Greenwashing pode caracterizar publicidade enganosa e atuação fraudulenta

“Maquiagem” de práticas ESG pode induzir investidores e consumidores a erro

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Com o crescimento da importância dos critérios sociais, ambientais e de governança (ESG, na sigla em inglês), também aumentou a preocupação de que empresas possam divulgar informações que induzam investidores e/ou consumidores a erro. Até o momento, entretanto, pouco se fala sobre as implicações jurídicas do greenwashing, prática caracterizada pela propaganda de atitudes e ações que teoricamente beneficiam a sociedade e o meio ambiente, mas que não encontram respaldo na realidade.

“Do ponto de vista jurídico, o greenwashing pode caracterizar publicidade enganosa ou abusiva, prática vedada pelo Código de Defesa do Consumidor. Também pode ser visto como atuação fraudulenta, com o objetivo de induzir os investidores a erro”, explica Ana Barbosa, advogada do Freitas Ferraz Capuruço Braichi Riccio Advogados.

Segundo ela, já há, no Brasil, ação civil pública movida contra várias empresas que questiona a produção, comercialização e distribuição de plásticos oxidegradáveis como se fossem biodegradáveis. O greenwashing prejudica muito a tomada de decisões, pois impede que os investimentos cheguem para projetos e empresas que efetivamente estão adotando medidas sustentáveis”, afirma Barbosa.

A questão vem atraindo a atenção da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), cujo presidente, Marcelo Barbosa, afirmou ter colocado o tema como uma das prioridades da autarquia, conforme notícia publicada no jornal Valor Econômico. Uma das discussões para mitigar o greenwashing diz respeito à adoção de um padrão de divulgação de informações ESG pelas empresas. A seguir, Ana Barbosa trata de aspectos importantes relacionados ao greenwashing. 


É possível caracterizar o greenwashing do ponto de vista jurídico?

Ana Barbosa: A fala do presidente da CVM mostra como a adoção do desenvolvimento sustentável como objetivo maior da humanidade tem transformado a realidade dos atores econômicos globais: empresas, governos e sociedade. Nos últimos anos, ocorreu uma transformação no processo de legitimação das atividades empresariais e governamentais perante a sociedade. Não se espera mais que as empresas atuem apenas em conformidade com a legislação. Espera-se que a atividade empresarial assuma suas responsabilidades perante as partes interessadas (stakeholders), se responsabilize pelas externalidades negativas da sua atuação, e o faça de forma ética e transparente. O mesmo se espera da atuação dos governos na elaboração e implementação de políticas públicas. Da sociedade, por sua vez, espera-se cada vez mais envolvimento e participação, como também um consumo consciente e responsável.

O greenwashing é o termo que se dá para a adoção de estratégias de marketing enganosas, que visam divulgar atividades e projetos sustentáveis, ecologicamente e ambientalmente responsáveis, mas que não condizem com a realidade. Na verdade, numa investigação mais cuidadosa, vê-se que tais anúncios não passam de uma propaganda enganosa e servem para camuflar os impactos negativos efetivamente gerados por determinadas atividades ou produtos. Do ponto de vista jurídico, o greenwashing pode caracterizar publicidade enganosa ou publicidade abusiva, prática vedada pelo Código de Defesa do Consumidor. Também pode ser visto como atuação fraudulenta, para induzir investidores a erro.


Esse tipo de prática já é objeto de ações na Justiça, no Brasil e no mundo?

Ana Barbosa: Existem casos muito famosos de greenwashing no Brasil e no mundo, mas nem todos eles chegaram à Justiça. Um dos mais citados é o caso da campanha “People Do – That Sanctuary that was saved” da americana produtora de petróleo Chevron, ainda na década de 1980, que mostrava pessoas unidas para proteger a flora, fauna, florestas e oceanos. O comercial, que durava 30 segundos, custou à empresa 200 mil dólares, e o investimento da empresa em tais projetos não passou de 5 mil dólares.

No Brasil, o Instituto de Desenvolvimento Sustentável de Comunidades Humanizar – IDESC ajuizou Ação Civil Pública nº. 5033162-97.2020.4.04.7000, que tramita perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, contra várias empresas, questionando a produção, comercialização e distribuição de plásticos oxidegradáveis como se fossem biodegradáveis. Preocupadas com o impacto negativo da ação à imagem, as empresas pedem que a ação tramite em segredo de Justiça.


De que forma o greenwashing pode influenciar a tomada de decisões por parte dos investidores?

Ana Barbosa: O papel dos investidores na transição para uma economia de baixo carbono é fundamental. Investidores que gerenciam trilhões de dólares em ativos são signatários dos Princípios pelo Investimento Responsável (PRI), de acordo com dados de 2019 do órgão. Dentre os principais objetivos do PRI, estão o combate à emergência climática. As cartas do gestor de recursos Larry Fink (CEO da BlackRock) para os investidores também mostram como o mercado financeiro já compreendeu seu papel nesse processo. O greenwashing prejudica muito a tomada de decisões, pois impede que os investimentos cheguem para projetos e empresas que efetivamente estão adotando medidas sustentáveis.


Em sua opinião, a divulgação de informações ESG deveria ser padronizada? Em caso afirmativo, deveria ser objeto de regulação ou de autorregulação?

Ana Barbosa: A adoção de padrões para a elaboração de relatórios de sustentabilidade e de uma regulação que estabeleça a medição e divulgação de dados de emissões de gases do efeito estufa (GEE), ou de geração de créditos de carbono, é tão importante quanto as informações contábeis das empresas. Por isso, entendo que as informações ESG deveriam seguir standards padronizados e tais informações deveriam ser objeto de regulação. Os relatórios de sustentabilidade ou relatórios ESG não podem ser vistos apenas como um documento de marketing. Eles servem para legitimar a atuação das empresas e para informar os investidores e governos. Se o mercado não for pautado por ética, transparência e governança, não será possível alcançar as metas de descarbonização da economia.

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