Crise impulsiona operações de compra e fusões na área de saúde

Capitalizadas, grandes empresas do setor abrem corrida por oportunidades no mercado brasileiro

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Entre numerosos outros reflexos, a pandemia evidenciou — para o bem e para o mal — a estrutura dos sistemas de saúde, e no Brasil não foi diferente. A capacidade de atendimento, as conexões entre os setores público e privado, a capilaridade do sistema e a possibilidade (ou não) de aquisição e uso de novas tecnologias na área médica foram alguns dos pontos que puderam ser observados mais claramente desde que o novo coronavírus passou a se disseminar pelo mundo.

O cenário não deve escapar a grandes grupos da área de saúde no País, que ou já estão capitalizados por recentes operações no mercado de capitais ou pretendem obter recursos para comprar empresas de menor porte e com bom potencial de crescimento. São esperados, para 2021, negócios de companhias como a Rede D’Or — cuja oferta pública inicial de ações (IPO) levantou 11,4 bilhões de reais em dezembro passado —, a rede de laboratórios Dasa e a Athena, empresa de saúde do fundo Pátria.

“Há uma perspectiva de manutenção do crescimento das operações de M&A na área da saúde, expansão que vem se mostrando firme desde 2016 e que não refreou em 2020 mesmo com a pandemia”, observa Daniel Rodrigues Alves, sócio do Candido Martins Advogados. Como explica o advogado, o M&A no segmento de saúde pode ter algumas particularidades. “A depender do ramo de atuação das empresas-alvo dentro da área da saúde há questões regulatórias relevantes a serem observadas”, afirma, referindo-se, por exemplo, às empresas de planos de saúde. “Além da imediata inserção em novas praças e do acesso a potenciais novos clientes, a incorporação da experiência, das inovações e dos procedimentos de uma grande empresa do setor certamente contribuem para a geração de caixa e para o crescimento da empresa adquirida”, acrescenta Paula Chaves, sócia do Coimbra & Chaves Advogados.

“As pesquisas são praticamente unânimes em indicar que as perspectivas para operações de M&A para o ano de 2021 são favoráveis. Depois de um semestre relativamente pouco aquecido no setor, há operações represadas. Isso sem falar do apetite de agentes do mercado com disponibilidade de caixa por ativos que estejam ‘em promoção’. Nesse promissor contexto, mostra-se ainda mais intensa a tendência para a negociação e  a implementação de operações de M&A relacionadas ao setor de saúde”, completa Cláudio Luiz de Miranda, sócio do Chalfin, Goldberg e Vainboim Advogados.

A seguir, Alves, Chaves e Miranda abordam outros aspectos relacionados a M&A na área de saúde no País.


A pandemia evidenciou problemas e pontos positivos do sistema brasileiro de saúde e agora o mercado se movimenta em direção ao crescimento de operações de M&A. Quais são as perspectivas para os negócios neste ano?

Há uma perspectiva de manutenção do crescimento das operações de M&A na área da saúde, expansão que vem se mostrando firme desde 2016 e que não refreou em 2020 mesmo com a pandemia.

São diversos os fatores que impulsionam as operações no setor, mas podemos destacar dois em especial. O primeiro, ainda que perverso, consiste na queda abrupta de valor de avaliação de muitas empresas do ramo em decorrência da pandemia de covid-19, o que as tornou ainda mais atrativas para investidores capitalizados e/ou que não sentiram tanto os efeitos da crise. O segundo decorre do forte movimento de aquisições por parte de grandes players do setor em busca de crescimento e consolidação de mercado, o que faz com que outros grupos tenham que também agir rapidamente e de forma consistente em compras de empresas e ativos se quiserem garantir força e posição competitiva nesse mercado.

As perspectivas para os negócios na área da saúde neste ano de 2021 são de manutenção do crescimento de operações de M&A e do movimento de consolidação entre clínicas, hospitais e laboratórios. Trata-se de um setor rentável, ainda bastante fragmentado e não tão afetado pelo aumento da inflação, oscilação do câmbio e outros fatores macroeconômicos desafiadores que devem ter proeminência em 2021.

As pesquisas são praticamente unânimes em indicar que as perspectivas para operações de M&A para o ano de 2021 são favoráveis. Depois de um semestre relativamente pouco aquecido no setor, há operações represadas. Isso sem falar do apetite de agentes do mercado com disponibilidade de caixa por ativos que estejam “em promoção”. Nesse promissor contexto, mostra-se ainda mais intensa a tendência para a negociação e  a implementação de operações de M&A relacionadas ao setor de saúde, reforçado por um cenário de pandemia, em que qualidade de vida e aspectos de saúde pública concentram as atenções de todos.


Em termos de regulação, existem aspectos específicos a serem observados nas operações de M&A relacionadas à área de saúde? Como as transações são estruturadas?

A depender do ramo de atuação das empresas-alvo dentro da área da saúde há sim questões regulatórias relevantes a serem observadas. Por exemplo, operações envolvendo operadoras de planos de saúde — um nicho bastante aquecido de operações em 2020 — precisam ser analisadas cuidadosamente sob a perspectiva de regulação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), de maneira a se verificar conformidades e potenciais contingências, riscos e impactos nas operações da empresa a ser adquirida.

