Empresas têm chances de quitar dívidas em condições vantajosas

Participantes do Simples têm até o fim de março para aderir a programas de regularização de débitos

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Desde janeiro, os pequenos negócios e microempreendedores contam com condições mais favoráveis para extinguir suas dívidas com o governo. Microempresas (ME), microempreendedores individuais (MEI) e empresas de pequeno porte (EPP) que fazem parte do Simples Nacional têm até o fim de março para aderir ao Programa de Regularização do Simples Nacional (PRSN) e ao edital de Transação do Contencioso de Pequeno Valor do Simples Nacional. 

“Em comparação com as opções regulares de parcelamento de débitos, as condições são bastante favoráveis, já que contam com a facilitação do pagamento do valor de entrada, que usualmente é um complicador para essas empresas solucionarem suas pendências, além de parcelas mínimas mais acessíveis”, afirma o advogado Leonardo da Silva Pereira, associado do Vieira Rezende Advogados.

Ele espera que a adesão aos programas seja alta não só pelas condições vantajosas, mas também porque ela aumenta as chances de essas empresas se manterem no Simples – devido às dívidas tributárias, muitas delas correm o risco de se desenquadrarem e terem que adotar um regime fiscal mais oneroso. 

Ligia Merlo, associada do Freitas Ferraz Capuruço Braichi Riccio Advogados, considera que, embora os descontos e as vantagens oferecidas sejam importantes para a regularização de dívidas dessas empresas, a medida é pouco abrangente. Isso porque ela se limita aos débitos já inscritos em dívida ativa da União, não abarcando os débitos em cobrança administrativa e esses são muito relevantes, já que podem levar à exclusão do contribuinte do Simples Nacional. Por conta dessa restrição, Merlo acredita que ainda é cedo para dizer se esses programas podem contribuir para a sobrevivência dos pequenos negócios. 

Na entrevista abaixo, Pereira e Merlo explicam as diferenças entre os dois programas de regularização de débitos e os pontos que as empresas devem levar em consideração na hora de decidir pela adesão. 


O que são o Programa de Regularização do Simples Nacional e o edital de Transação do Contencioso de Pequeno Valor do Simples Nacional? A quem eles se destinam e quais são as condições de cada um?

Leonardo da Silva Pereira: São meios de regularização dos débitos inscritos na dívida ativa da União dos microempreendedores individuais (MEI), microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP), sendo o primeiro direcionado às empresas que buscam superar a crise econômico-financeira provocada pelos efeitos decorrentes da covid-19, e o segundo, direcionado às empresas com débitos de até 60 salários-mínimos.

No caso do Programa de Regularização do Simples Nacional (PRSN), os destinatários são os MEIs, as ME e as EPP que façam parte desse regime tributário, que tenham sofrido impactos econômico-financeiros decorrentes da covid na capacidade de geração de resultados, e que possuam débitos inscritos na dívida ativa da União até 31 de janeiro de 2022, mesmo que já se encontrem em fase de cobrança judicial ou sejam objeto de parcelamento rescindido, com exigibilidade suspensa ou não.

Considera-se impacto decorrente da pandemia qualquer redução da receita bruta mensal somada no período de março a dezembro de 2020, em comparação com igual intervalo do ano de 2019.

As condições desse programa são as seguintes: entrada de 1% do valor consolidado dos débitos transacionados, calculada sem descontos, podendo ser paga em até 8 parcelas. O restante poderá ser pago em até 137 parcelas mensais e sucessivas, com redução de até 100% dos juros, multas e encargos, até o limite de 70% do valor de cada dívida. A parcela mínima é de 25 reais para os MEI e de 100,00 reais para os demais. Os descontos são graduados conforme a capacidade de pagamento do contribuinte e sua situação econômica, considerando, inclusive, os impactos gerados pela pandemia.

