Aumentam pedidos de renegociação de debêntures durante pandemia de covid-19

Empresas tentam adiar dívidas vincendas e postergar prazos de principal e juros, mas debenturistas podem ser um entrave

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O mercado de dívida corporativa não escapou do impacto do novo coronavírus. Por causa da crise econômica decorrente da pandemia, empresas estão enfrentando problemas de liquidez, o que as leva a tentar renegociar termos de debêntures, pedindo a prorrogação de prazos de pagamento de principal e juros ou até mesmo o adiamento das dívidas que estão vencendo.

De acordo com Renata Simon, sócia do Candido Martins Advogados e afiliada ao Legislação & Mercados, a renegociação de dívidas está acontecendo em grande escala em razão da covid-19. Caso as companhias emissoras não consigam um alongamento do pagamento das dívidas, muitos desses títulos serão inadimplidos e a situação poderá ficar ainda pior para o investidor do papel. “Haverá uma vencimento em cadeia das dívidas da companhia e uma corrida para recebimento do crédito”, comenta.

Diferentemente do que acontece em contratados mútuos com bancos, em que a renegociação se dá de forma mais simplificada, as dívidas corporativas, estruturadas por meio do mercado de capitais, requerem um nível maior de formalidades para a sua restruturação. É o que explica Celso Arbaji Contin, sócio do Vieira Rezende Advogados. “Como o mercado de dívida corporativa ainda vem evoluindo ao longo dos anos, muitas empresas que emitiram papéis ainda não estão habituadas aos procedimentos para renegociação.”

Dificuldades na renegociação de debêntures 

Para as debêntures ou outros títulos de dívida pulverizados no mercado, é necessário obter aprovação da maioria — ou, muitas vezes, de quase a totalidade — dos debenturistas para efetivação da mudança desses parâmetros. E essa pode ser uma tarefa bastante difícil, observa a advogada. “A grande maioria dos debenturistas tem pouco contato com a empresa e um perfil de investidor passivo. Por conta disso, estão menos propensos a se sentar na mesa e entender as dificuldades pelas quais a companhia está passando”, afirma Simon.

Outra dificuldade diz respeito aos os instrumentos de mercado de capitais. Para proteger o investidor, costuma-se permitir pouca flexibilidade aos emissores. Segundo Contin, caso ocorra um atraso no pagamento de alguma parcela da dívida, por exemplo, os agentes da oferta podem ser obrigados a vencer a dívida antecipadamente. “Isso pode desencadear, em última análise — por disposições de vencimento cruzado —. o vencimento antecipado de todo o endividamento da emissora ou mesmo do seu grupo econômico, levando a um muito provável cenário de pedido de recuperação judicial.”

Simon ressalta que as renegociações já aumentaram e devem continuar se intensificando nos próximos meses, enquanto os efeitos da pandemia no novo coronavírus durarem. Na avaliação dela, as empresas devem ter cautela e se antecipar, solicitando a aprovação dos credores sem esperar que alguma parcela de juros ou principal vença. “O ideal é que a empresa acesse o credor e renegocie o quanto antes”, recomenda. A advogada diz ainda que os investidores desses papéis de dívida devem ficar atentos às convocações das respectivas assembleias de credores e devem participar, ainda que por meio de suas gestoras, dessas renegociações. 

Segundo Simon, o crédito hoje está muito limitado ao perfilamento de dívidas já existentes e os bancos ainda estão muito conservadores para liberar “dinheiro novo” para as companhias, pois isso aumenta a sua própria exposição. Além disso, considerando a incerteza da pandemia de covid-19 e a extensão do impacto que ela vai gerar na economia e na saúde das companhias, os spreads subiram muito e as garantias ficaram exageradas, o que dificulta a tomada de nova dívida pelas empresas — e, por isso, é importante que consigam renegociar com seus investidores.

Os principais desafios estão relacionados aos títulos muito pulverizados, ressalta Contin. “Para tais papéis, nos atuais tempos de reclusão, torna-se ainda mais desafiador reunir e informar investidores em tempo hábil para se ter uma renegociação exitosa. Isso pode ainda se somar a uma exigência de alto quórum para aprovação de mudanças relacionadas a prazo e vencimento, em algum casos.”

Mas há notícias boas. Simon explica que, com a situação gerada pela covid-19, houve uma desburocratização na emissão e na renegociação de debêntures e de outros títulos. “Com algumas mudanças legislativas [a Medida Provisória 931 e a Instrução Normativa nº 79 do DREI (Departamento de Registro Empresarial e Integração), por exemplo], hoje é possível emitir novas debêntures sem a necessidade de registro prévio da escritura na Jucesp [Junta Comercial do Estado de São Paulo], que está fechada em razão da pandemia. Também é possível realizar assembleias totalmente digitais, o que facilita a participação dos investidores no processo de renegociação dos papéis”, finaliza.

 

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