Transação tributária começa a dar resultados
Regulamentado no ano passado, mecanismo busca acelerar a resolução de litígios
A transação tributária é um mecanismo de regularização fiscal recente, mas que já começa a dar resultados. Ela propõe que devedores e credores façam concessões mútuas para resolver litígios envolvendo dívidas tributárias. Prevista no Código Tributário Nacional desde 1966, a transação tributária foi regulamentada somente no ano passado, com a promulgação da Lei 13.988/20.
“Apesar de ser recente, a transação tributária já tem se mostrado uma alternativa de sucesso para reduzir o contencioso administrativo e judicial, além de estimular uma relação mais amigável entre fisco e contribuinte. Métodos extrajudiciais alternativos de resolução de litígios são uma tendência, e devem ser incentivados”, ressalta Sávio Hubaide, advogado associado do Freitas Ferraz Capuruço Braichi Riccio Advogados.
Ele considera que o mecanismo pode ser positivo para ambas as partes: para o credor (o fisco), pela chance de receber créditos sobre os quais tinha pouca expectativa, e para os contribuintes, pela possibilidade de negociar os valores a pagar. Dessa forma, a transação tributária torna-se uma forma eficaz de se evitar litígios que demorariam anos para serem resolvidos na Justiça.
Hubaide explica ainda que o mecanismo pode ser implementado tanto com base em critérios gerais — que consideram o valor dos créditos ou discussões jurídicas específicas pendentes de definição jurisprudencial —, quanto em critérios individuais, que levam em conta a capacidade financeira de cada contribuinte. Um exemplo bem-sucedido do primeiro caso é a transação tributária que discute a contribuição previdenciária referente a planos de participação nos lucros e resultados (PLR) e que já conta com 75 adesões, conforme noticiado pelo Valor Econômico.
Mas há vários aspectos que os contribuintes devem avaliar antes de aderirem à transação tributária. Na entrevista a seguir, Hubaide elenca alguns deles e explica o funcionamento do mecanismo.
No que consiste a transação tributária e como ela funciona?
Sávio Hubaide: A transação tributária é uma modalidade consensual de extinção dos créditos tributários, por meio da qual o credor (Fisco) e o potencial devedor (contribuinte) negociam e realizam concessões mútuas para a celebração de um acordo que visa o encerramento de litígios.
Diferentemente dos parcelamentos, a transação não é disponibilizada somente na forma de “contrato de adesão” aos contribuintes, podendo ser implementada tanto com base em critérios gerais — que consideram o valor dos créditos ou discussões jurídicas específicas pendentes de definição jurisprudencial (a exemplo da participação nos lucros e resultados, a PLR) —, quanto em critérios individuais, propondo-se a analisar a especificidade dos contribuintes, com foco na capacidade contributiva e na justiça fiscal.
Nesse último caso, tem-se a transação excepcional divulgada em 2020, em que a Fazenda Nacional avaliava individualmente a capacidade de pagamento dos contribuintes e classificava cada caso de acordo com a previsão de recuperação dos créditos, ponderando os impactos econômicos da pandemia na geração de resultados.
De que forma os contribuintes e os governos podem utilizar a transação tributária e se beneficiar dela?
Sávio Hubaide: Como a administração pública não pode renunciar ao crédito tributário, considerando o interesse público na arrecadação, o Fisco pode se utilizar da transação tão somente nos limites previstos e autorizados em lei.
O instituto foi desenhado para beneficiar tanto o Fisco quanto os contribuintes, haja vista que, na maioria das vezes, não é do interesse de nenhuma das partes submeter vultosos créditos tributários a processos que tramitarão por anos, sobretudo num contexto de crise econômica.
Para o Fisco, a transação surge como alternativa para viabilizar o recebimento de créditos de baixa expectativa e realização, podendo receber ao menos parte dos valores dos contribuintes que não possuem condições de pagamento integral. Para os contribuintes, trata-se de importante medida, inclusive, para manter sua regularidade fiscal. Além disso, abre-se a possibilidade de negociação da forma de pagamento, quantidade de parcelas e oferecimento de garantias.
Nesse sentido, a transação assume importante função, beneficiando credor e devedor, tendo em vista que, usualmente, enquanto a Fazenda concede descontos nos juros e em determinadas multas, os contribuintes confessam a existência dos débitos e desistem de defesas apresentadas em processos administrativos e judiciais que versam sobre os débitos transacionados.
Quais são os aspectos que os contribuintes devem avaliar antes de aderir a essa modalidade de transação?
Sávio Hubaide: Os contribuintes devem avaliar, primeiramente, se os atos infralegais editados pela Fazenda Nacional não ultrapassam os limites previstos na Lei 13.988/20, que regulamentou o instituto. Devem se atentar a todos os requisitos e garantias exigidos para adesão, às condições e formas de pagamento ofertadas, considerando que, nos termos da lei, uma vez deferida, a transação constitui confissão irrevogável e irretratável que, caso descumprida, ensejará a cobrança integral dos créditos sem os descontos. Na modalidade de transação por adesão no contencioso de relevante controvérsia jurídica, o contribuinte deve conjugar a avaliação jurídica a respeito do prognóstico de aceitação da tese pelo Judiciário com a análise econômico-financeira relacionada ao custo-benefício de abdicar da discussão para aproveitar os descontos concedidos.
Já é possível avaliar os resultados dessa modalidade de acordo? Na sua opinião, ele vem sendo utilizado em todo o seu potencial?
Sávio Hubaide: Embora a transação estivesse prevista no Código Tributário Nacional desde 1966, o instituto pendia de regulamentação, o que veio a ocorrer somente com a Lei 13.988, de 14 de abril de 2020. Apesar de ser recente, ela já tem se mostrado uma alternativa de sucesso para reduzir o contencioso administrativo e judicial, além de estimular uma relação mais amigável entre Fisco e contribuinte. Métodos extrajudiciais alternativos de resolução de litígios são uma tendência, e devem ser incentivados.
No entanto, justamente por se tratar de instituto ainda recente, como dito, é natural que não esteja sendo utilizado em todo o seu potencial. A transação pode e provavelmente será cada vez mais aprimorada, estendida para outras teses jurídicas relevantes e, sobretudo nos casos de transações individuais, as experiências recentes podem auxiliar a elaboração de editais futuros, com a divulgação de critérios cada vez mais eficientes e transparentes aos contribuintes.
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