Há outros aspectos regulatórios muito importantes a serem observados em operações envolvendo empresas de outras áreas da saúde, especialmente aquelas que fazem atendimento direto ao público e que lidam com materiais e equipamentos tóxicos e/ou poluentes, como hospitais e clínicas especializadas. Existe uma série de licenças e autorizações de órgãos ambientais e de autoridades estaduais e/ou municipais que essas empresas precisam obter para que estejam regulares e aptas a desenvolver suas atividades normalmente. Compradores em operações de M&A envolvendo essas empresas precisam ter muita atenção e cuidados redobrados na análise e verificação desses aspectos, pois podem impactar diretamente nas negociações e mesmo na decisão de seguir em frente ou não com a operação.

Em termos de regulação, há, sim, aspectos específicos a serem observados nas operações de M&A relacionadas à área de saúde. As transações envolvendo ativos relacionados a planos de saúde, por exemplo, necessitam de aval da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para que sejam concretizadas. Além disso, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) vem atuando de forma rigorosa na análise de operações envolvendo grandes players do setor, tendo, inclusive, emitido pareceres contrários a algumas aquisições.

Tratando-se de um setor amplamente regulado, com peculiaridades fiscais e operacionais relevantes e elevada necessidade de caixa para o seu funcionamento, as operações de M&A no setor de saúde envolvem características próprias, que precisam ser bem avaliadas por aqueles que se propõem a atuar no setor. Pela nossa experiência, a estrutura da operação precisa ser muito bem organizada, antevendo-se entraves regulatórios e, sobretudo, antecipando-se eficiências de natureza fiscal e operacional, para reduzir riscos e custos e maximizar as externalidades positivas advindas do negócio.

Em muitos dos casos, a diferença entre uma operação bem-sucedida e outra não tanto acaba sendo justamente essa preparação prévia, organizando-se as equipes multidisciplinares de assessoria à operação desde o seu início — contadores, auditores, assessores financeiros, regulatórios e jurídicos.


Em que medida recentes operações de grandes empresas do setor na bolsa devem influenciar a dinâmica dos M&As neste ano?

A operação da Rede D’Or demonstrou o enorme potencial financeiro e de retorno para investidores decorrente de um IPO após um forte movimento de aquisições efetuado pelo grupo ao longo dos anos, além de um posicionamento fortíssimo de mercado em termos de relevância.

Isso faz com que outros grupos e players do mercado precisem se movimentar de maneira contundente na realização de aquisições caso queiram atingir o mesmo nível e robustez para um potencial IPO ou venda futura para estratégico e também uma posição forte de mercado capaz de competir de igual pra igual com os grandes grupos.

Naturalmente, esse cenário aquece e muito a dinâmica de M&A do setor, com compradores buscando novas oportunidades de investimentos e crescimento e vendedores aproveitando a excelente oportunidade para venderem seus ativos e garantirem um futuro confortável para si e suas famílias, resolverem problemas de sucessão e eventualmente de ativos que poderiam se deteriorar ainda mais com o tempo sem os investimentos necessários.

As recentes operações envolvendo empresas do setor na bolsa, como a abertura de capital da Rede D’Or, e que resultaram na entrada de novos recursos no caixa de grandes grupos, certamente contribuirão para o crescimento de negócios na área da saúde neste ano de 2021.

Nessa linha, as grandes operações que ocorreram no final de 2020 envolvendo companhias abertas do setor acabam por favorecer, ainda mais, o desenrolar desse mercado. Isso porque funcionam como vitrines para os aspectos mais importantes e estimulam os agentes de mercado mais bem informados e assessorados a negociar e implementar soluções semelhantes, cada um dentro do seu contexto financeiro, jurídico e regulatório. O mercado amadurece enxergando e se informando a partir desses relevantes exemplos de operações bem-sucedidas.


Compras de outras empresas ou fusões podem ajudar as grandes empresas a acessar nichos específicos? Quais são os ganhos desse tipo de estratégia?

Um dos grandes incentivos às aquisições no setor de saúde é exatamente o alcance de novos nichos, áreas ou mercados. Muitas vezes os investimentos necessários para desenvolvimento de uma nova área por um player, somados aos riscos envolvidos na falta de expertise no nicho em questão, fazem com que certos players busquem a solução via a compra direta de uma empresa que já tenha todo o know how da área, maquinário e corpo clínico definido e de qualidade, carteira de clientes consolidada dentre outros aspectos.

Essa solução se mostra, em muitos casos, mais vantajosa economicamente e mais célere na busca de crescimento e impacto mercadológico, gerando vantagem sobre competidores nesse mercado tão forte e aquecido.

A aquisição de empresas já atuantes e consolidadas em um determinado setor é, sem dúvida, o melhor caminho para que grandes grupos passem a explorar novos ramos de atividades e/ou mercados. Além da imediata inserção em novas praças e do acesso a potenciais novos clientes, a incorporação da experiência, das inovações e dos procedimentos de uma grande empresa do setor certamente contribuem para a geração de caixa e para o crescimento da empresa adquirida.

De fato, abrem-se oportunidades para o desenvolvimento das empresas do setor, permitindo o crescimento não orgânico por parte das empresas com disponibilidade de caixa e o acesso a novos mercados, conforme a eficiência específica de cada setor e de cada agente econômico envolvido. Portanto, a perspectiva mostra-se favorável para atividades dessa natureza, sendo certo que as empresas mais bem capacitadas e assessoradas desde a largada sairão na frente em busca dos melhores ativos à disposição nesse disputado mercado.

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