Seria o voto plural uma alternativa para o Brasil?

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O universo dos investimentos se populariza dia após dia. Grandes corretoras, assessores, aplicativos de compra e venda de ações, dentre diversos outros mecanismos que faziam parte de um universo distante, hoje estão bastante conectados às pessoas.

Como desdobramento tem-se, por exemplo, o número recorde recente de entrantes no mercado de capitais brasileiro e, por outro lado, diversas companhias estudando a possibilidade de captação de recursos. Uma delas, naturalmente, é a chamada “abertura de capital”, o IPO, realizado por meio de oferta pública de ações.

Interesse em retornos

Há, com o amadurecimento do mercado, um razoável número de entrantes, os quais estão principalmente voltados ao aspecto financeiro de seus investimentos. Ou seja, se há perspectiva de retorno ou não. Nesse aspecto, tais investidores não estão exatamente interessados nas deliberações da companhia, em participação de reuniões, na eleição de diretores e conselheiros, dentre outros.

Em suma, o que se verifica é o afastamento de protagonismo ou interesse quanto ao direito de voto. Seguindo o raciocínio, é de ciência do mercado a figura das ações preferenciais, as quais implicam a restrição ao direito de voto e podem representar até 50% do capital da companhia.

Desse modo, seria possível, em uma lógica de capital não pulverizado e com um cenário de emissão de 50% de ações preferenciais, que a companhia tivesse um controlador definido detendo 25% mais uma ação do capital social total.

Lógica “25% mais 1”

Em que pese o montante representar um controle mais “barato” comparativamente à sociedade limitada, por exemplo, que vincula às deliberações mais relevantes da vida da sociedade o quórum de 75%, o montante de 25% mais 1, em grandes escalas, pode representar a perda de capacidade de investimentos.

Ou seja, com as novas perspectivas de captação, tomadas com base no cenário crescente do mercado de ações, a lógica de 25% mais 1 pode não ser suficiente — ou, ainda, ser pouco atrativa para abertura de capital de potenciais grandes empresas.

Adoção do voto plural

Uma das soluções vislumbradas nesse aspecto seria justamente a adoção do voto plural, largamente já presente, por exemplo, nos Estados Unidos.

No voto plural, em resumo, não há a trava da premissa “uma ação, um voto”, de modo que é possível que haja uma classe especial de ações, a qual deterá um peso na maior nas deliberações da companhia. Portanto, seria possível atribuir mais de um voto a uma só ação.

Com isso, um determinado grupo detentor dessa classe especial de ações deteria o controle da companhia sem precisar ter mais da metade das ações com direito a voto.

Competição externa

A abertura de capital recente da XP, nos Estados Unidos, reaqueceu a discussão sobre o tema no Brasil, justamente em razão de a XP ter adotado o voto plural para manter o controle da companhia, diante de eventual pulverização. A falta da prerrogativa na lei societária brasileira teria afastado o IPO da XP do Brasil?

A justificativa dada pela empresa é de que não foi esse o elemento motivador, mas, por ter adotado a estrutura, a dúvida restará presente. O Brasil, mantendo o padrão “uma ação um voto” perderá novas ofertas públicas para o mercado estrangeiro?

Corroborando a necessidade do mecanismo, viu-se em passado recente a estrutura jurídica de companhias aéreas com a utilização da denominada “ação superpreferencial”, justamente buscando o mesmo efeito prático: controle a um menor custo.

Fato é que já há em mercados menos maduros que os Estados Unidos a adoção do voto plural, como em Singapura, por exemplo. De todo modo, é importante lembrar que o mecanismo pode ser acompanhado por ferramentas de controle e limitação, a sunset clause.

Assim, as restrições ao voto plural podem ser, por exemplo:

— a limitação do número de ações e peso do voto das ações de classe especial emitidas, proporcionalmente às ações comuns, como por exemplo 1/10;

— o tempo de duração da prerrogativa do voto plural;

— a impossibilidade de manutenção do direito de voto plural em caso de transferência de ações.

Cenário favorável para o voto plural

O mercado brasileiro, por ter várias companhias com controlador definido e, contando com essa situação aceita pelos investidores, pode apresentar cenário bastante favorável ao voto plural.

Naturalmente, é necessário que mecanismos mais rígidos de controle e compliance sejam adotados pelas sociedades que optam pela estrutura. Contudo, sendo aceita pelo mercado investidor e representando atratividade para as companhias, não há motivo para negar a inovação jurídica.


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