CVM aumenta multas para participantes do mercado
Atraso na prestação de informações passa a ser punido com valores mais elevados; coordenadores de ofertas são incluídos
A prestação de informações de forma tempestiva e completa é fundamental para o bom funcionamento do mercado de capitais – atenta a isso, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) recentemente editou uma norma que visa reforçar o cumprimento dessa obrigação. A Resolução CVM 207/24, que entrou em vigor no último dia 2 de setembro, aumentou as multas cominatórias, que incidem sobre aqueles que não entregam informações periódicas ou eventuais ou, ainda, que descumprem ordens emitidas pela própria autarquia. Atualmente, o valor das multas é considerado muito baixo para coibir o atraso da entrega de informações.
A mudança foi bem-recebida pelos advogados que atuam no mercado de capitais. “As alterações propostas pela Resolução CVM 207/24 vêm em boa hora e representam um passo importante para harmonizar e fortalecer a disciplina no mercado de capitais. Ao estender as multas cominatórias tanto para companhias abertas quanto para intermediários de ofertas públicas e agentes relacionados a fundos de investimento, a CVM cria um ambiente regulatório mais uniforme, no qual os participantes estão sujeitos a regras e sanções semelhantes”, avaliam Ricardo Mafra, Beatriz Camões e Caio Brandão, sócio e associados do Vieira Rezende Advogados.
Essa também é a opinião de Gabriela Saad Krieck e Ana Carolina Haddad Anselmo Rodrigues, sócia e associada do Carneiro de Oliveira Advogados, que ponderam que a nova norma contribui para aumentar a transparência e a pontualidade nas informações, o que tem impactos positivos na confiança dos investidores e na integridade do mercado.
Mas elas lembram que não é apenas o valor da multa que conta, e sim também a efetividade da fiscalização da CVM, essencial para coibir atrasos e descumprimentos na prestação de informações. “As alterações relativas às multas cominatórias propostas pela Resolução CVM 207/24 foram necessárias, mas são consideradas de baixo impacto, tendo em vista que não introduziram novas obrigações ou alterações materiais, somente tornaram o texto normativo consistente com outras normas já editadas pela CVM”, afirmam.
O que muda com a Resolução CVM 207/24
Uma das mudanças trazidas pela nova Resolução é a inclusão da possibilidade de coordenadores de ofertas públicas também poderem receber multas cominatórias caso atrasem a entrega do Formulário de Referência ou de outros documentos. A multa diária, no primeiro caso, é de R$ 600,00 e, no segundo, de R$ 500,00. A multa cominatória também pode ser aplicada aos coordenadores que descumprirem os prazos para entrega de informações periódicas – e o mesmo vale para os fundos de investimento.
Outra alteração relevante é que, a partir de agora, A CVM também poderá aplicar multas cominatórias se houver atrasos na prestação de informações eventuais (antes, a penalidade valia apenas para o atraso na entrega de informações periódicas). “Essas mudanças são particularmente relevantes porque garantem que as obrigações de prestação de informações, sejam periódicas ou eventuais, sejam tratadas com a mesma seriedade”, avaliam os advogados do Vieira Rezende. Para eles, esse avanço é significativo porque “aborda diretamente a necessidade de informações tempestivas em situações que não seguem um calendário fixo, mas que são igualmente cruciais para a transparência do mercado.”
Na entrevista abaixo, as advogadas do Carneiro de Oliveira e os advogados do Vieira Rezende explicam como funcionam as multas cominatórias e detalham as mudanças trazidas pela Resolução CVM 207/24 .
– O que são multas cominatórias e quando a CVM costuma aplicá-las?
Gabriela Saad Krieck e Ana Carolina Anselmo Rodrigues: As multas cominatórias são regulamentadas pela Resolução CVM nº 47, de 01 de outubro de 2021 (Resolução CVM 47/21) e são de duas naturezas: ordinárias, impostas em razão do atraso na prestação de informações periódicas ou eventuais exigidas pela regulamentação aplicável; e extraordinárias, impostas em razão do não cumprimento de ordens específicas emitidas pela própria CVM.
Para fins da Resolução CVM 47/21, são consideradas informações periódicas aquelas devidas pelo participante do mercado em data certa ou quando da verificação de evento rotineiro de ocorrência certa, e informações eventuais, aquelas devidas pelo participante do mercado quando da verificação de evento extraordinário ou de ocorrência incerta.
Com relação às multas ordinárias, uma vez verificado o descumprimento de obrigação de prestação de informação eventual, a CVM deve enviar comunicação específica dirigida ao responsável constante no cadastro do participante junto à CVM, no prazo de cinco dias úteis, alertando que a não apresentação da informação até o final do prazo indicado na comunicação sujeita a aplicação da multa diária prevista no Anexo A da Resolução CVM 47/21.
