Entendendo o acordo de acionistas e a vinculação de votos

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Dando continuidade à série de artigos sobre o instrumento do acordo de acionistas previsto no artigo 118 da Lei 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (Lei das S.As.), abordaremos os direitos políticos dos acionistas especificamente no que diz respeito à eleição de administradores e eventual vinculação de seus votos. 

Eleição de administradores 

Durante a negociação de acordos de acionistas, não é raro nos depararmos com a discussão sobre o número de cadeiras do conselho de administração que serão preenchidas por cada acionista e até mesmo como se dará a eleição da diretoria. É comum estipularem qual acionista indicará o diretor presidente, o diretor financeiro ou outro membro da diretoria relevante para a condução dos negócios. Além disso, em determinadas estruturas é possível identificar cláusulas que exijam que membros do conselho votem em determinadas matérias conforme instrução de voto determinada pelos acionistas em reunião prévia.

No que tange à eleição dos conselheiros de administração, a Lei das S.As prevê como regra geral a eleição por votação majoritária de todos os membros, havendo ainda a possibilidade de voto múltiplo e voto em separado para a eleição de membros por acionistas minoritários. Não obstante, é possível que os acionistas se comprometam, em acordo de acionistas, a eleger os membros do conselho de administração de forma diversa, garantindo, por exemplo, o direito a acionistas minoritários à eleição de conselheiros sem que haja necessidade de voto múltiplo ou em separado. Essa é uma solicitação comum em acordos de acionistas de empresas familiares, bem como de empresas com investimento de fundos.

Vinculação de votos de conselheiros por acionistas

Sobre a orientação de voto dos conselheiros por acionistas, inclusive no âmbito da eleição da diretoria, a Lei das S.As. prevê expressamente, desde 2001, a possibilidade de vinculação dos votos dos membros da administração: “o presidente da assembleia ou do órgão colegiado de deliberação da companhia não computará o voto proferido com infração de acordo de acionistas devidamente arquivado”. 

No entanto, o referido dispositivo societário tem sido motivo de polêmica desde que foi inserido na legislação. Argumenta-se que, ao vincular o voto dos administradores ao que foi pactuado em acordo de acionistas, estariam sendo colocadas em xeque a liberdade de voto e a independência dos administradores, além da obrigação de zelar pelos interesses da companhia.

Frente a essa problemática, há três correntes doutrinárias sobre o assunto:

  • favorável à vinculação de voto: o principal argumento é o de que o próprio acordo de acionistas é representativo do interesse social, em linha com o parágrafo 2º do artigo 118 da Lei das S.As., que prevê que não é possível invocar este instrumento para eximir o acionista de responsabilidade no exercício do direito de voto ou do poder de controle.
  • favorável à vinculação de voto: excetuadas determinadas situações (isto é, opondo-se à vinculação de forma indiscriminada), dentre as quais destacamos a ilegalidade e a infração ao interesse social.
  • contrária à vinculação de voto dos administradores, sob o argumento de que esta seria incompatível com as melhores práticas de governança corporativa.

Por fim, embora existam posições e argumentos firmes nas três correntes mencionadas acima, a vinculação de voto com limites é a predominante, apresentando variações quanto à extensão e definição de tais limites. Assim, considerando que os administradores estão sujeitos aos deveres impostos pela Lei das S.As., notadamente aos deveres de diligência e de lealdade, entendemos que, ao se depararem com eventual orientação de voto vinculante que possa ferir os melhores interesses da companhia, devem consignar seu voto em sentido contrário à orientação de voto, sob pena de responsabilização.


Colaboraram Gabriela Saad Krieck e Larissa de Assis Schiavinato, advogadas do Carneiro de Oliveira Advogados

 

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