No caso do edital de Transação do Contencioso de Pequeno Valor do Simples Nacional, os destinatários também são os MEIs, as ME e as EPP que façam parte deste regime tributário e que possuam débitos inscritos em dívida ativa da União, mas em valor não superior a 60 salários-mínimos (72.720,00 reais) por inscrição. As condições, nesse caso, são as seguintes: entrada de apenas 1% do valor devido, que poderá ser dividida em três parcelas, mas em se tratando de inscrições objeto de parcelamento atual ou anterior rescindido, o valor da entrada será de 2%. O restante pode ser parcelado em até 9, 27, 47 e 57 meses. Quanto mais curto o prazo para o pagamento, maior o desconto, que tem o percentual mínimo de 35% e máximo de 50%. Assim como no PRSN, a parcela mínima é de 100 reais para ME e EPP, e, para os MEI, 25 reais. O edital vale para as dívidas inscritas até 31 de dezembro de 2021.

Por fim, vale lembrar que as inscrições em dívida ativa em discussão judicial ou parcelamento em curso podem ser incluídas tanto no PRSN como na Transação do Contencioso de Pequeno Valor do Simples Nacional, mas devem atender às condições específicas previstas em cada um desses programas para tais débitos.

Ligia Merlo: O Programa de Regularização do Simples Nacional (PRSN) e o edital de Transação do Contencioso de Pequeno Valor do Simples Nacional, regulados, respectivamente, pela Portaria PGFN/ME 214/2022 e pelo Edital PGFN 1/2022 são medidas adotadas pelo governo federal para regularização de dívidas tributárias de empresas optantes pelo Simples Nacional e microempreendedores individuais (MEI). Em ambos os casos, é possível que os contribuintes realizem a adesão até o dia 31 de março de 2022. 

Em breve síntese, o PRSN prevê a possibilidade de adesão do contribuinte mediante entrada de 1% do valor total do débito, dividida em até oito meses, sendo o restante parcelado em até 137 meses, com desconto de até 100% dos juros, multas e encargos legais. A portaria estabelece ainda que o valor das parcelas, no caso de empresas do Simples Nacional, não pode ser inferior a 100 reais e, no caso de MEIs, a parcela mínima deverá ser de 25 reais.  

Além disso, são passíveis de transação os débitos inscritos em dívida ativa da União até 31 de janeiro de 2022, administrados pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Nesse caso, a portaria permite que, mesmo os débitos em fase de execução ajuizada ou objeto de parcelamento anterior rescindido podem ser objeto da transação.

 Já a Transação de Pequeno Valor do Simples Nacional possibilita ao microempreendedor individual e as empresas optantes pelo Simples Nacional pagarem débitos inscritos em dívida ativa da União com benefícios, tal como entrada reduzida e descontos sobre o valor total. Para tanto, é necessário que os débitos tenham sido inscritos em dívida ativa até 31 de dezembro de 2021, possuindo valor consolidado igual ou inferior a 60 salários-mínimos.

 No que diz respeito à entrada, o edital prevê como requisito que ela seja de 1% do valor do débito, sendo possível o pagamento em até três meses. No caso de débito que já tenha sido parcelado anteriormente, a entrada será excepcionalmente de 2%.  Além disso, do mesmo modo que o PRSN, o valor das parcelas, no caso de empresas do Simples Nacional, não pode ser inferior a 100 reais e, no caso de MEIs, 25 reais. Por fim, o pagamento do saldo restante pode ocorrer em até 57 meses, havendo uma redução no desconto sobre o valor total da dívida de acordo com o número de parcelas escolhidas. Ou seja, quanto maior o número de parcelas, menor o desconto concedido ao contribuinte.


As condições oferecidas pelo governo são vantajosas para as microempresas, empresas de pequeno porte e microempreendedores individuais?

Leonardo da Silva Pereira: Em comparação com as opções regulares de parcelamento dos débitos, as condições são bastante favoráveis, já que contam com a facilitação do pagamento do valor de entrada, que usualmente é um complicador para essas empresas solucionarem suas pendências, além de parcelas mínimas mais acessíveis. Outro ponto favorável é a redução de juros, multa e encargos, que podem chegar até 100%. Além disso, o programa oferece descontos em relação a créditos considerados como irrecuperáveis pela PGFN, alcançando devedores falidos ou em recuperação judicial.

Ligia Merlo: A Portaria PGFN/ME 214/2022, bem como o Edital PGFN 1/2022, foram alternativas encontradas pelo governo federal para amenizar o veto do presidente da República sobre um Refis que traria grandes oportunidades de negociação às ME e EPP.

