Controvérsia sobre a eleição em separado em companhias com capital disperso

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A temporada de assembleias gerais ordinárias está se aproximando e muitas companhias, além de aprovarem as contas da administração e as demonstrações financeiras, deverão deliberar sobre a eleição ou reeleição de administradores para cumprir um novo mandato. Tendo em vista as diversas modalidades de eleição de conselheiros de administração que podem ser adotadas, um assunto que costuma gerar interpretações distintas é a aplicabilidade da eleição em separado em companhias de capital disperso.

A eleição em separado de um membro do conselho de administração, prevista no parágrafo 4º do artigo 141 da Lei das S.As., é um mecanismo de proteção aos acionistas minoritários e visa lhes assegurar representatividade no conselho de administração. Essa estrutura é aplicável somente às companhias abertas e exclusivamente aos acionistas minoritários que comprovem a titularidade ininterrupta de sua participação acionária na empresa durante os três meses imediatamente anteriores à realização da assembleia geral em questão. Para que a eleição em separado seja adotada, a participação acionária ininterrupta deve ser de 15% do capital votante ou 10% do capital social total, sendo que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) entende que, para as companhias que somente emitam ações com direito de voto (ordinárias), aplica-se o percentual de 10%.

Correntes distintas

A polêmica sobre a aplicabilidade da eleição em separado vem à tona no momento em que os acionistas de companhias de capital disperso, isto é, sem acionista controlador ou bloco de controle definido, consideram eleger um membro do conselho de administração exercendo esse direito garantido pela Lei das S.As. A CVM ainda não se manifestou expressamente sobre o tema e, a partir daí, é possível identificar duas correntes interpretativas.

Apesar de esse tema ser pouco tratado de forma específica e pública pelos juristas, que acabam discutindo a questão em pareceres e consultas individuais com clientes, muitos entendem que a adoção do mecanismo da eleição em separado pressupõe a existência de um acionista controlador ou bloco de controle definido na companhia. Para muitos deles, como mecanismo de proteção dos minoritários em face de abusos por parte dos controladores, seria um contrassenso que a eleição em separado pudesse ser adotada em empresa sem controlador definido, já que não haveria acionista a ser impedido de participar de tal eleição em separado. Ou seja, nesse caso, não havendo controlador, todos os acionistas poderiam se qualificar como “minoritários” na eleição em separado. 

No entanto, alguns juristas defendem que a adoção ou não do mecanismo de eleição em separado em companhias que não tenham um acionista controlador ou bloco de controle definido deveria ser analisada caso a caso, levando em consideração a estrutura de capital da empresa e o comportamento dos acionistas com maior ascendência na administração ao longo do tempo. Os defensores dessa posição argumentam que a adoção da eleição em separado faria sentido caso o minoritário relevante tivesse participação superior aos quóruns legais (de 10% e 15%) e o poder de eleger sozinho a maioria dos membros do conselho de administração em determinada assembleia (ou todos, no caso da eleição por chapa).

Apesar da discussão, na prática existem companhias com capital disperso que sequer disponibilizam as perguntas relativas à eleição em separado no boletim de voto à distância, como é o caso da B3. E de acordo com informações públicas, nenhuma delas foi questionada até o momento sobre essa prática. 

A CVM já se manifestou de forma indireta sobre o tema no relatório de análise da audiência pública sobre a alteração da Instrução CVM 481, divulgado em 20 de dezembro de 2017. Na época, o regulador reconheceu que os itens do boletim de voto a distância relativos à eleição em separado podem não se aplicar a todas as companhias, mas não concordou expressamente que tal mecanismo não poderia ser adotado por empresas com capital difuso de forma geral.

Até que a CVM seja provocada a tratar especificamente o tema de forma mais clara, a discussão deve continuar.


Colaboraram Gabriela Saad Krieck e Marcella de Souza e Castro Fontana, advogadas do Carneiro de Oliveira Advogados

1 comentário
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