Saneamento desperta interesse do setor privado
Novo marco legal do completa quatro anos e sua avaliação é positiva
Passados quatro anos do início da vigência do novo Marco Legal do Saneamento (Lei 14.026/20), a iniciativa privada vem demonstrando interesse em estudar a participação nos próximos leilões e concessões dos serviços de abastecimento de água e coleta e tratamento de esgoto.
“A perspectiva é de realização de mais de 40 leilões nos próximos anos, sendo a maior parte ainda em fase de estudos técnicos, com previsão de investimentos de mais de R$ 120 bilhões. Esses leilões ocorrerão em sua maior parte nas regiões Norte e Nordeste, que são justamente aquelas com menores índices de acesso da população à água potável e ao saneamento básico, sendo o edital mais recente referente ao serviço de esgotamento sanitário e distribuição de água para 74 municípios do Estado de Sergipe”, afirmam Claudio Pieruccetti e Larissa Damasceno, sócio e associada do Vieira Rezende Advogados.
A participação do setor privado será necessária porque ainda faltam muitos investimentos para que sejam atingidas as metas de universalização previstas pelo marco: estender o abastecimento de água potável a 99% da população brasileira e da coleta e tratamento de esgoto a 90% da população até o ano de 2033.
Embora o tempo de vigência do Marco Legal do Saneamento ainda seja curto para se fazer uma análise aprofundada da legislação, Pieruccetti e Damasceno dizem que até o momento o saldo é positivo em razão dos investimentos já realizados no setor, que até 2022 já ultrapassavam a marca de R$ 100 bilhões. “Esses investimentos resultaram em um avanço, ainda tímido, na cobertura nacional de abastecimento de água e de coleta e tratamento de esgoto, que segundo dados da ANA já atingem 84% e 55% da população, respectivamente.”
Na entrevista abaixo, Pieruccetti e Damasceno avaliam o novo marco legal e sua importância para as questões ESG.
O Marco Legal do Saneamento está completando quatro anos. No que consiste esse marco? Quais são os pontos mais relevantes em relação à legislação anterior?
Claudio Pieruccetti e Larissa Damasceno: O novo Marco Legal do Saneamento consistiu na atualização da Lei nº 11.445/07 pela Lei nº 14.026/20 e tem como suas principais diretrizes a universalização do acesso aos serviços de saneamento e abastecimento de água potável, a uniformização da regulação do setor e o estímulo aos investimentos no setor, permitindo maior participação da iniciativa privada.
Dentre as alterações mais relevantes quando comparado com as antigas previsões contidas na Lei nº 11.445/07 e nas demais normas alteradas pela Lei nº 14.026/20 pode-se destacar:
- a previsão de metas de universalização até 2033 (prevendo que, até esse marco, 99% da população tenha acesso à água potável e 90% tenha acesso ao tratamento e coleta de esgoto)
- a criação da Agência Nacional de águas e Saneamento Básico (ANA), responsável por uniformizar a regulação do setor,
- a previsão de que os contratos de prestação de serviço de saneamento sejam precedidos de licitação, estabelecendo que os contratos-programa que se encontravam em vigor deveriam ser atualizados aos parâmetros estabelecidos na nova lei e,
- o incentivo à formação de blocos municipais para prestação de serviços de saneamento de forma regionalizada.
Já seria possível fazer um balanço do sucesso (ou não) desse marco legal? Qual seria esse saldo, na sua opinião?
Claudio Pieruccetti e Larissa Damasceno: Ainda é difícil estabelecer uma posição definitiva sobre o sucesso desse marco legal, considerando a necessidade de realização de estudos extensos e investimentos vultosos para a implementação das medidas previstas, e ainda levando em conta que o período de quatro anos, desde que a legislação entrou em vigor, não pode ser considerado um longo decurso de tempo.
Até o momento, pode-se dizer que o saldo é positivo em razão dos investimentos já realizados no setor, que até 2022 já ultrapassavam a marca de R$ 100 bilhões. Esses investimentos resultaram em um avanço, ainda tímido, na cobertura nacional de abastecimento de água e de coleta e tratamento de esgoto, que segundo dados da ANA já atingem 84% e 55% da população, respectivamente.
Parte desses investimentos se devem aos bem-sucedidos leilões da Cedae, no Rio de Janeiro, da Sabesp, em São Paulo, e de 61 municípios do Estado de Alagoas, que tiveram diversas ofertas e arrecadaram um valor expressivo.
Contudo, as diferenças regionais, em especial no que diz respeito às áreas distantes dos grandes centros e às regiões Norte e Nordeste, ainda são um ponto que carece de maior atenção para que a meta de universalização possa ser atingida. E isso principalmente quando se considera que levantamentos recentes estimam a necessidade de investimentos de mais de R$ 500 bilhões para que a meta seja atingida.
Qual é a perspectiva para novos leilões de concessão para o fornecimento de serviços de água e esgoto? Há interesse do setor privado?
Claudio Pieruccetti e Larissa Damasceno: A perspectiva é de realização de mais de 40 leilões nos próximos anos, sendo a maior parte ainda em fase de estudos técnicos, com previsão de investimentos de mais de R$ 120 bilhões. Esses leilões ocorrerão em sua maior parte nas regiões Norte e Nordeste, que são justamente aquelas com menores índices de acesso da população à água potável e ao saneamento básico, sendo o edital mais recente referente ao serviço de esgotamento sanitário e distribuição de água para 74 municípios do Estado de Sergipe.
Diante da previsão de investimentos diversos na área e da possibilidade de expansão nos locais que atualmente não atendem a maior parte da população, o setor privado tem mostrado cada vez mais interesse em analisar os estudos desenvolvidos para que possa participar dos leilões.
Qual a relevância desse marco para o posicionamento do Brasil em termos ambientais e sociais, pensando na agenda ESG?
Claudio Pieruccetti e Larissa Damasceno: O marco legal atende de forma direta a agenda ESG e mostra a preocupação do Brasil e seu avanço com relação a essa pauta.
A previsão de uma meta de universalização atende a dois pontos – ambiental e social – da agenda ao permitir uma redução do impacto ambiental com o tratamento correto dos efluentes e distribuição de água potável à população. Esses mesmos pontos permitirão uma redução dos índices de diversas doenças transmissíveis em razão do contato da população com esgoto sem tratamento ou ingestão de água que não é potável. Mas atinge também um terceiro ponto, que decorre da significativa melhoria na governança por meio da criação da ANA para centralizar a regulamentação do setor.