Norma sobre equity crowdfunding surpreende o mercado

Resolução 88/22 da CVM aumenta além do esperado o leque de empresas que podem captar recursos

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A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) foi além das expectativas do mercado e ampliou, mais do que se esperava, o leque de empresas que podem levantar recursos por meio de equity crowdfunding, modalidade de captação voltada a startups e negócios em estágios iniciais.  

Felipe Hanszmann e Caio Brandão, respectivamente, sócio e associado do Vieira Rezende Advogados, consideram que a Resolução 88/22, publicada em 27 de abril, veio em boa hora para ampliar o escopo de alternativas de financiamento disponíveis para empresas de menor porte. Além disso, trouxe inovações importantes. “Uma das principais foi a permissão para a criação de espécie de mercado secundário dos títulos ofertados, o que era vedado na antiga Instrução 588”, ressaltam os advogados. 

Além desse ponto, vários outros agradaram o mercado. Na minuta de resolução que foi à audiência pública, a CVM previa aumentar o limite máximo de captação por oferta de 5 milhões de reais para 10 milhões de reais, mas a nova norma estabeleceu o valor de 15 milhões de reais. Outra mudança que surpreendeu positivamente o mercado diz respeito às empresas que podem captar recursos por meio do equity crowdfunding – antes, apenas emissores com receita bruta anual de até 10 milhões de reais tinham essa oportunidade. Na minuta da norma, a autarquia sugeriu a elevação desse valor para até 30 milhões de reais, mas, no fim, a Resolução 88 previu um patamar ainda maior, de até 40 milhões de reais. 

Na entrevista abaixo, Hanszmann e Brandão abordam as novidades estabelecidas pela norma.


Em relação à minuta de norma submetida à audiência pública, a Resolução 88/22 trouxe importantes alterações?

Felipe Hanszmann e Caio Brandão: Com certeza. Dentre os principais pontos, destacamos os três a seguir:

  • Aumento da receita bruta máxima: um dos tópicos mais discutidos no âmbito da minuta de resolução submetida a audiência pública foi o aumento da receita bruta máxima da sociedade emissora e do seu grupo econômico, que impacta diretamente o universo de empresas aptas a captar recursos por meio dessa modalidade. A CVM havia proposto aumentar para 30 milhões de reais para a emissora e 60 milhões de reais para o grupo, porém, diante dos comentários recebidos, a autarquia foi além e majorou os limites para 40 milhões de reais, especificamente quanto à sociedade emissora, e 80 milhões de reais quanto ao respectivo grupo econômico.
  • Flexibilização da exigência de contratação de escriturador: a CVM havia proposto a exigência de contratação, pelo emissor, de escriturador desde o momento da oferta até o prazo de duração do título, permitindo, em paralelo, que tal serviço pudesse ser prestado por instituição não-financeira a fim de aumentar a competição no mercado. Entretanto, diante dos custos envolvidos para tal contratação, optou por flexibilizá-la para os emissores que tenham realizado ofertas públicas em apenas uma plataforma, desde que a própria plataforma preste os serviços de controle de titularidade e de participação societária.
  • Aumento do montante máximo de captação: a Resolução 88/22 aumentou o montante máximo de captação em cada oferta para 15 milhões de reais. O valor é 50% superior ao que havia sido proposto inicialmente na audiência pública.

O que muda com relação às plataformas de equity crowdfunding? A nova norma deve ter impacto significativo sobre esses participantes do mercado?

Felipe Hanszmann e Caio Brandão: Diante da preocupação da CVM com a eventual falta de estrutura compatível com o exercício de uma atividade regulada, a Resolução 88 aumentou o valor do capital social mínimo para que as plataformas pleiteiem o seu registro, passando de 100 mil reais para 200 mil reais.

Outra alteração relevante foi a exigência de contratação de um profissional voltado para a atividade de controles internos a partir do momento em que o somatório das captações realizadas pela plataforma atingir 30 milhões de reais em um mesmo exercício social.

Por fim, a Resolução 88 também expandiu a possibilidade de divulgação da oferta, permitindo a sua promoção de forma ampla, inclusive mediante a utilização de material publicitário, em quaisquer veículos de comunicação e mídias sociais, desde que observados os limites dispostos na norma. Essa alteração era um pleito antigo das plataformas, uma vez que aumenta as chances de atingirem um maior número de investidores.


De que forma a Resolução 88/22 mexe com a transação no mercado secundário das ações adquiridas pelos investidores via equity crowdfunding? Esses papéis podem ter aumento de liquidez?

Felipe Hanszmann e Caio Brandão: Uma das maiores inovações da Resolução 88 foi a permissão para a criação de espécie de mercado secundário dos títulos ofertados, o que era vedado na antiga Instrução 588. O formato do mercado secundário adotado na Resolução 88 é mais permissivo que o proposto no âmbito da audiência pública, pois outorga à sociedade emissora a opção de autorizar a intermediação dos seus valores mobiliários pela plataforma (sistema opt in), de forma que os chamados “investidores ativos” tenham acesso ao conjunto informacional da emissora, mitigando-se, assim, o risco de assimetria informacional. 

Essa inovação está diretamente ligada à criação de liquidez dos títulos, uma vez que facilita que os papéis adquiridos no âmbito de uma oferta sejam transacionados pelos investidores.


Em linhas gerais, qual é a sua avaliação sobre a Resolução CVM 88/22 e o impacto que ela pode ter sobre o equity crowdfunding?

Felipe Hanszmann e Caio Brandão: O equity crowdfunding é uma importante ferramenta de captação pública de recursos por empresas de pequeno porte (startups), que pode, de fato, fomentar o aumento da inovação ao preencher a lacuna existente no mercado de capitais brasileiro, que tradicionalmente exige um volume de oferta e liquidez muito mais alto, deixando de fora opções que contemplem startups em estágio inicial (early stage). Diante disso, ao atender antigas demandas do mercado (incluindo mercado secundário e aumento dos limites de captação), a Resolução 88 vem em boa hora para ampliar o escopo de alternativas de financiamento disponíveis para empresas menores.

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