos como estoque (ativos circulantes). A forma de controle contábil dos estoques está no CPC 16 e coincide com a forma descrita pela Instrução Normativa.

Entretanto, também é possível classificar os créditos como ativo intangível (ativo não circulante). Quando eles não forem adquiridos para fins de revenda no curso normal dos negócios, esses ativos podem ser negociados, mas não faz parte da rotina empresarial a venda dos créditos.

Existe ainda a possibilidade de se considerar os créditos de carbono como ativos financeiros, como classificou o Decreto nº. 11.075/2022. Essa categoria é a mais questionável, porque para ser considerado um instrumento financeiro, é fundamental que exista uma contraparte negocial, o que não se vê com os créditos de carbono.

Portanto, nas possibilidades de se classificar contabilmente os créditos de carbono, o que se vê é uma convergência da IN 325/22 com a prática adotada pelas empresas em geral.

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