Assim, a apresentação de um projeto como esse se deu diante da necessidade de viabilizar a superação econômica desse público, um dos setores mais afetados pela crise decorrente da pandemia do novo coronavírus.

Desse modo, embora os descontos e as vantagens oferecidas sejam importantes instrumentos para a regularização de dívidas de ME, EPP e MEI, a medida é pouco abrangente, uma vez que se limita aos débitos já inscritos em dívida ativa da União, sem abarcar também os débitos em cobrança administrativa. 

Os débitos ainda não inscritos em dívida ativa possuem grande relevância para as empresas optantes pelo Simples Nacional, pois podem levar o contribuinte a ser excluído do regime tributário.


Quais aspectos as empresas devem analisar para decidir se devem aderir aos programas?

Leonardo da Silva Pereira: Inicialmente a empresa optante pelo Simples Nacional deve consultar se possui débitos já encaminhados à PGFN e inscritos em dívida ativa até a data limite considerada para cada programa. Em segundo lugar, deve verificar se está enquadrada no conceito que a portaria traz de impacto em razão da pandemia e, conforme visto acima, considera-se qualificada nesses termos a empresa que tenha tido qualquer redução da receita bruta mensal somada no período de março a dezembro de 2020, em comparação com o mesmo intervalo de 2019. Um outro ponto relevante, caso as empresas estejam questionando as cobranças, é analisar as chances de êxito da discussão, já que a adesão ao programa requer a desistência de qualquer processo em trâmite.

Ligia Merlo: É imprescindível que os contribuintes abarcados pelo PRSN e pelo Edital de Transação do Contencioso de Pequeno Valor do Simples Nacional façam uma análise prévia para decidirem pela adesão aos programas. Em primeiro lugar, é preciso verificar se estão preenchidos todos os requisitos para adesão, bem como as condições e formas de pagamento. Sob esse último ponto, faz-se necessário verificar, ainda, se as parcelas em questão são passíveis de quitação pela empresa a ser beneficiada, de modo a evitar um acúmulo ainda maior de débitos.

Por fim, tendo em vista que a adesão à Transação do Contencioso de Pequeno Valor do Simples Nacional tem como requisito a renúncia de quaisquer alegações de direito às quais se fundem ações judiciais ou recursos, é preciso estudar a viabilidade de êxito de eventual discussão judicial ou administrativa sobre tais débitos.


Quais são as expectativas de adesão? O mecanismo deve ser relevante para garantir a sobrevivência dos pequenos negócios?

Leonardo da Silva Pereira: A expectativa é de alta adesão, já que as condições garantem a manutenção dessas empresas num regime tributário mais benéfico. Muitas dessas empresas, pelas dívidas que possuem, correm o risco de serem desenquadradas do Simples Nacional, o que obrigatoriamente as conduziria a um regime fiscal mais oneroso. Além disso, de acordo com informações do Ministério da Economia, cerca de 10% dos contribuintes inscritos em dívida ativa pelo Simples Nacional são MEI, o que torna a adesão ainda mais relevante, e as enquadra nas melhores condições de pagamento, com parcela mínima de 25 reais.

Ligia Merlo: Ainda é cedo para afirmar se os mencionados programas serão suficientes para garantir a sobrevivência desse público, afetado diretamente pela pandemia. Contudo, dados do governo federal indicam que atualmente existem cerca de 1,8 milhão contribuintes inscritos em dívida ativa por débitos do Simples Nacional. 

Apesar desse expressivo número e das condições estabelecidas pelos programas, conforme mencionado, por não abarcarem débitos ainda não inscritos em dívida ativa, eles acabam por restringir de forma significativa o número de contribuintes aptos a realizar a adesão. 

O que se pode afirmar, no entanto, é que a regularidade fiscal é requisito essencial para a sobrevivência de um negócio, especialmente quando se trata de micro e pequenas empresas. Desse modo, mecanismos como esses — especialmente sob condições ainda mais favoráveis — são imprescindíveis para garantir o desenvolvimento de microempresas, empresas de pequeno porte e microempreendedores individuais.

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