A relevância de políticas de compliance em SPEs imobiliárias
Inspirada na legislação adotada anos atrás por outros países, como o Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), dos Estados Unidos, o Bribery Act, do Reino Unido, e seguindo as diretrizes da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) entrou em vigor em 29 de janeiro de 2014 a Lei Anticorrupção brasileira (Lei nº 12.846, de 1 de agosto de 2013). Ela trata da responsabilidade administrativa e civil de empresas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira.
Além desses principais diplomas legais, outros não menos importantes também versam sobre o tema de corrupção e de atos lesivos à administração pública, quais sejam: a Lei de Lavagem de Capitais; a Lei de Improbidade Administrativa; a Lei de Licitações; o Código Penal; normas emitidas pela CGU, sobretudo a Portaria CGU 910/2015; e tratados e convenções internacionais introduzidos em nosso ordenamento por meio de decretos legislativos.
A Lei Anticorrupção brasileira e sua regulamentação (Decreto nº 8.420, de 15 de março de 2015), além de tratarem das responsabilidades e penalidades aplicáveis a eventuais atividades de corrupção por empresas, detalham os mecanismos de integridade que devem ser adotados referentes à adoção de uma política de compliance.
Na mesma toada, os estados brasileiros também vêm se preparando, por meio de sua legislação local, para a adoção de regras ligadas a compliance direcionadas a empresas que contratem com a administração pública. Os estados com legislação editada são: Rio de Janeiro, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Amazonas, Paraná e Mato Grosso do Sul. Os que estão em fase de tramitação de projetos de lei são: Minas Gerais, Alagoas, Maranhão, Pernambuco, Rio Grande do Norte, São Paulo e Tocantins.
Sanções da Lei Anticorrupção
Essa tendência não será passageira, dado o fato de que situações antiéticas surgem a todo instante e em todos os níveis hierárquicos e, assim, o avanço nas regras e consequentemente a aplicação de sanções previstas nas mesmas se tornam imediata realidade.
No âmbito administrativo, as sanções podem se dar por: multas, cujos valores serão variáveis entre 0,1% a 20% do faturamento bruto da pessoa jurídica no último exercício (caso não seja possível utilizar esse critério, a multa será de 6 mil reais a 60 milhões de reais); e publicação extraordinária da decisão condenatória, o que pode implicar danos à imagem da empresa.
Já no âmbito judicial podem alcançar: perda de tudo aquilo que fora obtido por meio da prática delituosa; suspensão ou interdição parcial das atividades da empresa; dissolução compulsória da pessoa jurídica; proibição de receber benefícios do governo, tais quais subsídios, doações, empréstimos, dentre outros.
Programa anticorrupção nas SPEs
Sociedades de Propósito Específico (SPEs) são tipicamente utilizadas no mercado imobiliário como veículos que por vezes sequer mantém funcionários e, como tais, a associação de SPE imobiliárias com a obrigatoriedade de cumprimento de normas de conduta e criação de práticas anticorrupção não é necessariamente imediata, mas é importante atentar preventivamente para o cenário que se impõe no Brasil e no mundo.
SPEs são empresas como todas as outras, também sujeitas às mesmas regras. Daí a atenção e necessidade de criação de um programa de compliance e integridade adequado à atividade da empresa, com políticas que podem incluir: código de conduta e ética profissional; política de novos negócios; política ambiental; política de doações políticas; norma de patrocínio cultural; norma de compras e pagamentos; norma de presentes e representações.
O relacionamento recorrente das SPE imobiliárias com autoridades de todas as esferas do Poder Público inspira cuidados especiais com o compliance e as medidas anticorrupção
Não há dúvida que a nova realidade exige que as empresas passem a observar de forma cuidadosa os riscos de suborno e corrupção inerentes aos seus negócios, não sendo tarefa fácil ou simplório a elaboração de programas antissuborno e anticorrupção, posto que tais merecem ser devidamente customizados para cada empresa.
Programas antissuborno e anticorrupção são especialmente importantes para as SPEs no que se refere à verificação de aspectos relativos às diferentes etapas de cada empreendimento imobiliário, seu relacionamento com a mais variada gama de autoridades e esferas de governo, bem como os poderes e direitos inerentes à participação societária de terceiros nas SPEs imobiliárias.
Embora não resolvam por si só a situação, a adoção dessas normas indica que a empresa está tomando as medidas cabíveis, dentro de padrões razoáveis e proporcionais, o que pode ser considerado uma redução da pena, caso venham a ser autuadas por práticas ilícitas, nos termos da Lei Anticorrupção brasileira.
Programa de integridade nas SPEs
O programa de integridade consiste na criação, no âmbito de cada SPE imobiliária, de um conjunto de mecanismos e procedimentos internos de conformidade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes praticados pela SPE imobiliária. Seu objetivo é detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira. Nesse contexto, é extremamente importante que o programa conte com o empenho da alta direção da empresa. O exemplo deve vir dos que estiverem no comando, evidenciando o engajamento com o comportamento ético e íntegro.
A customização de programa de integridade é essencial e deve seguir aplicações de acordo com o foco de atuação da SPE imobiliária, contemplando a atribuição de reponsabilidades e controles para as diferentes fases de atuação da SPE imobiliária no respectivo empreendimento, o qual poderá ser estruturado, de diversas formas.
Requer-se muita disciplina para, constantemente, comportar-se em conformidade com os padrões éticos e de integridade em voga estabelecidos. Assim é de extrema relevância a promoção contínua da cultura ética e da integridade, também no mercado imobiliário, o qual tem demonstrado uma saudável preocupação com a adaptação das SPEs a tais regras e a consequente garantia de que as organizações imobiliárias estão alinhadas aos seus propósitos legais e de integridade.
*Colaborou Fábio Rasi