Importante destacar que é vedada a aplicação da multa ordinária se a informação eventual for entregue com atraso, mas antes da comunicação específica enviada pela CVM acima mencionada, e se o participante estiver com seu registro suspenso ou cancelado no momento da multa.
Para a aplicação da multa extraordinária, o responsável no âmbito de cada superintendência, a Superintendência Geral ou o membro do colegiado que atue como relator, ao determinar a abstenção ou a prática de ato, deve notificar o participante informando que o seu não cumprimento até o final do prazo indicado na notificação sujeita à aplicação da multa extraordinária.
O valor diário da multa extraordinária estabelecido pelo colegiado não pode ultrapassar os limites estabelecidos no Anexo B da Resolução CVM 47/21, sendo certo que, caso a proibição envolva mais de uma conduta, a multa deve ser fixada considerando a atuação sujeita ao maior valor.
Ricardo Mafra, Beatriz Camões e Caio Brandão: Multas cominatórias são penalidades financeiras impostas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no âmbito do exercício do seu poder fiscalizatório para incentivar o cumprimento de uma obrigação pelo regulado, normalmente diária, enquanto a obrigação não for cumprida. No contexto da CVM, as multas cominatórias são aplicadas principalmente quando há falhas no cumprimento de obrigações de prestação de informações periódicas e eventuais por participantes do mercado de capitais.
A CVM costuma aplicar essas multas para forçar o cumprimento rápido das obrigações regulatórias, por exemplo, a entrega de demonstrações financeiras, formulários de referência, ou outras informações exigidas pela legislação. As multas cominatórias são aplicadas de forma automática e diária até que a irregularidade seja sanada. Importante destacar que essas multas não dependem necessariamente de um Processo Administrativo Sancionador (PAS) prévio; podendo ser aplicadas diretamente, de ofício, pela CVM.
Além disso, a aplicação dessas multas não impede que a CVM, posteriormente, abra um PAS para apurar a responsabilidade do participante pela infração cometida, podendo haver outras sanções além da multa cominatória.
– O que a Resolução CVM 207/24 alterou com relação às multas cominatórias?
Gabriela Saad Krieck e Ana Carolina Anselmo Rodrigues: A Resolução CVM nº 207, de 13 de agosto de 2024 (Resolução CVM 207/24), que entrou em vigor em 2 de setembro de 2024, trouxe alterações pontuais relativas às multas cominatórias, dentre as quais destacam-se:
- ajustes no Anexo A da Resolução CVM 47/21 para: (i.a) incluir o coordenador de ofertas públicas entre os agentes sujeitos à multa cominatória e a respectiva multa diária a ser cobrada no caso de atraso na entrega do formulário de referência (R$ 600,00) e outros documentos (R$ 500,00); e (i.b) refletir alterações decorrentes da Resolução CVM nº 175, de 23 de dezembro de 2022, que consolidou obrigações periódicas de fundos de investimento;
- modificação no artigo 63 da Resolução CVM nº 80, de 29 de março de 2022, que trata da prestação de informações periódicas e eventuais, para prever a possibilidade de aplicação de multas por atrasos na prestação de informações eventuais, tendo em vista que anteriormente só havia previsão de incidência de multas cominatórias no caso de descumprimento de prazos para entrega de informações periódicas; e
- inclusão do art. 22-A na Resolução CVM nº 161, 13 de julho de 2022, que dispõe sobre o registro de coordenadores de ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários, para prever expressamente a aplicação de multas diárias para coordenadores que descumprirem os prazos para entrega de informações periódicas.
Ricardo Mafra, Beatriz Camões e Caio Brandão: A Resolução CVM 207/2024 incorporou importantes mudanças nas regras sobre aplicação de multas cominatórias, buscando aprimorar a fiscalização e o cumprimento das obrigações dos participantes do mercado de capitais, destacando-se, em suma:
- Ajustes no Anexo A da Resolução CVM 47/21: Um dos principais ajustes realizados foi a inclusão dos coordenadores de ofertas públicas entre os agentes sujeitos a multas cominatórias. Agora, atrasos na entrega do formulário de referência poderão resultar em multas diárias de até R$ 600,00, enquanto atrasos na entrega de outros documentos essenciais poderão acarretar multas diárias de até R$ 500,00. Além disso, o Anexo A foi adaptado para refletir as mudanças introduzidas pela Resolução CVM 175/22, que consolidou as obrigações periódicas dos fundos de investimento.
