A controvérsia sobre o pagamento de ITCMD por planos de previdência

PLP 108/24 prevê que VGBLs e PGBLs passem a pagar o imposto que incide sobre heranças e doações

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Muito procurados para facilitar o planejamento sucessório, os planos de previdência VGBL e PGBL poderão perder um dos atrativos: a isenção do pagamento do ITCMD, imposto que incide sobre  heranças e doações. O Projeto de Lei Complementar 108/24 (PLP 108/24), que, ao lado do PLP 68/24, regulamenta a Reforma Tributária, prevê que esses planos passarão a pagar o imposto e que caberá à seguradora fazer o seu recolhimento. Se a proposta for aprovada, espera-se que se reduza a procura desse tipo de investimento com a finalidade de planejar a sucessão. O PLP 108/24 foi aprovado pela Câmara dos Deputados no dia 13/08, mas ainda precisa passar pelo Senado Federal.

O texto prevê, no entanto, uma exceção: não pagarão ITCMD os recursos aportados nos VGBLs há mais de cinco anos. “Com a medida, os planos de previdência passam a ser enxergados como um mecanismo de médio/longo prazo, uma vez que a isenção do ITCMD seria aplicável apenas para recursos aportados há mais de cinco anos”, avaliam Thiago Braichi e Ligia Merlo, sócio e associada do Freitas Ferraz Advogados. Atualmente, muitos planos de previdência são constituídos em momento “pré-falecimento” com a finalidade de ficar fora do inventário e de evitar o recolhimento do imposto sobre heranças e doações.

Já para os PGBLs, o texto aprovado na Câmara prevê a cobrança do ITCMD, independentemente do prazo de aplicação dos recursos no plano. Braichi e Merlo lembram que há controvérsia sobre a cobrança de ITCMD na transmissão causa mortis e doação desses planos, mas o entendimento majoritário é o de que hoje o imposto só é devido nos PGBLs. “No entanto, o PLP prevê a cobrança do imposto também para o VGBL, que, devido à sua natureza securitária, por expressa previsão do artigo 794 do Código Civil, estaria dispensado do inventário. A jurisprudência mais recente dos tribunais tem afastado a cobrança do ITCMD no caso dos planos VGBL.”

Julgamento do STF sobre o ITCMD nos planos PGBL e VGBL (Tema 1.214) 

Os advogados do Freitas Ferraz lembram ainda que o Supremo Tribunal Federal (STF) vai julgar o Recurso Extraordinário nº 1.363.013 (Tema 1.214), que discute a possibilidade de cobrança do ITCMD sobre os planos PGBL e VGBL. O  VGBL, que tem natureza securitária, estaria dispensado do inventário por expressa previsão do artigo 794 do Código Civil, explicam Braichi e Merlo. Por isso, a jurisprudência mais recente dos tribunais tem afastado a cobrança do ITCMD para os VGBL. “Nesse contexto, entendemos que há espaço para discussão da matéria no Judiciário, especialmente se o atual entendimento majoritário sobre a questão for confirmado no julgamento do Tema 1.214 pelo STF.”

Na entrevista abaixo, concedida antes da votação do PLP 108/24 pela Câmara, Braichi e Merlo abordam a mudança prevista pelo PLP 108/24, o vaivém da questão e o julgamento do STF.


 – O que o PLP 108/24 propõe sobre os planos VGBL e PGBL?

Thiago Braichi e Ligia Merlo: O Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 108/2024 regulamenta diversas matérias, incluindo o ITCMD. Entre os destaques do PLP, está a previsão expressa de que o ITCMD será devido sobre aportes financeiros capitalizados em planos de previdência privada. Além disso, o PLP determina que entidades de previdência, seguradoras, instituições financeiras, entre outras, serão responsáveis pela retenção e pelo recolhimento do ITCMD em caso de transmissão causa mortis ou doação dos bens sob sua administração.

Embora essa previsão tenha sido incluída no texto original do projeto de lei e posteriormente excluída, ela voltou a constar no relatório final do grupo de trabalho destinado à apreciação do PLP e apresentado no último mês. O relatório, no entanto, ressalva que o ITCMD não deverá ser cobrado sobre aportes financeiros capitalizados em planos de previdência privada com prazo superior a cinco anos contados da data do aporte até a ocorrência do fato gerador, nem no caso de benefício devido em razão de contrato de risco.


