Novas regras da CVM pavimentam caminho para competição entre bolsas

Autarquia moderniza ambiente de negociação de ativos no Brasil, mas deixa ponto crucial para aumento da concorrência de fora

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Duas normas editadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) na semana passada estabelecem mudanças no ambiente de negociação de ativos no Brasil, pavimentando o caminho para uma possível quebra de monopólio da B3. Enquanto a Resolução 134/22 versa sobre melhor execução de ordens, a Resolução 135/22 — que substitui a Instrução 461 — trata sobre o funcionamento e as responsabilidades das bolsas e dos mercados de balcão. As regras entram em vigor, respectivamente, em 2 de janeiro de 2023 e 1o de setembro de 2022.

Embora o novo arcabouço traga inovações importantes, como a possibilidade de que grandes lotes de ações sejam negociados em segmentos específicos ou no mercado de balcão — algo que, hoje, só acontece por meio de leilões —, um ponto considerado crucial para o fomento da concorrência não foi contemplado: a internalização de ordens. A prática permitiria a negociação e liquidação de ações pelas corretoras, dispensando a necessidade de que essas transações sejam processadas por uma bolsa. Segundo a CVM, possíveis regras sobre o assunto serão discutidas a partir de estudos complementares, uma vez que o tema exige análise de pontos como enxugamento de liquidez, impacto na formação de preços e transparência dos negócios. Outro aspecto que autarquia ainda precisa definir diz respeito aos parâmetros para a negociação de grandes lotes. 

“As mudanças promovidas pela CVM deixam muito claro que a integridade do mercado é prioridade para o regulador”, afirmou Rogério Santana, diretor de relacionamento com clientes da B3, durante encontro com investidores promovido na segunda-feira, 13. Segundo ele, as novas regras mantêm requerimentos relacionados a controles internos, gerenciamento de riscos, infraestrutura de tecnologia da informação e segurança cibernética para quem quiser operar no Brasil. 

Em linha com o defendido pela B3, a CVM também desistiu da ideia, apresentada em audiência pública, de adoção de um modelo autorregulatório unificado, no qual apenas uma entidade supervisionaria as bolsas e os mercados de balcão. De acordo com a Resolução 135, cada bolsa ou mercado deve implementar sua própria autorregulação ou, se preferir, contratar um terceiro para a realização dessa tarefa. 

No que diz respeito à estrutura de capital das bolsas, a autarquia manteve dois limites já previstos em regulação: intermediários podem deter participação de, no máximo, 10% nessas entidades e investidores estratégicos, 15%. Caso esses últimos queiram ampliar sua fatia para além desse percentual, precisam obter aprovação da CVM, que irá analisar o projeto e a capacidade financeira de cada um.

Outra novidade — estabelecida pela Resolução 134 — envolve as regras para melhor execução de ordens (best execution), na situação em que existam múltiplas bolsas negociando o mesmo valor mobiliário no Brasil. A CVM manteve o modelo proposto na audiência pública, alinhado com o europeu, em que o dever de melhor execução recai sobre o intermediário, sendo dele a decisão sobre onde a ordem deve ser efetuada. Nas solicitações feitas por investidores de varejo, os intermediários devem garantir que o custo total da operação seja o menor possível.

Cabe ressaltar que, embora as resoluções tenham entrado em audiência pública em 2019, o tema de concorrência entre bolsas no Brasil vem sendo analisado pela CVM há pelo menos uma década. Nos anos de 2010, as bolsas americanas Bats Global Markets e Direct Edge chegaram a anunciar planos de concorrer com a B3 (na época, ainda chamada BM&FBovespa), mas acabaram não seguindo adiante com a ideia. Já a ATS pretendia montar uma clearing de ações no País, mas igualmente desistiu da iniciativa.

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