- Modificação no artigo 63 da Resolução CVM 80: Outra alteração significativa foi a modificação do artigo 63 da Resolução CVM 80/22, que agora prevê a possibilidade de aplicação de multas cominatórias em caso de atrasos na prestação de informações eventuais (e não só das periódicas). Essa modificação reforça o compromisso da CVM em garantir que informações cruciais sejam fornecidas tempestivamente, assegurando maior transparência e proteção aos investidores.
– Atualmente, as multas cobradas por atraso na publicação de informações são suficientemente elevadas para coibir essa prática?
Gabriela Saad Krieck e Ana Carolina Anselmo Rodrigues: Os valores atuais das multas cominatórias impostas pela CVM não são suficientemente elevados para coibir o atraso ou o descumprimento da divulgação de informações, embora seu impacto também dependa da capacidade financeira dos participantes. No entanto, a aplicação das referidas multas é um modo de incentivar o cumprimento das obrigações de publicação de informações e, consequentemente, garantir uma maior transparência no mercado.
No entanto, não é apenas o valor das multas cominatórias que coíbe o atraso ou descumprimento da divulgação de informações: a efetividade da fiscalização da CVM, por exemplo, também é essencial para o funcionamento dessa ferramenta.
Ricardo Mafra, Beatriz Camões e Caio Brandão: Entende-se que, atualmente, as multas cominatórias cobradas por atraso na publicação de informações pela CVM provavelmente não são, por si só, suficientemente elevadas para, de forma isolada, coibir totalmente essa prática. Contudo, o objetivo principal dessas multas não é apenas punir financeiramente o regulado, mas sim garantir a celeridade e a conformidade do mercado com as obrigações regulatórias, preservando, assim, simetria informacional e tempestiva.
A CVM utiliza essas multas como um mecanismo para reforçar a necessidade de cumprimento tempestivo das obrigações por parte dos participantes do mercado. Ao impor multas de forma rápida e direta, a CVM exerce sua competência fiscalizatória para assegurar que as informações cruciais sejam disponibilizadas ao mercado dentro dos prazos estabelecidos. Essa abordagem permite à CVM agir prontamente sem comprometer seu papel como órgão da administração pública, uma vez que as multas cominatórias podem ser aplicadas de ofício, sem a necessidade de um PAS prévio.
Assim, o valor das multas serve mais como um lembrete da obrigação do que como uma sanção financeira propriamente dita, incentivando os participantes do mercado a cumprirem suas responsabilidades de forma diligente, zelando pela eficiência e a transparência do mercado de capitais.
– As alterações propostas pela Resolução 207/24 vêm em boa hora? São suficientes para desencorajar o atraso na entrega de informações para a autarquia e os investidores?
Gabriela Saad Krieck e Ana Carolina Anselmo Rodrigues: As alterações relativas às multas cominatórias propostas pela Resolução CVM 207/24 foram necessárias, mas são consideradas de baixo impacto, tendo em vista que não introduziram novas obrigações ou alterações materiais, somente tornaram o texto normativo consistente com outras normas já editadas pela CVM.
De modo geral, a Resolução CVM 47/21, alterada pela Resolução CVM 207/24, ao regulamentar a imposição de multas cominatórias pela CVM em razão do atraso ou da não divulgação de informações exigidas pela legislação aplicável ou pela própria CVM, contribui para uma maior transparência e pontualidade na entrega de informações, aumentando a confiança dos investidores e melhorando a integridade do mercado como um todo.
Ricardo Mafra, Beatriz Camões e Caio Brandão: As alterações propostas pela Resolução CVM 207/24 vêm em boa hora e representam um passo importante para harmonizar e fortalecer a disciplina no mercado de capitais. Ao estender as multas cominatórias tanto para companhias abertas quanto para intermediários de ofertas públicas e agentes relacionados a fundos de investimento, a CVM cria um ambiente regulatório mais uniforme, no qual os participantes estão sujeitos a regras e sanções semelhantes.
Essas mudanças são particularmente relevantes porque garantem que as obrigações de prestação de informações, sejam periódicas ou eventuais, sejam tratadas com a mesma seriedade. A inclusão de multas para obrigações eventuais, conforme previsto na modificação do artigo 63 da Resolução CVM 80, é um avanço significativo, pois aborda diretamente a necessidade de informações tempestivas em situações que não seguem um calendário fixo, mas que são igualmente cruciais para a transparência do mercado.
Embora o valor das multas possa não ser tão elevado, a combinação dessas sanções com a capacidade da CVM de aplicá-las de forma rápida e direta tem o potencial de desencorajar atrasos na entrega de informações. Dessa forma, as alterações trazidas pela Resolução 207/24 são suficientes para reforçar o compromisso dos regulados com o cumprimento de suas obrigações, beneficiando tanto a autarquia quanto os investidores.
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