– E com relação à taxação de grandes patrimônios pelo ITCMD. Como estes seriam definidos e a quais alíquotas estariam sujeitos, de acordo com o PLP 108/24?

Thiago Braichi e Ligia Merlo:  Conforme destacado na EC nº 132/2023, o PLP 108/24 prevê que a alíquota do ITCMD será progressiva, dependendo do valor do bem transmitido, seja por herança (causa mortis) ou doação.

No entanto, o PLP não especifica as faixas e alíquotas aplicáveis, que deverão ser estabelecidas na legislação de cada Estado e do Distrito Federal, respeitando a alíquota máxima atualmente fixada pelo Senado Federal. Dessa forma, os “grandes patrimônios” serão tributados com base na alíquota máxima de 8%, conforme previsto na Resolução do Senado nº 9/1992, atualmente em vigor.


– A isenção do pagamento de ITCMD para VGBLs e PGBLs com patrimônio aportado há mais de cinco anos, caso haja o falecimento do titular dos planos, seria uma saída interessante para evitar que contribuintes paguem o imposto?

Thiago Braichi e Ligia Merlo: Como mencionado, o relatório final do PLP prevê que o ITCMD não será cobrado sobre aportes financeiros capitalizados em planos de previdência privada com prazo superior a cinco anos, contados da data do aporte até a ocorrência do fato gerador. Em outras palavras, no caso de valores aportados há mais de cinco anos do falecimento do titular, não haveria a cobrança do imposto.

Portanto, se o PLP 108/24 mantiver essa redação, não será possível a cobrança do ITCMD nos casos de doação ou transmissão causa mortis de planos VGBL e PGBL com patrimônio aportado há mais de cinco anos.

Nos parece que a ideia por traz dessa medida é evitar o “desvirtuamento” dos planos de previdência e a consequente fuga do ITCMD. É comum nos depararmos com planos de previdência constituídos em momento “pré-falecimento” com o único objetivo de evitar o inventário e o recolhimento do tributo (ITCMD).


– Caso a proposta seja aprovada como está, qual será o impacto sobre o planejamento sucessório? Pode haver questionamento na Justiça?

Thiago Braichi e Ligia Merlo: Os planos de previdência privada aberta são uma alternativa comumente utilizada em planejamentos sucessórios devido às suas vantagens tributárias e sucessórias na alocação de parte do patrimônio. Portanto, se o PLP 108/24 for aprovado em sua redação atual, haverá, sem dúvida, impactos nas estratégias de organização de ativos e sucessão, considerando os custos tributários envolvidos. Com a medida, os planos de previdência passam a ser enxergados como um mecanismo de médio/longo prazo, uma vez que a isenção do ITCMD seria aplicável apenas para recursos aportados há mais de cinco anos.

Embora, como mencionado, houvesse controvérsia sobre a cobrança de ITCMD na transmissão causa mortis e doação desses planos, o entendimento majoritário era de que o imposto só era devido na transmissão de planos na modalidade PGBL.

No entanto, o PLP prevê a cobrança do imposto também para o VGBL, que, devido à sua natureza securitária, por expressa previsão do artigo 794 do Código Civil, estaria dispensado do inventário. A jurisprudência mais recente dos tribunais tem afastado a cobrança do ITCMD no caso dos planos VGBL. Vale mencionar que atualmente está pendente de julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) o Recurso Extraordinário nº 1.363.013 (Tema 1.214), que discute a possibilidade de cobrança do ITCMD sobre os planos PGBL e VGBL.

Nesse contexto, entendemos que há espaço para discussão da matéria no Judiciário, especialmente se o atual entendimento majoritário sobre a questão for confirmado no julgamento do Tema 1.214 pelo STF.


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1 comentário
  1. site Diz

    Olá! Esse é realmente um tema bastante controverso. A questão central gira em torno da interpretação da natureza dos planos de previdência privada. Alguns defendem que os valores recebidos pelos beneficiários não deveriam ser sujeitos ao ITCMD, pois não são uma herança, mas sim um benefício previsto em contrato. No entanto, outros estados entendem que, por ser uma transferência de bens após a morte, o imposto deve ser aplicado. A falta de uniformidade na legislação entre os estados só aumenta a confusão

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